A pintura, a fotografia e o efeito Tuymans

Foto
Luc Tuymans (detalhe)

Embora próxima das motivações de outros artistas que utilizaram a fotografia enquanto material da pintura, como Luc Tuymans, Marlene Dumas não dispensa o gestualismo e a dimensão física do acto de pintar

Marlene Dumas não é a primeira artista a usar a fotografia como modelo ou alimento principal da pintura. No primeiro caso, existiram antes Van Gogh ou Degas, no segundo, Gerhard Richter. Também não está sozinha na resposta à apregoada dificuldade de pintura em expressar as "verdades" do seu tempo. Lembre-se (outra vez) Richter, mas também Luc Tuymans, Wilhelm Sasnal, Eberhard Havekost ou Peter Doig e, no contexto português, Bruno Pacheco, Diogo Pimentão e Carlos Correia.

Será no entanto justo afirmar que, nessa demanda, a pintora encontrou o seu território. Como alguns dos nomes referidos, negou e aceitou a pintura, foi influenciada por Luc Tuymans e fez da imagem fotográfica (encontrada ou produzida originalmente) um campo de experimentação que estende as possibilidades formais e conceptuais da prática pictórica.

Mas a sua assinatura dificilmente pode ser associada ao conjunto de artistas que Jordan Kantor agregou no artigo "O Efeito Tuymans", publicado em 2004 na revista americana Artforum. Faltam à pintura de Dumas alguns dos aspectos identificados pelo crítico e ensaísta: as cores pálidas, o trabalho com as imagens em movimento da televisão e do cinema (e não apenas com os "stills" dos filmes) e, principalmente, falta á pintura de Dumas a indiferença violenta que caracteriza a obra do artista belga. Em comum, permanecem somente certos temas que remetem para a cultura e história europeias, embora sem a presença espectral das telas de Sasnal ou Tuymans. O que sobressai nesse encontro da pintora com a fotografia é antes um gestualismo que distorce e satura as formas - um trabalho físico diante da tela como se fosse uma dança - e uma atracção pela superfície plana da imagem fotográfica. Cores, expressão, sensualidade, empatia e excesso em vez de uma impenetrabilidade suave e congelada.

A propósito das relações entre a fotografia e pintura, a artista discorre: "Não digo que, usando a fotografia, a pintura inventa uma realidade superior à fotografia ou que torna a fotografia melhor. Eu limito-me a usar a fotografia, gosto da sua bidimensionalidade, do facto de ser plana. Não me interessa a tridimensionalidade". E profetiza: "A pintura vai continuar como uma forma artística, como forma de expressão visual. Será um pouco tradicional, quase primitiva, mas vai ficar entre nós. E vai continuar porque estamos cheios de ecrãs. Nas televisão, nos computadores. Estão em todo o lado".

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