Onze por cento dos portugueses não compraram medicamentos por falta de dinheiro

O valor baixou em relação a 2016, ano em que 12% dos inquiridos admitiram sofrer com o mesmo problema.

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Em mais de metade dos casos (59,5%) algum destes fármacos fazem parte de uma terapêutica prolongada ©Rui Gaudencio

Quase 11% dos portugueses deixaram de comprar medicamentos prescritos pelo médico por falta de dinheiro, em 2017, um valor que baixou relativamente a 2016.

Segundo um estudo elaborado pela escola de gestão de informação da Universidade Nova de Lisboa (NOVA IMS), que vai ser apresentado esta terça-feira, 10,8% dos portugueses optaram por não comprar algum medicamento prescrito por um médico devido ao custo dos fármacos, um valor que em 2016 tinha chegado aos 11,8%. De acordo com este trabalho, que é elaborado pela NOVA IMS, da Universidade Nova de Lisboa, a percentagem de doentes que deixaram de comprar medicamentos por causa do preço tem vindo sempre a baixar, passando dos 15,7% no primeiro ano de elaboração do estudo (2014) para os 14,2% em 2015.

Este estudo, que envolveu um inquérito com 500 entrevistas num universo de mais de 8,6 milhões de pessoas e cujos resultados foram extrapolados segundo uma pós-estratificação que tem por base as variáveis género e classe etária, mostrou ainda que subiu de 86,7 para 89,1 a percentagem de pessoas que tomaram no último ano medicamentos prescritos pelo médico. Destes doentes, em mais de metade dos casos (59,5%) algum destes fármacos fazem parte de uma terapêutica prolongada ou regular (para tratamento de uma doença crónica), um valor inferior aos 65,3 registados no ano de 2016, acrescenta o documento.

Sobre o seu estado de saúde, quase metade dos portugueses (45%) considera que afecta as tarefas diárias, percentagem ligeiramente inferior aos que consideram que o estado de saúde lhes provoca dor ou mau estar (47%) e aos que responderam que afecta negativamente a sua qualidade de vida (48%).

O estudo revela ainda que, apesar de na óptica dos portugueses a qualidade dos serviços ter diminuído ligeiramente no ano passado (66.7 pontos, menos 1,6 do que em 2016), a qualidade técnica efectiva do SNS – que usou 13 indicadores validados e ponderados por um grupo de peritos – subiu substancialmente, alcançando os 73.8 pontos (mais 5,3 dos que no ano anterior). Alguns dos indicadores utilizados para medir a qualidade técnica são a sépsis pós-operatória, a mortalidade por AVC (Acidente Vascular Cerebral) – hemorrágico ou isquémico –, o reinternamento em 30 dias e as cirurgias em ambulatório. Foi o cruzamento desta informação com a actividade, a despesa e o défice do Serviço Nacional de Saúde que permitiu calcular o índice de sustentabilidade da saúde, que progrediu dos 102.2 para os 103.0 pontos.

Dificuldades de deslocação aos hospitais

A análise mostra também que os portugueses faltam a muitas consultas nos hospitais públicos por razões económicas. Os investigadores fizeram a análise do impacto dos custos de transporte no acesso aos cuidados de saúde e verificaram que, no que se refere às consultas externas (hospitais), este impacto é quase o dobro do dos custos das taxas moderadoras. Segundo o estudo, ficaram por realizar 539.824 consultas externas/especialidade nos hospitais públicos devido aos custos de deslocação e 254.568 por causa do preço das taxas moderadoras. Já os dois motivos em conjunto (valor das taxas e custo da deslocação) fizeram com que não se realizassem 260.905 consultas externas nos hospitais, o que faz ascender a um milhão o número de consultas por realizar por todos estes motivos.

"As consultas, os exames e os episódios de urgência perdidos por via do valor das taxas moderadoras tem vindo a diminuir, o que é extremamente positivo e mostra que as questões relacionadas com o preço da utilização do sistema têm vindo a ser cada vez menos relevantes", sublinha o coordenador principal do estudo, em declarações à Lusa. Pedro Simões Coelho considerou ainda "muito importante" esta vertente do custo dos transportes e frisou: "Esta não é uma realidade intrínseca ao sistema, mas tem de ser considerada pois há determinadas franjas da população para as quais estes custos da deslocação devem merecer uma particular atenção."

No que se refere às consultas com um médico de clínica geral ou com o médico de família num centro de saúde, o peso do custo dos transportes nas consultas por realizar (253.318) é menor do que o das consultas nos hospitais. Nos centros de saúde, o motivo que levou à não realização de um maior número de consultas (439.997) foi o custo das taxas moderadoras. O estudo indica ainda que cerca de 13,5% dos inquiridos admitiram não ter recorrido às urgências devido ao custo das taxas moderadoras, resultando em 908.631 episódios de urgência por concretizar.

Quanto custa uma consulta?

Outra conclusão do estudo é que apesar de os portugueses continuarem a considerar os preços das taxas moderadoras adequados, mantêm uma percepção errada dos valores, uma vez que, nalguns casos, estimam custos acima dos reais.

De acordo com este trabalho, há uma diferença entre o valor que os portugueses julgam que custa (11,32 euros) e o que realmente custa (7 euros) a taxa moderadora para uma consulta externa/especialidade num hospital público.

"Quando analisamos a importância da taxa moderadora no acesso ao sistema faz sentido perceber se as pessoas sabem quanto custa e se os valores se aproximam da realidade, para perceber se vale a pena actuar sob o ponto de vista da comunicação", explica Pedro Simões Coelho. "O que estimamos é que ao nível das consultas de cuidados primários em centros de saúde e dos episódios urgência as pessoas têm noção exacta do preço (...). Agora, é uma percentagem pequena, mas ainda assim há 10% que acham que existe taxa moderadora para o internamento, que não existe, o que mostra que há um desalinhamento relativamente à realidade."