A arca dos instrumentos

Um mesmo projecto artístico, com base numa colecção histórica de instrumentos, resulta em registos que oscilam entre a excelência e a mediocridade.

A ideia, seguindo os princípios da interpretação historicamente informada, é excelente. Dar a conhecer a colecção do Museu de Instrumentos da Cité de la Musique, em Paris, através de gravações de repertório ajustado a esses mesmos exemplares.

Acontece que, dependendo do repertório e dos intérpretes, o resultado é muito variável, oscilando entre a excelência e o amadorismo.

Coube a Christophe Rousset dar a conhecer o cravo do construtor Jean-Henry Hemsch, construído em Paris em 1761, através da transcrição para tecla de uma das grandes obras instrumentais do período Barroco, a ópera-bailado "Les Indes Galantes" de Jean-Philippe Rameau. O primeiro facto que ressalta desta gravação é a excelência da escrita de Rameau que mantém intactas as texturas orquestrais originais na sua versão para cravo. Rousset é um intérprete magnifico e, ao longo dos quatro concertos e a "Nouvelle entrée: les Sauvages", demonstra um refinamento polifónico e um domínio rítmico que demonstram a genialidade da obra e a excelência do instrumento na qual a reproduz.

Sandrine Chatron, por sua vez, teve que retratar um sarau musical no salão de Marie-Antoiniette. Parecendo ser esta uma ideia encantadora, a verdade é se transforma rapidamente num serão aborrecido e difícil de digerir. Porventura, é próximo do que seriam os serões musicais da nobreza francesa no século XVIII, mas a experiência transposta para os nossos dias assemelha-se a uma audição escolar de um conservatório secundário. A música, essa, varia de qualidade. Petrini (solo de harpa), Gluck (com harpa e tenor), Krumpholtz (soprano, violino e harpa), Cardon, Dauvergne, uma curiosa Sonata para harpa e flauta do Cavaleiro de Saint-George (conhecido como o Mozart negro e geralmente associado à estreia das Sinfonias Paris, de Haydn, que dirigiu), um romance da própria rainha, uma chanson célebre de Mozart, um pouco mais de Dusik, de Paisello, Martini, Grétry... e uma curiosa peça de Mozart para harmónio de vidro. Tudo muito interessante mas, para quem aguentar até ao fim, apenas isso.

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