Quando ficar três minutos numa cabina a 160º negativos faz bem

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Depois de um dia a pedalar, alguns ciclstas vão para o frio Stefano Rellandini/Reuters

Aguentar temperaturas entre os -150º C e os -170º C (ou até um pouco mais) durante dois ou três minutos faz parte da rotina diária de alguns ciclistas durante a Volta à França.

Todas as manhãs e todas as noites, antes e depois das etapas, os atletas das equipas francesas FDJ e AG2R-La Mondiale - pelo menos estes - passam pela cabina que os expõe a temperaturas negativas extremas, uma prática que tem como objectivo ajudar e acelerar a recuperação do esforço.

Massagens, banhos turcos, alongamentos ou natação são algumas técnicas que os desportistas utilizam para ultrapassar mais rapidamente os esforços extremos. Assim como os banhos de gelo (numa banheira ou num tanque com água e muito gelo), de uso muito disseminado, que são ultrapassados em eficácia por esta versão mais moderna de crioterapia.

Este método, que começa a ser usado em vários desportos pelos atletas ou clubes que têm dinheiro para investir neste equipamento caro, consiste em colocar os atletas num cubículo, aberto em cima, que proporciona um "banho" de frio seco produzido por azoto líquido. As temperaturas negativas associadas a este processo são muito superiores em relação às conseguidas com um banho de gelo e por causa disso têm uma eficácia maior.

"O choque térmico profundo ajuda a reduzir as dores musculares, a miopatia do exercício físico", explicou ao PÚBLICO José Soares, professor catedrático de Fisiologia da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. "Esses quartos hipotérmicos funcionam como analgésicos e anti-inflamatórios. Quando se faz exercício muito exaustivo, como um jogo de futebol ou uma etapa de ciclismo, desencadeia-se uma inflamação generalizada no corpo. Ela ajuda o músculo a tornar-se mais resistente, mas só é benigna até determinado ponto. Tem que ser diminuída, sob pena de dificultar a recuperação. Com a crioterapia, os tecidos inflamados regeneram-se mais rapidamente", acrescentou este especialista que já trabalhou nas selecções nacionais de futebol e andebol e na equipa sénior de futebol do Boavista.

Este frio seco, que na sociedade geral é empregado no tratamento da dor crónica, é visto com bons olhos pelos ciclistas. "Não é agradável ir para o frio, mas quando se dorme com as pernas menos doridas e se está menos cansado no dia seguinte percebe-se que vale a pena", referiu Rémi Pauriol, da FDJ, à rádio francesa RMC.

900 euros por dia

A sua equipa usou pela primeira vez esta crioterapia durante o Critérium Dauphiné, no início de Junho. "É melhor do que um banho de gelo, porque é frio seco", afirmou Arnold Jeannesson, também da FDJ, citado pela Reuters. "Ajuda a recuperar e a lutar contra a dor depois do esforço. Mas também pode trazer benefícios a longo prazo, pois o frio pode melhorar o sistema imunitário", disse Eric Bouvat, médico da AG2R-La Mondiale.

Segundo os responsáveis da equipa patrocinada pela Française des Jeux, a empresa pública francesa de jogos de lotaria, a FDJ irá receber cerca de 600 litros de azoto líquido por dia durante o Tour. Cada sessão custa 50 euros, o que se traduz num total de 900 euros por dia enquanto todos os nove ciclistas, que fazem duas sessões diárias, estiverem em prova. Num cenário hipotético em que todos os atletas chegariam a Paris, a equipa gastaria 20.700 euros durante os 23 dias de competição.

Dinheiro bem empregue, acreditam. "O método foi criado nos países de Leste há cerca de 30 anos. É usado em reumatologia e traumatologia. Entretanto, percebeu-se que ajudava os atletas a recuperar de grandes esforços", explicou o médico da FDJ, Gerard Guillaume. Os dias de pôr as pernas ao alto estão muito distantes.

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