Olympia de Paris: Uma lenda com meio século de história

Foto
A personagem principal da lenda é a própria sala DR

O "faro" do fundador, Bruno Coquatrix, nunca o abandonou, de resto. Os Beatles foram lá acolhidos no começo da carreira. Os Rolling Stones também. Quando o jazz era ainda um pouco secreto e sulfuroso na Europa, o Olympia recebia Nat King Cole, Billie Halliday, Ella Fitzgerald, Louis Amstrong...

Com a elegante discrição que convém aos grandes deste mundo, não há festa no dia de anos. É só a 26 de Abril que o "music-hall" convida os seus amigos para uma "soirée" mantida ainda secreta. Por ora, a sala situada perto da Ópera - mas "mais célebre do que a Ópera ou Comédia Francesa", segundo os artistas do mundo inteiro que por lá passaram - limita-se a desenrolar uma programação capaz de fazer empalidecer as outras salas europeias: a imensa Juliette Greco em Fevereiro, seguida por Serge Reggiani e por um concerto excepcional de Diana Ross em Março. Fiel, afinal, aos seus princípios, e fiel à sua lenda.

Quando o Olympia abriu as portas, numa noite gelada de 5 de Fevereiro de 1954, já se tinha criado uma certa expectativa em Paris. A França estava ainda em reconstrução, depois da II Guerra Mundial. Havia uma sede imensa de divertimento, mas poucas estruturas adaptadas à época. Bruno e Paulette Coquatrix, sem um tostão no bolso mas cheios de entusiasmo, querem criar o "music-hall" à francesa neste templo de 2500 lugares. O edifício foi construído em 1893 para servir primeiro de parque de atracções; depois, foi sala de concertos e, a seguir, cinema.

O primeiro a pisar o palco naquela noite de 1954 é um jovem desconhecido, Gilbert Bécaud, convidado a animar a primeira parte do concerto de uma vedeta confirmada da época, Lucienne Delyle. Um ano depois, aquele que entretanto fora alcunhado o "Senhor 100 mil volts" será o primeiro imenso triunfo do Olympia, provocando as primeiras cenas de histeria colectiva na plateia. Mas Bruno Coquatrix nunca teve medo das cadeiras partidas. Em 1955, Edith Piaf eleva a sua voz poderosa entre as paredes negras do "music-hall". Em 1966, Jacques Brel deu lá o seu concerto de adeus, já minado por um cancro. Bécaud, Piaf, Brel: três gigantes da canção francesa, que salvaram diversas vezes o Olympia da falência, dando longas séries de concertos para encherem os cofres.

A personagem principal da lenda é a própria sala. As paredes negras e as poltronas de veludo vermelho criam um ambiente extraordinário. Mas é a pequenez da sala que lhe dá um sentimento intimista admirado por todos os que lá actuaram: "Esta sala está cheia de coisas que a tornam insubstituível. Os artistas que vêem em 'tournée' do mundo inteiro dizem-me todos o mesmo: quando estão no palco, têm a impressão de tocar o público com as mãos e de estarem rodeados pelos espectadores", recordava ontem Paulette Coquatrix, para quem o sucesso da sala reside nos "odores" lá deixados pelos artistas.

"Odores" virtuais, já que a sala foi destruída em 1997 e reconstruída exactamente da mesma maneira, mas com um nível mais elevado. Bruno Coquatrix já não era deste mundo. A mulher e a filha, Patricia, que lhe sucederam com a assistência de um sobrinho, Jean-Michel Boris, passaram por este momento difícil em que o Olympia chegou a estar ameaçado de demolição, para sempre, pelo banco Société Générale, proprietário do local. A mobilização da família, e dos artistas, levou à intervenção de um ministro da Cultura, Jack Lang, que atribuiu uma licença especial à sala, proibindo assim o seu desaparecimento.

Em Novembro de 1997, o Olympia reabre em grande pompa, com um concerto de Gilbert Bécaud (hoje falecido). Mas, quatro anos depois, a falência bate de novo à porta, e a família vende a sala ao grupo Vivendi Universal. Receou-se que o novo proprietário viesse a recusar produzir cantores que tivessem assinado com outras marcas, mas não. Todos continuam a ser bem-vindos, como no tempo de Bruno Coquatrix.

Sugerir correcção
Comentar