Coreográfica do gesto

Concebido antes da eclosão da Guerra de 1939-1945 e, sobretudo, para influenciar uma tomada de posição da América contra o poder ascendente da ditadura hitleriana, tem sido mal entendido e bastante mal amado. Do ponto de vista da representação, torna-se fulcral pela divisão de personalidades e pelo uso evidente do duplo, intuído em toda a relação Chaplin/Charlot.

Embora o barbeiro se pareça com Charlot (como o seu sósia, aliás), estamos perante uma estratégia pós-Charlot, como se este interpretasse um barbeiro, já de posse do dom da voz. Politicamente, foi muitas vezes acusado de demagogia, nomeadamente no discurso final de pacificação e na famosa sequência do globo insuflado com que o ditador brinca, atirando-o ao ar.

Os "gags" permanecem reconhecíveis (a bala de canhão que cai no chão, as agressões em cadeia, uma eterna desfuncionalixzação do real), mas surgem inscritos numa lógica sequencial de um manifesto (contrariamente a "Tempos Modernos", por exemplo) que é, em simultâneo, o encadear de uma história paralela de dois universos contrários. Ainda que funcione como filme de propaganda, supera-se porque insiste numa noção coreográfica do gesto, ligando-se, assim, a uma tradição ininterrupta da pantomima. Os bigodes à la Charlot funcionam como o sinal e o contra-sinal de uma coerência "incoerente".

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