Relatório da Amnistia Internacional volta a denunciar maus tratos policiais em Portugal

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A Aministia reconhece melhorias nas condições das prisões portuguesas Paulo Pimenta/PÚBLICO

O relatório anual da Amnistia Internacional denuncia mais uma vez, à semelhança do que tem acontecido em anos anteriores, que se registaram em Portugal durante o ano de 2002 "maus tratos policiais, incluindo espancamentos e ofensas verbais baseadas em critérios de orientação sexual e raciais".

O documento, apresentado hoje no 42º aniversário da organização, centra-se em três mortes de cidadãos às mãos das forças de segurança, que estão ainda a ser investigados.

No quadro geral, a Amnistia concluiu que "o uso de armas de fogo pela polícia foi controverso em diversas ocasiões" e que se continuou a verificar a "falência das autoridades na salvaguarda da segurança dos prisioneiros".

Por outro lado, as condições de algumas prisões "não cumpriram as normas internacionais, tendo como principais problemas a sobrelotação, falta de higiene e inadequada acessibilidade a cuidados de saúde".

No que se refere à actuação das polícias, o relatório cita relatos de maus tratos no momento de detenções e nas esquadras, afirmando que as alegadas vítimas "incluíram crianças, mulheres e pessoas de minorias étnicas". Em alguns casos, denuncia a AI, "foram dificultadas as tentativas de apresentação de queixa contra a polícia por parte das vítimas".

Três mortes ainda sob investigação

O relatório elenca os casos de António Pereira e Nuno Lucas, ambos "mortos a tiro pela PSP em duas diferentes ocorrências, em circunstâncias controversas" já que, "de acordo com relatos, nenhum dos homens estava armado", e o de Ângelo Semedo, morto em Dezembro de 2001 na sequência de uma perseguição policial.

O caso mais mediático foi o de António Pereira, 25 anos, membro do Centro Cultural Africano de Setúbal, morto por disparos da PSP em Junho de 2002 no bairro da Bela Vista, quando tentava intervir numa luta. A Amnistia escreveu ao Governo a pedir esclarecimentos sobre as circunstâncias destes três casos fatais, tendo sido informada em Dezembro que estavam a decorrer as investigações criminais sobre os casos de António Pereira e Nuno Lucas.

A Inspecção-Geral da Administração Interna também accionou processos disciplinares contra os agentes policiais implicados nos dois casos, "mas nenhum deles foi suspenso ou impedido do porte de arma".

O Governo informou, por outro lado, que Ângelo Semedo, de 17 anos, tinha sido atingido no abdómen "por bala disparada pelo agente da polícia que o perseguia a pé na sequência de relatos de que um automóvel teria sido roubado e que o condutor tinha sido violentamente agredido". Em Outubro, acrescenta o relatório, o IGAI, após processo disciplinar, deliberou que o agente da polícia implicado fosse suspenso por 75 dias por infracção às regras de uso de armas de fogo.

Contudo, nota a AI, "o castigo disciplinar foi suspenso" e, no final do ano, continuava em curso a investigação criminal.

O relatório da Amnistia Internacional chama também a atenção para as mortes sob custódia policial, referindo que entre Dezembro de 2001 e Janeiro de 2002 três pessoas de origem ucraniana "cometeram alegadamente suicídio" em diferentes esquadras de polícia, sendo que dois deles se diziam ameaçados por criminosos.

Melhorias nas prisões

"As autoridades começaram a melhorar a segurança nas prisões" após graves incidentes de violência entre prisioneiros em 2001, reconhece a Amnistia, que sublinha, contudo, que "continuam a existir preocupações sobre as condições prisionais".

O relatório cita, nomeadamente, alegações de maus tratos por parte de guardas prisionais, bem como problemas de sobrelotação e inadequado acesso a cuidados de saúde médicos.

O documento nota ainda que até ao final de 2002 ainda não havia acusação formada relativamente às mortes ocorridas na penitenciária de Vale de Judeus em Outubro de 2001.

Racismo: problemas persistem

A AI debruça-se também sobre o racismo em Portugal, citando um relatório da Comissão Europeia Contra o Racismo em que esta reconhece "uma série de medidas tomadas pelas autoridades para combater o racismo", ao mesmo tempo que nota, no entanto, "a persistência de problemas".

É o caso da "escassez de processos accionados sob a cláusula do Código Penal que pune actividades levadas a cabo com o intento de incitar ou encorajar a violência, ódio ou discriminação racial".

A organização denuncia ainda "vários relatos de agentes da lei que usam força excessiva" contra imigrantes ou ciganos, exprimindo preocupação sobre "a alegada impunidade dos agentes da polícia responsáveis por tais actos", baseando-se também no parecer da Comissão Europeia Contra o Racismo.

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