Tenho a certeza absoluta que houve mais, muito mais, do que 23 boas notícias sobre ambiente em 2023. Debaixo do todo o caos e dos inúmeros trágicos recordes do ano que passou houve muitas batalhas ganhas. Umas pequenas, mais locais, outras enormes de alcance global. E o Azul também é sobre isso, sobre os avanços e vitórias.

Ambiente e clima não são sinónimos de caos, não são palavras com conotação negativa e nunca deixaremos que isso aconteça. Confesso que com alguma ironia, muito pouca graça e algum desânimo muitas vezes a equipa do Azul lamentou ter de partilhar convosco "mais uma notícia sobre o fim do mundo". Desculpem-nos (ou não) o exagero. Não tem graça nenhuma, é o cansaço a falar e talvez o medo de vermos alastrar a tal "fadiga climática" que desliga as pessoas da urgência desta crise do clima.

O assunto é sério e 2023 mostrou de forma muito clara que o planeta está a reagir às maldades que insistimos fazer, ano após ano, aviso após aviso. Na lúcida análise "Duas frases, um clima" publicada no Azul, Ricardo Garcia partilha a sua imensa sabedoria sobre o desastre que nos rodeia e obriga-nos a colocar os pés no chão, com a realidade sem paninhos quentes e a inevitável incerteza sobre o futuro. Mas sobre tudo o que vai mal no planeta Terra, todos os sintomas da doença, desde a sua febre aos mais variados eventos extremos que se multiplicaram por todo o lado, fomos dando notícia. Umas mais lidas do que as outras.

Os nossos leitores têm quase sempre razão. Muitas vezes, vá. O ambiente e a crise climática são temas que dividem ainda muito as opiniões, sobretudo sobre o ritmo e o destino a seguir para responder aos múltiplos desafios. Conseguimos perceber, contudo, que ler uma história sobre o mês mais quente desde que há registos deixe de despertar curiosidade, sobretudo quando, nas notícias seguintes, apenas substituímos o mês do calendário com o mesmo triste recorde. Não levamos a mal. Ainda que também garanta que não deixaremos de dar essas notícias, não as podemos desvalorizar nunca.

Os nossos leitores têm razão para estar cansados de más notícias e também de promessas e compromissos sem castigo que nunca se cumprem à risca. Foi isso que vimos há muito pouco tempo com a cobertura da mais importante cimeira do clima que, todos os anos, as Nações Unidas (ONU) organizam num país diferente. A ONU junta no mesmo espaço os líderes do mundo, negociando cada palavra e vírgula de um texto consensual, que no fim parece sempre ter mais cedências do que compromissos. Sabe sempre a pouco quando sabemos a dimensão do problema que temos no colo.

Distraídos com outras crises ou conscientemente desvalorizando as decisões da COP28, os leitores não deram à cobertura do Azul o eco que merecia. E a incansável jornalista Aline Flor bem que se bateu por isso, desdobrando a sua atenção para tudo o que mais importava.

Mas, lá estamos nós a deixar descair a conversa para a catástrofe, crise e más notícias. Esta carta ao leitor do Azul é sobre as boas notícias. E o jornalista Nicolau Ferreira que tão bem vos contou ao longo de 2023 algumas destas belas histórias com final feliz – dá-nos motivos para algum optimismo.

Do texto que publicamos esta quinta-feira, com o ano mesmo pertinho do fim, ressalta (para mim) um ponto comum a que nos podemos agarrar sem medo. É que, juntando forças, é possível mudar e avançar. Às vezes, é preciso esperar anos como aconteceu com o importante Tratado do Alto-Mar. Outras vezes, é melhor ter pouco do que nada e assegurar um passo em frente mesmo que não corresponda às melhores expectativas como aconteceu com a Lei do Restauro da Natureza ou o resultado final da COP28.

Noutros casos, pode ser um resultado do clássico a união faz a força. Como vimos nas várias frentes que se uniram e conseguiram travar o péssimo plano previsto para Alagoas Brancas. Ou no caso que um grupo de jovens portugueses conseguiu levar até ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, um exemplo português de uma onda de queixas que está a chegar aos tribunais de vários países.

Há outras histórias. Se escrevemos sobre as ameaças ao reino animal e acrescentamos nomes à lista das espécies ameaçadas, também temos casos de sucesso. Lembram-se, por exemplo, da incrível aventura que fez regressar os tauros ao vale do rio Côa? Das contas de somar sobre os linces-ibéricos, águias-caçadeiras ou dos abutres-pretos que estão lentamente a regressar ao nosso território? Do raro pintarroxo-trombeteiro que passou por Matosinhos?

Reservámos para estes últimos dias do ano uma breve revisão sobre algumas boas notícias de 2023. Insisto: sei que foram muitas mais. E sei quem em 2024 vamos continuar consigo esta viagem que, às vezes, parece ter mais solavancos do que avanços, mais más do que boas notícias. Basta querermos TODOS mudar o rumo a esta história em 2024.