Eram nazis suspeitos de crimes mas os EUA pagaram-lhes a reforma

Departamento de Justiça dos EUA fez acordo com dezenas de antigos oficiais nazis para que regressassem aos seus países para serem julgados. Apenas dez foram a tribunal.

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Após a II Guerra Mundial, muitos oficiais nazis fugiram para os EUA Katarina Stoltz / Reuters

Dezenas de suspeitos de crimes relacionados com o regime nazi receberam durante décadas milhões de dólares em pensões de reforma dos Estados Unidos e alguns continuam a receber, de acordo com uma investigação da Associated Press.

Após o final da II Guerra Mundial, muitos antigos oficiais do Reich alemão fugiram à justiça e escolheram os EUA para começar novas vidas. Mas durante os anos 1980, o Departamento de Justiça norte-americano iniciou a chamada “caça aos nazis”.

A ideia era extraditar os suspeitos para os seus países de origem para que fossem julgados, uma vez que os tribunais norte-americanos não tinham poder para decidir sobre crimes cometidos fora do território dos EUA.

Havia então que fazer com que dezenas de antigos oficiais nazis abandonassem o país que os acolheu e admitissem ter mentido aos serviços de imigração sobre o seu passado. Todo esse processo era demorado, chegando a poder durar dez anos até à extradição.

Pressionado para acelerar os procedimentos, o Gabinete de Investigações Especiais – o organismo do Departamento de Justiça encarregado da “caça aos nazis” – decidiu “negociar” com os suspeitos: a Segurança Social comprometia-se a não retirar as pensões a que os antigos nazis tinham direito depois de décadas de contribuições, caso abandonassem voluntariamente o país.

Segundo a investigação da AP, desde 1979, pelo menos 38 dos 66 suspeitos de crimes contra a humanidade que abandonaram os EUA mantiveram as suas reformas – quase sempre muito acima do rendimento médio nos seus países. E foram apenas dez os que acabaram por ser julgados depois de regressarem à Europa, segundo os números do próprio Departamento de Justiça.

Confrontado com os dados da investigação, o Departamento de Justiça justificou o pagamento das reformas como a forma de extraditar os suspeitos “mais expedita possível” para que pudessem ser julgados. “Se alguém renuncia à cidadania norte-americana e abandona voluntariamente os EUA, então pode continuar a receber os benefícios da Segurança Social”, explicou o porta-voz Peter Carr.

Actualmente ainda há pelo menos quatro suspeitos vivos que continuam a receber pensões da Segurança Social norte-americana. Um dos casos revelados pela AP é o de Jakob Denzinger, um antigo guarda do campo de concentração de Auschwitz – onde foram mortas mais de um milhão de pessoas entre 1940 e 1945 –, que regressou à Europa em 1989, depois de ter fundado uma empresa de plásticos no Ohio. Actualmente vive na Croácia e recebe 1500 dólares (1180 euros) mensais.

Denzinger não quis falar com os repórteres da AP que o encontraram na sua casa em Osijek, mas o seu filho, que vive nos EUA, confirmou que o pai recebe uma pensão da Segurança Social norte-americana. “Isto não sai do bolso das pessoas, ele contribuiu para o sistema”, justificou.

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