O lado longínquo do mundo Green Peace

O ecléctico Peter Weir tem no currículo coisas tão diferentes como "O Ano de Todos os Perigos" e "Green Card", "Gallipoli" e "O Clube dos Poetas Mortos", "A Costa de Mosquito" e "Truman Show", "A Testemunha" e "Fearless", sem falar dos filmes que nos anos 70 rodou na sua Austrália natal, os relativamente célebres "The Cars That Ate Paris" e "Picnic at Hanging Rock". Acima de tudo um bom gestor de argumentos e recursos de produção, aparentemente cuidadoso na escolha dos projectos em que se envolve (os intervalos entre dois filmes, que agora andam na casa dos cinco anos, talvez sejam um indício), conseguiu granjear uma aura de respeitabilidade, raramente concedida a outros realizadores em tudo semelhantes mas mais dados a "irem a todas".

Ao mesmo tempo, é bem verdade que há um lado anódino na filmografia de Weir, que fez filmes célebres e famosos ("O Clube dos Poetas Mortos" deve ser o melhor exemplo), é certo, mas que nunca fez um filme memorável, algo que dê especial vontade de rever ou que acorra com frequência à lembrança. No seu melhor (aqui se calhar o melhor é convocar "A Testemunha"), é um cineasta capaz de levar a rotina às suas máximas virtudes; no seu pior, é um cineasta capaz de afundar na rotina projectos que, à partida, teriam algo de especial e anti-rotineiro ("Truman Show" entra aqui).

O que torna "Master and Comandes - O Lado Longínquo do Mundo" um objecto minimamente interessante é o facto de ele parecer corporizar - sem nunca se decidir verdadeiramente, o que é pena - esse conflito entre o cumprimento da rotina e a procura de algo de mais excêntrico. Aparentemente, estamos numa atmosfera de género épico, durante as guerras napoleónicas, a bordo do navio inglês do qual Russell Crowe é "master and commander".

Com relativa banalidade, e até previsibilidade, seguimos as manobras estratégicas navais, o confronto com um "navio fantasma" francês, a vida no navio, as relações entre os oficiais e os marujos, e por aí adiante - tudo tutelado pela figura de Crowe, a ensaiar outra vez a pose heróica "bigger than life" de "Gladiador", com as necessárias adaptações. Tudo bastante aborrecido, incapaz de fazer esquecer por que razão o subgénero de "aventura naval" se esgotou há décadas. Mas a certa altura, o próprio Weir parece hesitar: continuar a cumprir esse programa ou, como a personagem do médico do navio (Paul Bettany, o actor de "Dogville"), perfeito e porventura deliberado émulo de Charles Darwin, deixar-se cativar pelo "paraíso" das Ilhas Galápagos e pela sua inaudita fauna (e fazer um "Green Peace" depois de ter feito um "Green Card"?).

De certa maneira, e sem que se consiga resgatar, o mais interessante do filme é o seu movimento final para o anti-clímax, quando a questão do eventual regresso e estadia nas Galápagos se sobrepõe ao desejo de "mais acção". Não chega a tempo de salvar coisa nenhuma, mas o último plano do filme, Crowe e Bettany em dueto musical, equivale a uma espécie de "que se lixe" que não parece nada isento de ironia. Pena que fossem precisas mais de duas horas para Weir lá chegar.

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