Portugal vence a selecção que não gosta de bola

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Rafael Marchante/Reuters

Egil Olsen disse um dia que a Noruega era uma das melhores selecções do mundo a jogar sem bola. O seleccionador norueguês impôs-se no seu país apresentando um projecto baseado no adversário, jogando nas sobras que o opositor deixa, prescindindo da técnica e habitando nos outros corpos, que são os jogadores das outras equipas.

Depois do insucesso dos seus antecessores, com os falhanços nas últimas grandes provas, regressou à selecção como um herói e foi nessa condição que este obcecado por geografia entrou no Estádio da Luz como líder de uma armada forte e defensiva. E mostrou ao que vinha, vendendo cara a derrota (1-0).

Foi contra Olsen, o maníaco da estatística, que Paulo Bento atacou o primeiro lugar. Olsen chegou a meio da jornada de qualificação (4 jogos) na frente do grupo, enquanto Bento herdou de Carlos Queiroz uma posição mais ingrata, mais perto da eliminação do que da qualificação para o Euro 2012. Neste sábado, Portugal entrou refém desse período de Queiroz. E até foi na Noruega que a formação portuguesa começou a escorregar com um desaire em Oslo (1-0):Eduardo entregou a bola a Erik Huseklepp e bastou para o primeiro desaire em nove encontros entre as duas selecções.

Era o tempo intermédio, já sem Queiroz e ainda sem Bento, vivia-se no interinato de Agostinho Oliveira. Mas foi o guarda-redes do Génova que começou a segurar a selecção. Uma parte do orgulho foi reposto, quando Hauger apareceu, na madrugada do jogo, frente a Eduardo. A sua mão direita foi decisiva.

Portugal sabia que não podia não ganhar. Não só para se sentar no primeiro lugar, mas porque também a Dinamarca, na Islândia, tinha ganho o seu jogo. Os portugueses não só falhavam o primeiro posto como cairiam para o terceiro. O jogo estava exposto: a Noruega veio defender o empate fechada no seu casulo à espera que Portugal fizesse o seu trabalho com os artistas do costume: Moutinho, Martins, Meireles no meio-campo a fabricarem jogo para Nani, Ronaldo e Hélder Postiga.

Dono do campo, Portugal jogava em todo o lado, até com os apoios de Pereira (mexido na direita) e Coentrão (foi perdendo a timidez com o decorrer dos minutos). Na defesa, sem Ricardo Carvalho lesionado, a dupla foi Pepe-Bruno Alves, que tinham de se preocupar com Carew, esse gigante de 1,93m, veterano com 31 anos e que sabe jogar sozinho, abandonado à espera do futebol directo da sua equipa.

A Noruega jogava com o tempo e no contra-pé, Portugal fazia o seu jogo de paciência. O assédio não se traduzia em golos: nem o livre de Ronaldo, sacudido pelas mãos de Jarstein ou os remates com veneno do geómetra Meireles. A Luz não encheu, mas ajudou os portugueses a não adormecerem. Foi Bento que o disse, que não queria ser embalado pelas palavras de Olsen quando este afirmou que Portugal era a melhor selecção do mundo. Para isso havia que ganhar para assumir esse estatuto.

Muito centrado no miolo, o jogo parecia enferrujado. Ronaldo não se soltava, parecia estar já de férias e ter interrompido o tempo na Madeira para vir jogar o último jogo da época – por isso falhou um sprint na cara do guarda-redes. Só Moutinho, ainda em alta-voltagem do ritmo da equipa de Villas-Boas, mostrava pulmão. E, claro, Nani. Suplente na final da Champions contra o Barcelona, sempre foi um inconformado.

Foi ele que mostrou a Ferguson que se tinha enganado. Ele não é para ficar no banco, nem do United nem da selecção. E foi dele que saiu o passe para o golo do mais incompreendido dos jogadores: Postiga. O avançado do Sporting já tinha marcado dois golos à Espanha na Luz, agora marcou um, decisivo, com movimento à ponta-de-lança, seco e cirúrgico.

Estádio outrora “maldito”, que viu a Grécia chegar ao título em 2004 e arrecadar o Europeu que parecia pertencer a Portugal, a Luz pode bem ter sido agora o talismã para o Euro 2012. Paulo Bento continua imparável no serviço que lhe foi proposto: ganhou os jogos todos e deixou a selecção no primeiro posto. Faltam três jogos: Chipre, Islândia e Dinamarca. Este último, em Copenhaga, poderá decidir o dono do Grupo H.

POSITIVOHélder Postiga

Foi-lhe pedido que fosse o homem dos golos. Marcou apenas um, mas foi decisivo. À ponta-de-lança, respondeu ao cruzamento de Nani e deixou Portugal com a vida mais desafogada.


João Moutinho

Chegou a este jogo ainda com o ritmo louco do FC Porto de Villas-Boas e mostrou pulmão para os 90 minutos.


NEGATIVOJohn Carew

O avançado alto e abandonado foi a cara desta Noruega, entregue ao jogo e ao adversário. À espera do que desse, sem fazer nada pela vida a não ser defender.


Ronaldo

Apareceu em ritmo de férias. O herói que marcou 56 golos nesta época ficou em branco. E falhou o que normalmente não falha.


Ficha de jogo

Portugal 1Noruega 0

Jogo no Estádio da Luz, em Lisboa.
Assistência cerca de 50 mil espectadoresPortugal
Eduardo 6; J. Pereira 6 (Sílvio 5, 73’), 
Bruno Alves 6, Pepe 6, F. Coentrão 5; João Moutinho 7, Raul Meireles 7, Carlos Martins 5 (Ruben Micael 5, 69’); Nani 7 (Varela -, 86’), Ronaldo 5, Hélder Postiga 7. Treinador Paulo BentoNoruega
Jarstein 6; Hogli 5, Demidov 5, Hangeland 5, J.A. Riise 6; B.H. Riise 6, Hauger 6, Grindheim 5 (Henriksen -, 83’), Huseklepp 5 (Braaten -, 75’), Gamst Pedersen 5; Carew 4 (Abdellaoue 5, 60’). 
Treinador Egil OlsenÁrbitro
Cüneyt Çakir 6, da Turquia.Golo
1-0, por Hélder Postiga, aos 53’.

Notícia actualizada às 23h34
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