Empresas públicas demoram mais 90 dias a pagar do que as privadas

Sector empresarial do Estado voltou a derrapar nos prazos de pagamento. Análise da UTAO mostra estrutura de capitais totalmente desequilibrada.

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CP é das que mais se atrasam a pagar

A redução dos atrasos nos pagamentos a fornecedores das empresas públicas, que se vinha registando desde o final de 2012, inverteu-se no final do ano passado. Esta nova derrapagem, para uma média de 128 dias de demora, fez com que o sector empresarial do Estado se afastasse ainda mais dos níveis do sector privado. Em Dezembro do ano passado, a diferença era empresas públicas e privadas chegava a 90 dias.

Estes dados constam da análise da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) à execução das contas públicas, mas o relatório também comprova a existência de uma estrutura de capitais completamente desequilibrada no sector empresarial do Estado. Ao mesmo tempo, mostra que, no sector público, a rentabilidade dos negócios é mais baixa, apesar de este sair beneficiado em termos das taxas de juro cobradas pelos bancos, face às aplicadas ao privado.

No que se refere aos prazos médios de pagamento, constata-se que a melhoria a que se vinha assistindo, desde que foi atingido um pico de 152 dias em Setembro de 2012, foi travada no final do ano passado, com as empresas públicas a registarem uma demora superior em quatro dias à do trimestre anterior. Nestes cálculos são incluídas apenas as entidades que não foram incluídas no perímetro das contas públicas, o que deixa de fora a Metro do Porto e a Refer, por exemplo.

A UTAO destaca que a demora a saldar dívidas por parte do sector empresarial do Estado “tornou-se significativamente superior ao das empresas privadas”, explicando que a inversão registada no final de 2013 fez com que se gerasse “um diferencial considerável”. De facto, o relatório mostra que o sector privado chegou a Dezembro do ano passado com um prazo de 40 dias – menos 88 dias do que as empresas públicas. 

Dados divulgados pela Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, e que incluem todo o sector empresarial do Estado, mostram que a CP lidera a lista de empresas que mais demoraram a saldar os seus compromissos, com um atraso de 229 dias. Seguem-se a Metro do Porto (173) e o OPART (134). No caso da segunda classificada, o resultado é influenciado por uma dívida de 15 milhões de euros à Normetro, que o Ministério das Finanças já autorizou que fosse paga em Fevereiro de 2015. A partir desse momento, o prazo diminuirá substancialmente.

No caso do sector da saúde, a derrapagem nos prazos de pagamento é ainda mais gritante, havendo 13 casos em que ultrapassa os 300 dias. O primeiro lugar na lista de “maus pagadores” é ocupada pelo Centro Hospital de Setúbal, com 813 dias.

Desequilíbrios gritantes
A análise da UTAO, uma entidade independente que funciona na Assembleia da República, comprova ainda que as empresas públicas têm um balanço muito desequilibrado, estando em quase 93% dependentes de capitais alheios. Esta situação tem vindo a degradar-se ao longo dos últimos anos. Em 2007, esse rácio era de 67,3. Muitas das entidades do sector empresarial do Estado têm, aliás, capitais próprios (a diferença entre activo e passivo) negativos, pelo facto de virem acumulando décadas de prejuízos.

O desequilíbrio torna-se ainda mais evidente quando é feita a comparação com as empresas privadas. De acordo com o relatório, neste caso, o balanço mostra uma dependência em 62,7% de capitais alheios. Apesar da subida registada, o nível tem-se mantido muito mais estável, já que era de 58% em 2007.

Em termos de acesso ao financiamento, a UTAO revela que as empresas públicas saem mais beneficiadas pelos bancos, sendo-lhes aplicadas taxas mais baixas sobre os empréstimos. Uma realidade que a unidade técnica associa ao facto de, muitas vezes, terem asseguradas garantias por parte do Estado. No final do ano passado, estavam a pagar uma taxa média de 3,7%, enquanto no sector privado a fasquia era de 4%.

Ainda assim, este benefício não chega para fazer diferença na hora de apresentar resultados, até porque o sector empresarial do Estado tem um passivo histórico, que já ultrapassou os 32 mil milhões de euros. O boletim da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, relativo ao último trimestre de 2013, revelou que o passivo financeiro das empresas públicas atingiu 32.531 milhões de euros nesse período, mais 3,6% do que no ano anterior. A este valor somam-se ainda outros 308,7 milhões da responsabilidade dos hospitais-empresa.

A análise da UTAO mostra ainda que, em termos de rentabilidade, as empresas públicas também ficam atrás do sector privado. Nas primeiras, o rácio é de 5,9%. E, nas segundas, chega a 6,7%. A fasquia tem, de qualquer forma, vindo a reduzir-se para as duas. 

O Governo colocou recentemente em marcha um novo plano para recapitalizar algumas entidades do sector empresarial do Estado, como tinha sido acordado com a troika. Além da reclassificação da CP, empresa com perto de 4000 milhões de euros de dívida que passará a contar para o défice e para a dívida, será transferido o passivo da Carris e da STCP para a esfera do Estado. Nestas duas transportadoras, o endividamento é de perto de 1200 milhões de euros.
 

   

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