Rússia envia porta-aviões para o Mediterrâneo, EUA querem aviões em terra na Síria

Segundo algumas fontes, terão sido dois aviões russos Sokhoi SU-24 a lançar ataque que atingiu coluna com ajuda humanitária.

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A ONU não confirmou que o ataque à sua coluna tenha sido aéreo Omar haj kadour/AFP

Ao mesmo tempo que em Nova Iorque se discute como salvar o cessar-fogo na Síria, Moscovo anuncia que vai enviar um porta-aviões para o Mediterrâneo para apoiar a sua presença militar no país.

“Nesta altura, seis navios de guerra e três ou quatro navios de apoio fazem parte da nossa frota no Leste do mar Mediterrâneo”, declarou o ministro russo da Defesa, Sergei Choigou, citado pela AFP. “Para reforçar as nossas capacidades militares, vamos acrescentar-lhe o nosso porta-aviões Almirante Kouznetsov”.

Por seu lado, o chefe da diplomacia dos EUA apelou a que os aviões fiquem em terra “para permitir aliviar a situação e dar uma hipótese a que a ajuda humanitária seja distribuída sem impedimentos”, avança a BBC. John Kerry afirmou durante o seu discurso na ONU que o futuro da Síria “está por um fio”, e expressou as suas dúvidas sobre se os governos de Moscovo e Damasco estarão dispostos a respeitar a trégua.

As declarações surgem depois de altos responsáveis americanos terem afirmado, sob anonimato, que dois aviões de guerra russos sobrevoavam a zona no exacto momento em que uma coluna de ajuda humanitária da ONU foi atacada, perto de Alepo, na segunda-feira – uma acusação que Moscovo rejeita.

As mesmas fontes afirmaram à Reuters ter recebido informações dos serviços secretos dos Estados Unidos que os levaram a concluir que o ataque foi lançado por dois aviões russos Sokhoi SU-24. A BBC cita também dois altos responsáveis para acrescentar que o ataque foi demasiado sofisticado para ter sido da autoria do Exército sírio. E fontes do New York Times adiantam que apesar de ter informação sobre a intervenção russa, a Administração americana quer dar tempo e espaço a Moscovo para fazer a sua investigação e apresentar as suas próprias conclusões sobre o bombardeamento.

À margem da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, o porta-voz do Ministério russo dos Negócios Estrangeiros rejeitou as acusações e afirmou aos jornalistas que o Governo americano “não tem factos” que as apoiem. “Não temos nada a ver com a situação”, declarou.

Horas antes, o Governo russo tinha argumentado que a coluna de ajuda humanitária não foi atacada a partir do ar. “Não há crateras e o exterior dos veículos não apresentam o tipo de danos criados pela explosão de bombas lançadas do ar”, lê-se numa declaração do Ministério da Defesa, citada pela BBC.

A ONU indicou por seu lado “não estar em posição de determinar se [os ataques] foram aéreos”. Mas um alto responsável americano garantiu ao NYT que “não há indícios de que tenha sido outra coisa que não um ataque aéreo”. Em todo o caso, Moscovo não negou que estava a seguir os veículos (foram emitidas imagens recolhidas por drones), mas afirmou ter-lhes perdido o rasto quando entraram em território rebelde.

Os alvos dos mísseis foram um armazém usado pelas organizações humanitárias e uma coluna de 31 camiões que transportavam produtos de assistência urgente – alimentos, antibióticos, material cirúrgico – para 78 mil pessoas numa localidade cercada da província de Alepo. Dezoito veículos ficaram totalmente destruídos. Para além disso, o chefe do Crescente Vermelho Sírio, Omar Barakat, e cerca de 20 civis perderam a vida, adiantou aquela organização.

Para o porta-voz da Casa Branca, Ben Rhodes, “só duas entidades podem ser responsáveis, ou o regime sírio, ou o Governo russo”, cita a estação britânica. “Em qualquer dos casos, responsabilizamos o Governo russo pelos ataques nesta zona”, uma vez que estava obrigado pelo acordo de cessar-fogo a controlar as manobras do Exército sírio (os dois países estão envolvidos no conflito, apoiando dois lados opostos, mas combatendo um inimigo comum: o autoproclamado Estado Islâmico).

Na sequência do ataque, que a provar-se intencional seria classificado como “crime de guerra”, as Nações Unidas decidiram suspender a distribuição de ajuda no país até verem garantidas condições mínimas de segurança.

Fazer chegar o auxílio às populações cercadas era já um dos pontos do acordo mais difíceis de pôr em prática, com os Estados Unidos a acusar o regime sírio de dificultar a missão das agências humanitárias e a pressionar publicamente a Rússia. Os outros pontos prevêem uma colaboração das duas potências no ataque aos extremistas e trabalhar para restaurar a confiança de forma a retomar as negociações para a paz, numa guerra que leva já cinco anos.

A trégua estava em vigor desde 12 de Setembro e tinha sido já fortemente abalada no sábado, quando um ataque dos Estados Unidos que visava combatentes do EI acabou por matar 60 soldados sírios por engano.

Ainda antes do incidente de segunda-feira, Damasco acusou os rebeldes de não terem respeitado "nenhuma das disposições" do acordo, dando-o por terminado; e militares de Moscovo declararam “não fazer sentido” o Exército sírio cumprir unilateralmente o combinado. Mas a Rússia não chegou a passar uma certidão de óbito ao acordo que negociou com Washington e as tentativas para o reanimar continuam, em Nova Iorque, onde decorre a Assembleia Geral da ONU.

 “O cessar-fogo não morreu”, assegurou o secretário de Estado norte-americano, John Kerry depois de uma reunião com o seu homólogo russo, Sergei Lavrov. “Ainda há alguma forma de o cessar-fogo acontecer? Não posso responder a isso”, comentou por seu lado o chefe da diplomacia francesa, Jean-Marc Ayrault. Sem a trégua, haverá “uma espiral de guerra, mas temos de ser honestos, as negociações entre os EUA e a Rússia atingiram o seu limite”.

Prevê-se que esta quarta-feira o Conselho de Segurança da ONU faça uma reunião de emergência para discutir a questão síria, adianta a Reuters.

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