Tribunal dos EUA declara inconstitucional juramento de fidelidade à nação

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Os alunos norte-americanos não são obrigados a recitar o juramento de fidelidade Dai Sugano/San José Mercury News/AP

Pela primeira vez na história dos EUA, um tribunal declarou inconstitucional o juramento de fidelidade à nação, devido à expressão "conforme a Deus".

O tribunal de recurso — que avaliava uma queixa apresentada por um ateu — considerou que a frase demonstra um compromisso do Governo com a religião, o que é contrário à lei de separação entre Estado e Igreja.

A declaração "conforme a Deus" não difere das "conforme a Jesus" ou "conforme a Zeus", determinou o juiz Alfred T. Goodwin, defendendo que nenhuma destas promessas pode ser neutral no que diz respeito à religião.

As palavras "conforme a Deus" foram acrescentadas ao juramento de fidelidade em 1954 pelo Congresso e posteriormente aprovadas pelo Presidente Dwight Eisenhower, que considerou que a mudança era uma demonstração da "dedicação da nossa nação e do nosso povo ao Deus-Todo Poderoso".

A queixa foi apresentada por Michael A. Newdow, um ateu residente em Sacramento, que se opôs ao facto de a sua filha ser chamada a recitar o juramento de fidelidade na escola. "Sou um cidadão americano e não gosto de ver os meus direitos infringidos pelo meu Governo", justificou, citado pela CNN online. Para Newdow, a declaração contém "uma ideia religiosa com a qual algumas pessoas não estão de acordo".

Apesar de a sua filha — tal como os outros alunos — não ser obrigada a recitar o juramento, Newdow recorda que existe sempre a obrigação de "assistir e ouvir a sua professora, funcionária do Estado numa escola estatal, conduzir os seus colegas num ritual que proclama a existência de um Deus".

Por seu lado, a Administração americana argumenta que o conteúdo religioso da frase "uma nação conforme a Deus" é mínimo. Pouco depois da decisão do tribunal de considerar o juramento de fidelidade inconstitucional, o Senado americano aprovou uma resolução, por 99 votos a favor e nenhum contra, que apoia a declaração de obediência à nação.

O Presidente dos EUA já reagiu à decisão do tribunal, considerando-a "ridícula". George W. Bush afirma que a declaração do tribunal "está com o passo trocado em relação à história e tradição americanas". cita a Reuters.

O único senador presente na altura da aprovação da frase pelo Congresso, Robert Byrd, reagiu mal ao anúncio de inconstitucionalidade e questionou o juiz do tribunal de recurso sobre se também se pronunciaria pela inconstitucionalidade da Declaração de Independência. "Espero que o Senado não perca tempo em responder ao estúpido juiz. Sim, estúpido é o que ele é", vociferou. O líder da maioria democrata no Senado corroborou as declarações de Byrd. "Esta decisão é de loucos. É uma decisão inacreditável, incorrecta e estúpida", afirmou Tom Daschle.

O porta-voz do Senado, Dennis Hastert, escreve em comunicado: "Obviamente que o tribunal de São Francisco não esteve bem neste caso. Claro que somos uma nação, conforme a Deus. O Pledge of Allegiance [juramento de fidelidade] é uma saudação patriótica que reúne pessoas de todas as fés para partilharem o espírito americano".

"Acredito fortemente que os pais, professores e escolas devem encorajar as crianças a recitar o juramento no início do dia", defende o porta-voz. Para demonstrar isso mesmo, cerca de cem membros do Senado, na maioria republicanos, juntaram-se hoje no exterior do Capitólio para recitarem o juramento.

Se a declaração de inconstitucionalidade for para a frente, o juramento será banido das escolas públicas dos nove estados do Oeste cobertos pela jurisdição do tribunal de recurso.

Analistas legais adiantam que a decisão — a única do género no país — deverá seguir para o Supremo Tribunal, que começa as suas sessões com as palavras "Deus proteja os EUA e o respeitado tribunal".

Apesar das ameaças de que é objecto, nomeadamente telefónicas, Michael A. Newdow garantiu já que vai levar a queixa em frente.

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