É o Emprendedorismo a Aspirina do Século XXI?

Sim e Não. É um caminho mas não pode ser o salvador de um país, de uma geração, nem de uma sociedade!

Foto
Images_of_Money/Flickr

Diariamente somos bombardeados com "soundbytes" que apregoam as virtudes desta palavra. Tal como a invenção de Hoffmann, também o empreendedorismo é tido como a receita para as maleitas da sociedade moderna, como se uma palavra tantas vezes dita entrasse por osmose no nosso ideário colectivo. Estamos restringidos à dicotomia entre “empreender ou perecer” enquanto Sociedade ou, pior ainda, com a tese redutora de que o empreendedorismo é a “bóia de salvação” para o desemprego.

A tese anterior, tão em voga no discurso político, reduz o empreendedorismo à sua vertente de criação de empresas de serviços ou de base tecnológica. Isto é, reduz uma atitude e forma de percepcionar o mundo e os outros, a um impulso potencialmente criador de riqueza e de emprego. Este afunilamento do conceito tem dois objectivos: por um lado, a responsabilização individual de cada cidadão pelo êxito ou fracasso (quem fracassa é porque não empreende!) e a consequente desresponsabilização da sociedade; por outro lado, o impor aos poucos e de forma invisível um cunho ideológico neoliberal e ultra capitalista na palavra “empreendedorismo”.

Estes objectivos esvaziam muito do valor de uma atitude empreendedora. Esta atitude tão presente em centenas de organizações (associações sociais e culturais, clubes desportivos) por este país, e por milhares de cidadãos, que criam, inovam, constroem, debatem e são pró-activos. Sim, fazem isso sem construir uma empresa mas criando valor. A estes juntam-se os que diariamente transformam as empresas por dentro, num esforço sem fim para mudar processos, formas de produção e de gestão inovando e renovando estruturas com dezenas de anos. A todos estes, que são o motor de Portugal, não podemos virar costas nem dizer-lhes que são conformados e que baixaram os braços. Pelo contrário, devemos saudá-los pelo bem que fazem a nós, Sociedade.

É claro que o empreendedorismo de criação de "startups" tecnológicas ou de serviços é fundamental porque transforma a longo prazo o tecido produtivo, baseando-o em tecnologias inovadores e de elevado valor acrescentado. Alguns falham e isso faz parte do risco inerente. Aos que falharem devemos agradecer a ousadia, apoiando-os e dando-lhes novas oportunidades, num espírito solidário e coletivo (tão ausente do seu conceito redutor). Contudo, não podemos é atirar para cima dos seus ombros a tarefa hercúlea de resolver os problemas nacionais. Eles são parte da solução, como são os outros empreendedores que fazem o trabalho invisível da formiga, mas não podem ser a salvação.

A resposta à pergunta inicial é Sim e Não. Sim porque, tal como a Aspirina, mitigamos muitos problemas com o ímpeto empreendedor, o qual transmite confiança e nos faz acreditar num mundo melhor. Não porque, tal como a Aspirina, não resolve a fundo nenhum problema, apenas os previne sem atacar a fonte primária que nos ataca económica e socialmente. É, por isso, um caminho mas não pode ser o caminho salvador de um país, de uma geração, nem de uma sociedade!

Sugerir correcção
Comentar