Sampaio reafirma ilegitimidade da ofensiva militar contra o Iraque

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O Presidente congratulou-se com o facto de Portugal não participar no esforço de guerra Bruno Rascão (PÚBLICO)

O Presidente da República reafirmou esta noite a ilegitimidade de uma acção militar contra o Iraque sem o aval das Nações Unidas. Apesar da oposição à actuação do Governo, Jorge Sampaio apelou à unidade nacional e pediu aos portugueses "uma reflexão serena sobre o futuro".

Numa declaração ao país de cerca de 15 minutos, Jorge Sampaio voltou a mostrar-se coerente quanto à posição que assumiu desde a primeira hipótese de se avançar para uma guerra contra o regime iraquiano sem a permissão do Conselho de Segurança da ONU, argumentando que só depois de "esgotados todos os meios políticos [uma guerra] é legítima face ao direito internacional nos casos claramente tipificados na Carta das Nações Unidas".

Porém, o chefe de Estado esclarece que, apesar de não concordar com a solução encontrada para resolver a actual crise, não há "qualquer complacência com o regime iraquiano que tem uma longa e deplorável história de actuações atentatórias à paz e à segurança internacionais, de flagrante desrespeito pelos direitos humanos e de desafio à autoridade do Conselho de Segurança da ONU".

"Defendi sempre que seria necessário esgotar os caminhos pacíficos, cabendo ao Conselho de Segurança, e só a este, decidir as opções a tomar uma vez avaliado o trabalho dos inspectores. É esta inquestionavelmente a via que respeita a Carta das Nações Unidas e o direito internacional, que corresponde à tradição jurídico-cultural portuguesa, reflectida na Constituição e a que mais traduz os interesses de um Estado como o nosso".

Sampaio lamenta que tenha sido "outro o entendimento que prevaleceu e que tudo indica levará a uma acção militar assente numa interpretação fortemente contestada das decisões do Conselho de Segurança e de como melhor defender a ordem internacional".

O Presidente diz ter sempre defendido "um processo que protegesse a autoridade da ONU e conduzisse a uma coligação tão ampla quanto possível", para que se "reflectisse a imagem de um sólido consenso da comunidade internacional sobre a forma mais apropriada para proceder ao desarme do regime de Bagdad". Para "não se agravarem crispações e mal-entendidos entre culturas e civilizações, teria sido esse o caminho desejável para preservar a unidade da Europa a da Aliança Atlântica", acrescentou.

Para Sampaio, as consequências desta crise - apesar de ainda desconhecidas - "afectarão certamente Portugal". "O dever dos órgãos de soberania é preservar a unidade nacional, indispensável para proteger os interesses e as diversas vertentes de segurança do país".

Fica mais uma vez a confirmação de que, "tendo em conta a inexistência de um mandato expresso das Nações Unidas", as Forças Armadas Portuguesas "não participarão neste conflito, não colaborarão nele, nem Portugal fará parte da coligação militar que se criar".

No entando, ressalva o Presidente, "Portugal irá prestar facilidades de trânsito [às forças norte-americanas] à semelhança de outros países europeus, alguns dos quais têm expressado fortes reservas a uma acção militar contra o Iraque", realçando que foi esse "o entendimento estabelecido com o primeiro-ministro, Durão Barroso". "Outra posição do país não teria sido para mim aceitável", sublinhou.

"Espero que a guerra seja breve"

Perante a aparente inevitabilidade de impedir uma acção militar, Sampaio diz esperar que "a guerra seja breve e proporcional aos objectivos proclamados", e que essencialmente se "procure poupar a população civil" e providenciar "condições humanitárias para que o povo iraquiano possa aceder à normalidade e a um regime democrático". Um processo que o Presidente remete para depois de "um período de transição sob a égide da ONU, instância a quem deverá competir a reconstrução do Iraque e a sua integração".

Mesmo perante a "gravidade da situação actual", Sampaio apela aos portugueses para não se distraírem "de uma reflexão serena sobre o futuro".

"A Europa tem de refazer a sua unidade, reafirmar com força um projecto comum, avançar nos caminhos da sua integração e reforçar a sua capacidade de afirmação externa", esperando que as "Nações Unidas reassumam o papel central que lhes cabe para as quetões relativas à paz e à segurança mundiais", "seguramente a via que melhor protegerá os interesses de Portugal".

O Presidente assegurou, por fim, que as autoridades portuguesas "tomaram medidas para reforçar a segurança do país", e apelou aos portugueses para se manterem "unidos e preparados para enfrentar as dificuldades que se nos colocam de uma forma serena".

Apelando à tranquilidade, Sampaio diz que tudo será feito "para continuar a garantir a confiança indispensável para que a vida quotidiana [dos portugueses] decorra na maior normalidade".

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