Modi, Rousseff, Abe e Merkel criticam "falta de legitimidade" da ONU

Grupo dos países que mais pressão fazem para entrarem no órgão da ONU que tem a função de manter a paz e a segurança internacional reúne-se em Nova Iorque.

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Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, com direito a veto, têm pouca vontade de mudar Kevin Lamarque/REUTERS

O Conselho de Segurança das Nações Unidas “reproduz o quadro mental do século que deixámos para trás”, afirmou o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, que convidou este sábado, em Nova Iorque, os dirigentes do Brasil, Japão e Alemanha – o chamado G4, dos países mais empenhados na reforma deste órgão da ONU – para divulgar as suas pretensões.

“Precisamos de um Conselho que reflicta de forma correcta a representação dos poderes mundiais e que seja eficaz”, disse a Presidente do Brasil, Dilma Rousseff. “As maiores democracias do mundo, as maiores locomotivas da economia mundial, devem lá estar representadas, para lhe dar maior credibilidade e legitimidade”, declarou, antes dos compromissos do dia na Assembleia-Geral das Nações Unidas.

Neste momento, o que acontece é que os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, com direito a veto, são os vencedores da II Guerra Mundial – e as nações que mais rapidamente obtiveram a bomba atómica, o que fez entrar a China neste clube onde já estavam os EUA, a Rússia, o Reino Unido e a França. Moscovo, Washington e Pequim são os grandes utilizadores do poder de veto – e estão pouco dispostos a partilhá-lo com eventuais novos membros permanentes do Conselho.

A necessidade de reforma, no entanto, é muito reconhecida, e o ex-secretário-geral Boutros Boutros-Ghali lançou em 1992 as primeiras bases de discussão de como deveria fazer-se. Mas o processo enreda-se e arrasta-se, devido aos conflitos de interesses entre as nações. A 17 de Setembro, no entanto, a Índia conseguiu fazer aprovar pela Assembleia Geral das Nações Unidas um documento que será usado como base para as discussões sobre a reforma do Conselho de Segurança durante o próximo ano – algo que a diplomacia de Nova Deli está a encarar como uma vitória.

“Todos estamos a celebrar o facto de podermos falar sobre a reforma da ONU tendo papéis na mesa”, afirmou ao jornal The Hindu Asoke Mukerji o representante permanente da Índia nas Nações Unidas, em Nova Iorque. É a primeira vez que é aceite pela Assembleia-Geral um texto concreto como base de negociações, para além das declarações e discursos.

Mudança ou irrelevância
Modi juntou os outros líderes do G4 – pela primeira vez em 11 anos, desde que o grupo foi criado – para aproveitar o fôlego da aprovação do documento. E também do momento em que se multiplicam declarações sobre a inoperância do Conselho de Segurança, em que o jogo do veto conduz à paralisia e – alerta Kofi Annan, outro ex-secretário-geral da ONU –, provavelmente à “irrelevância”.

“Acredito firmemente que o Conselho deve ser reformado: não pode continuar como está. O mundo mudou e a ONU deve mudar e adaptar-se. Se não mudarmos o Conselho de Segurança, arriscamo-nos a ter uma situação em que a sua primazia pode ser desafiada por alguns países emergentes”, disse Annan ao jornal The Guardian.

“Os que estão em posições de privilégio têm de pensar bem e decidir quanto do seu poder estão dispostos a ceder para que a participação dos recém-chegados seja significativa. Se o fizerem, terão a sua cooperação; se não o fizerem, arriscamo-nos a ter confrontos”, alertou Annan.

No entanto, apesar dos alertas e da pressão do G4, o mais provável é que nada mude – pelo menos em breve. Enquanto os Estados Unidos têm optado pela estratégia do silêncio, a China e a Rússia são os membros permanentes que mais se opõem ao alargamento do quadro a mais países com poderes semelhantes aos seus (os membros temporários não têm poder de veto).

A China opõe-se à entrada do Japão, por motivos históricos – e de hegemonia regional. E, num artigo publicado no diário estatal chinês Global Times após a aprovação do documento de negociação pela Assembleia-Geral da ONU, o analista Liu Zongyi, do Instituto de Estudos Internacionais de Xangai (estatal também) escreveu que a aliança da Nova Deli com o Japão, a Alemanha e o Brasil para entrar no Conselho de Segurança “é o maior erro” da Índia.

Ao apresentar o texto, a Índia conseguiu, pelo menos, que se tornassem mais claras as posições dos cinco países com direito de veto, diz o The Hindu.

Os Estados Unidos disseram estar a favor de “uma expansão modesta”, sem apoiarem nenhuma fórmula concreta ou a extensão do direito de veto. A China disse que não era altura para negociar a sério, mas que apoiaria “reformas necessárias e razoáveis”. A Rússia disse também que apoiaria “opções razoáveis” de aumentar o Conselho, mas não estaria disponível para alterar o direito de veto. França apoia a entrada dos países do G4 e tem uma proposta para que os cinco membros permanentes suspendam voluntariamente o seu direito de veto quando estiverem em discussão situações de genocídio ou outros crimes graves. O Reino Unido apoia a entrada do G4, mas não lhes daria direito de veto.

Dificilmente haverá acordo a curto prazo. “Talvez fique para os nossos filhos”, disse Marco Aurélio Garcia, assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidente Dilma Rousseff, em Nova Iorque, citado pela Folha de São de Paulo.

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