Lancelote do Lago

É a vez de arriscar no Porto a estreia de "Lancelote do Lago", filme de Bresson até agora inédito comercialmente em Portugal. "Arriscar" é palavra certa: nenhum cineasta é tão singular como Bresson, ou seja, nenhum cineasta, se encontra tão longe de quaisquer modas e tendências (sejam elas de ontem ou de hoje) e mostra esta capacidade para se ir inventando a si próprio sem, aparentemente, dever alguma coisa a alguém. "Lancelote do Lago", muito mais do o "filme de aventuras" que o título poderia sugerir, é uma reflexão metafísica sobre o Bem e o Mal, e sobre o modo como ambos os lados se organizam em face de um destino que é inexorável, único, e se abate sobre todos às cegas.   04/09/1998


Na paisagem cinematográfica contemporânea, "Lancelote do Lago" faz evidente figura de alienígena - já a fazia certamente há vinte anos, muito mais a faz agora. Mesmo que se possa preferir outros títulos da sua filmografia, o cinema declaradamente "anti-espectáculo" de Robert Bresson tem aqui um dos seus momentos mais límpidos: nem um só efeito a mais, numa espécie de movimento "para dentro" que se diria funcionar em moldes formais aproximáveis do cinema clássico (o apagamento das "marcas" da fabricação) mas que chega a resultados radicalmente diversos e insuperavelmente modernos. A abstracção cumpre-se pela tangibilidade do seu suporte físico: "Lancelote do Lago" está povoado de corpos (os actores aqui são pouco mais do que isso) mas o que Bresson filma verdadeiramente é a luz que os atravessa para os fulminar.
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