PS sugere que GES comprou saída de Álvaro Sobrinho

Espírito Santo International financiou veículo Eurofin para comprar acções do GES na posse do banqueiro luso-angolano.

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Inês Viegas: as operações com a Eurofin e a petrolífera estatal venezuelana “tiveram impacto na falência do banco” Nuno Ferreira Santos

O deputado do PS, Pedro Nuno Santos, relatou nesta quarta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ao colapso do BES e do GES que um dos veículos da Eurofin, designado Jarvis Asset, possuía, a 31 de Dezembro de 2013, activos financeiros de 44 milhões de euros. E que, deste montante, cerca de 30 milhões eram acções próprias da Espírito Santo International (ESI) adquiridas a Álvaro Sobrinho, o ex-presidente do BES Angola. A transacção ocorreu um ano depois de Sobrinho ter adquirido 2500 títulos da ESI a 12 euros cada. O mesmo deputado relatou ainda que as acções foram comparadas ao banqueiro luso-angolano, pela Jarvis/Eurofin, com financiamento da própria ESI.

À questão se conhecia a operação, dado ter auditado as contas da ESI, a responsável da KPMG em Portugal, Inês Viegas, afirmou: "Essa informação foi veiculada, mas não conseguimos confirmar” e “no relatório de 31 Dezembro de 2013 optámos por propor um provisionamento dos saldos que não estavam explicados."

Álvaro Sobrinho travava em 2012 uma guerra aberta com Ricardo Salgado, o que pode ter justificado o investimento da ESI para afastar o ex-presidente do BESA das holdings accionistas do GES onde circulava toda a informação relevante sobre o universo familiar.

Inês Viegas, a protagonista da sessão desta quarta-feira da CPI, reconheceu durante a sua audição que as duas operações envolvendo a sociedade suíça Eurofin e as cartas de conforto assinadas por Ricardo Salgado e José Manuel Espírito Santo à petrolífera estatal venezuelana ajudaram à falência do BES.

“As duas operações somadas, de 1500 milhões de euros, tiveram impacto”, reconheceu Inês Viegas, partner da KPMG, o auditor externo da instituição financeira e da ESFG entre 2002 e 2014 (e que aditou a ESI no âmbito do ETRIC, exame às contas da holding levado a cabo pelo Banco de Portugal).

Inês Viegas observou que não tem condições para “poder dizer que tenham” sido apenas estas duas operações a contribuir para a insolvência do segundo maior banco privado português. Inquirida pela deputada Teresa Anjinho, do CDS/PP, sobre se antes das duas operações que geraram um prejuízo de 1500 milhões ao BES o banco poderia ser considerado sólido, a auditora escusou-se a responder e alegou que qualquer resposta seria “opinativa”. Uma tese a que tem recorrido durante a sua audição.

Adiantou ainda que a 30 de Julho de 2014, na véspera da intervenção do Estado no BES, a garantia da República Popular de Angola ao BESA (de 3400 milhões) era válida, como prova “o facto de ter sido revogada” na sequência da medida de resolução.

“A primeira vez que ouvimos falar no Eurofin foi quando fizemos a avaliação à ESI. E em Julho, no âmbito das recompras [de 700 milhões de obrigações por parte da Eurofin], é que nos apareceu como intermediário o Eurofin”, adiantou Viegas.

“Posso dizer que, no âmbito do nosso trabalho, nunca houve nenhum impeditivo de acesso à informação” por parte do BES “que nos levasse a chegar a um extremo", notou. E evidenciou que, em todos os trabalhos, as auditoras enfrentam problemas, "seja no BES ou em qualquer cliente”.

Versões desencontradas

O presidente da PricewaterhouseCoopers (PwC), José Alves, trouxe a esta CPI outra versão dos factos, sublinhando que Ricardo Salgado concentrava muito poder e que no BES havia "dificuldade em obter informações”. E foram estas razões que estiveram na base da ruptura entre a auditora (a PwC foi o auditor externo do BES entre 1992 e 2002) e o banco.

Sobre o excesso de poder de Salgado, Viegas disse: “É claro que o dr. Ricardo Salgado tem a sua personalidade forte”, mas “quando tínhamos reuniões” havia “uma diversidade de pessoas como interlocutores, com quem discutíamos os assuntos". Ainda assim, a mesma auditora lembrou que nos últimos anos o ex-presidente do BES acumulava menos funções do que em 2001, altura em que PwC foi substituída pela KPMG.

Outro ponto de discordância entre auditores externos prende-se com esta declaração de Viegas: a PwC “nunca transmitiu” à KPMG “nenhuma reserva quanto à matéria de aceitação de cliente e nada indiciava que não era aconselhável aceitar aquela auditoria”. José Alves disse na CPI que quando a PwC rescindiu com o BES informou que “na relação” com o banco se verificou grande “tensão decorrente das dificuldades na obtenção de prova de auditoria”.

O que é que falhou?

O tema Eurofin, classificado pelo BdP como sendo "eventualmente fraudulento", esteve em cima da mesa ao longo de toda a audição. Em causa estão as operações financeiras efectuadas em Julho, semanas antes da falência em cascata do GES, e que geraram um prejuízo para o BES de 700 milhões de euros. A partner da KPMG assegura que “não tem evidências documentadas de que as transacções tenham sido efectuadas através da Eurofin e que o dinheiro tenha sido utilizado para pagamento de dívida do GES a clientes" do banco (que recomprou os títulos de divida a valores mais baixos).

De acordo com Inês Viegas, foi o BES que comunicou à KPMG o esquema Eurofin. Mas "apercebemo-nos de que o Panamá [BES Panamá] comprava e vendia e fazia praticamente ganhos instantâneos”, que eram apropriados “por terceiros e, até hoje, não sabemos quem é”. Inquirida pelo deputado do PCP, Miguel Tiago, sobre de quem partiu a informação, Inês Viegas contou que lhe foram facultadas por Isabel Almeida.

"O que é que falhou? O que posso dizer é que não foram os auditores, claramente." Inês Viegas avança mesmo, que na sua opinião, a KPMG “teve um papel importante desde o início do processo".

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