Uma boa mulher o leque e o salamaleque

"Uma Boa Mulher" é uma adaptação da peça de Oscar Wilde "O Leque de Lady Windermere" (que tinha como subtítulo "Uma Peça sobre uma Boa Mulher"). Os espectadores cinéfilos sabem que cinematograficamente a peça já tem "pedigree" - Ernst Lubitsch adaptou-a em 1925, num dos títulos maiores da sua obra e daqueles incomparáveis anos finais do mudo americano (mas há várias outras adaptações, em várias épocas e vários países).

Esqueçamo-lo, porque para além da matriz literária não há mais nada em comum entre a versão Lubitsch e o filmezinho de Mike Barker, muito mais primitivo. "Uma Boa Mulher" é uma pequena produção, modesta (e vá lá, honesta), anódina q.b., e que apesar de possuir um "cast" de respeito (Scarlett Johansson, Helen Hunt, Tom Wilkinson) é incapaz de se desembrulhar de um registo convencionalíssimo de telefilme (em certos momentos dir-se-ia mesmo de telenovela). Remove por completo o cinismo da história de Wilde, preferindo concentrar e exponenciar os seus aspectos sentimentalistas, mas evitando sempre olhar para o abismo - nunca ninguém pensou que "O Leque de Lady Windermere" viria a dar um "feel good movie" (e descobrimos no fim que "Uma Boa Mulher" nunca quis ser outra coisa).

A curiosidade maior é a transposição da peça para o princípio dos anos 30 e para Itália, em Amalfi, "resort" balnear para nobres ingleses e americanos endinheirados. Da alta sociedade londrina de finais do século XIX passamos para um retrato "transatlântico" das "idle classes" do período de entre guerras - sempre tudo muito manso e sem demasiada crueldade. Scarlett Johansson é a Lady Windermere, jovem (e ingénua) americana (neste caso), recém-casada, que não percebe a estranha influência que outra americana (Helen Hunt), mulher de má reputação (no sentido "socialite" da expressão), tem sobre o seu marido. Tom Wilkinson, actor inglês de escola sólida, é quem se sai melhor, no seu pragmático Tuppy - a única personagem em que se resolve bem a mistura de futilidade e gravidade vinda de Wilde. Depois há um conjunto de personagens secundárias que só lá estão para encarnarem a "sociedade" (as mulheres) e para debitarem as máximas "wildeanas" (os homens), numa espécie de "stand-up comedy" permanente (já alguém lembrou que é como os velhos dos Marretas a recitarem passagens de Wilde).

Em resumo: nada disto chega a ser desagradável, é apenas indistinto, indiferente, incolor, inodoro, insípido, entre muitos outros adjectivos de sentido semelhante que teria cabimento utilizar.

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