Second Life

Raramente se viu pior (aqui ou na China)

A "obsessão comercial" que grassa no cinema português, bem suportada pelas televisões e por alguma opinião publicada, ainda não parou de gerar equívocos e monstruosidades.

Abstemo-nos, a propósito de "Second Life", de ir mais longe na lengalenga pedagógica do que isto: não, não há nada de essencialmente repugnante na ideia de um "cinema popular", nem aqui nem na China. O problema é que "Second Life" é um pequeno apogeu da degradação da própria ideia de um "cinema popular". Que o filme anuncie, no seu material promocional, o desejo de ser "o mais visto do ano", é lá com ele; que isso depois sirva como justificação para a maior indigência (artística, certamente, mas também comercial: o mais oportunista dos produtores de Hollywood havia de se rir a bandeiras despregadas com isto) é que é lamentável. Se actualmente fazer um "sucesso comercial" em Portugal significa arrancar pessoas de diante da televisão para as levar a uma sala, "Second Life" encontra a solução (?) óbvia e dá-lhes mais televisão. Um elenco cheio de "caras" conhecidas das revistas e da TV, de Fátima Lopes a (por amor de Deus!) José Carlos Malato, passando por Luis Figo (num cena de "lap dancing" que faz mais pela destruição da sua dignidade do que uma sucessão de passes falhados ou cartões vermelhos). A isto adicionam-se as "cenas escaldantes" que a promoção também refere (umas raparigas em trajes menores a brincarem com copos de champanhe). Embrulha-se tudo num amontoado de cenas confusas, filmadas e montadas de qualquer maneira, e deixa-se correr em fundo um argumento carregado de pretensões de profundidade filosófica. A pobreza disto tudo é inenarrável. Há mais densidade psicológica num porno, maior sofisticação dramatúrgica nos "Morangos com Açúcar". Triste o filme que tem dos seus espectadores uma ideia tão má, triste o povo em nome de quem se fazem filmes destes. Raramente se viu pior (aqui ou na China).

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