35 Shots de Rum

Os filmes de Claire Denis só intermitentemente chegaram a Portugal, mas ela anda nisto há muito tempo e já gozou (ainda goza?) de um certo culto. Logo a abrir, no final dos anos 80, quando à sua chegada à realização ("Chocolat", revisão do colonialismo francês, tema frequente na sua obra) foi enquadrada na "família cinéfila" de Wenders e Jarmusch (fez o tirocínio com eles, como assistente), e mais tarde, nos anos 90 de redescoberta do naturalismo no cinema francês, a propósito dos seus filmes intimistas como "Nenette et Boni".


Não são necessariamente os pontos altos da obra de Claire Denis (procurar mais junto de "Beau Travail", em 1999), mas em todo o caso parecemos, hoje, estar bastante distantes de uma qualquer "vaga Denis". Estes "35 Shots de Rum" trazem o essencial das suas qualidades, forças e fraquezas juntas: uma realizadora coerente e meticulosa, que concilia um interesse sociológico sério (no caso, uma comunidade de origem africana na região de Paris) com a tradição realista francesa, mas que parece, por norma só raras vezes contrariada, encontrar dificuldades no domínio da expressão e constituir-se em objectos cinematográficos que se imponham pela simples razão de existirem. É essa tangente ao anódino (em parte, intencional) que trai "35 Shots de Rum", filme sem rasgos, filme de uma nota só, numa menoridade de tom que sendo simpática não chega a ser cativante, e que não deixa a sobreviver na memória de quem o vê muito mais do que uns muito bonitos e muito melancólicos planos de comboios (é o lado Ozu de Denis, provavelmente herdado de Wenders e Jarmusch - as "famílias cinéfilas" têm muita força).

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