Médicos pediram ao Papa Francisco para cancelar viagem à Cimeira do Clima

Embora o seu estado clínico tenha melhorado, o Vaticano confirmou que a gripe e inflamação pulmonar que afectam o Papa Francisco vão impedir que marque presença na COP28, que começa esta quinta-feira.

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Papa Francisco cancelou a viagem "com grande pesar", mas pretende encontrar uma forma de fazer chegar a sua mensagem à COP28 Nuno Ferreira Santos

O Papa Francisco cancelou a sua viagem planeada para a cimeira climática COP28 no Dubai devido aos efeitos da gripe e inflamação pulmonar, disse o Vaticano na terça-feira, aumentando as preocupações sobre a sua saúde. O Papa, que tem 86 anos, deveria iniciar uma visita de três dias ao Dubai na sexta-feira.

“Embora o estado clínico geral do Santo Padre tenha melhorado no que diz respeito à gripe e à inflamação do trato respiratório, os médicos pediram ao Papa que não fizesse a viagem planeada para os próximos dias ao Dubai”, afirmou o Vaticano. Francisco seria o primeiro Papa a discursar numa COP.

O Papa concordou em não viajar “com grande pesar”, acrescentou, dizendo que iria estudar formas de o líder dos católicos romanos do mundo poder contribuir para as discussões à distância. O porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni, disse que Francisco fará um dos discursos principais no Dubai no sábado e terá reuniões bilaterais no mesmo dia com cerca de 30 pessoas, incluindo cerca de 20 chefes de Estado. O Papa também se reuniu com bispos espanhóis em visita ao Vaticano na terça-feira.

O Papa Francisco fez da protecção do ambiente uma das pedras angulares do seu pontificado. Num documento publicado em Outubro, Francisco apelou aos que negam as alterações climáticas e aos políticos que se atrasam para que mudem de atitude, afirmando que não podem ignorar as causas humanas ou ridicularizar os factos científicos, enquanto o planeta “pode estar perto do ponto de ruptura”.

Francisco afirmou ainda que a transição para as energias limpas e renováveis e o abandono dos combustíveis fósseis não está a ser suficientemente rápida. Em Novembro, o Papa Francisco confirmou numa entrevista que pretendia ir à cimeira do clima, COP28, que decorrerá no Dubai, Emirados Árabes Unidos, no início de Dezembro. “Vou ao Dubai. Acho que vou sair em 1 de Dezembro até 3 de Dezembro. Estarei lá três dias”, afirmou o líder da Igreja Católica à emissora pública italiana RAI1.

O Vaticano tinha anunciado na segunda-feira que o Papa iria limitar as suas actividades esta semana para conservar as suas forças depois de ter contraído uma gripe. Ainda assim, durante algum tempo manteve-se o dia na agenda reservado para a COP28. Agora, aconselhado, pelos médicos o Papa Francisco não fará a viagem, mas pretende “participar” na cimeira.

Uma tomografia computadorizada realizada num hospital de Roma no sábado excluiu a possibilidade de pneumonia, mas detectou uma inflamação nos pulmões do Papa que causou dificuldades respiratórias. O Papa estava a receber antibióticos por via intravenosa, informou o Vaticano na segunda-feira. A situação clínica inspira mais cautela dado que, quando jovem, na Argentina, seu país natal, Francisco teve parte de um pulmão removido.

Os gemidos da Terra

Em Outubro, numa nova exortação apostólica, chamada Laudate Deum (Louvado seja Deus), o Papa Francisco alertou-nos para que não estamos a fazer o suficiente para lutar contra as alterações climáticas. Desmontou os argumentos dos negacionistas e destacou a inércia dos políticos, quando “este mundo que nos acolhe está a esboroar-se e talvez a aproximar-se de um ponto de ruptura”.

As alterações climáticas, sublinhou o Papa Francisco, são “um problema social global que está intimamente ligado à dignidade da vida humana”. Os seus efeitos “recaem sobre as pessoas mais vulneráveis, tanto ao nível nacional como mundial”, recorda, e o nosso cuidado pelo outro e o nosso cuidado com a terra estão intimamente ligados.

“Por muito que se tente negá-los, escondê-los, dissimulá-los ou relativizá-los, os sinais da mudança climática impõem-se-nos de forma cada vez mais evidente”, sublinha o Papa. Embora nem todas as catástrofes naturais se possam atribuir às alterações do clima, “nos últimos anos, temos assistido a fenómenos extremos, a períodos frequentes de calor anormal, seca e outros gemidos da terra que são apenas algumas expressões palpáveis duma doença silenciosa que nos afecta a todos”, dizia o Sumo Pontífice.

“É impossível esconder a coincidência destes fenómenos climáticos globais com o crescimento acelerado das emissões de gases com efeito de estufa, sobretudo a partir de meados do século XX. A esmagadora maioria dos estudiosos do clima defende esta correlação, sendo mínima a percentagem daqueles que tentam negar esta evidência”, diz o Papa nesta lição resumida sobre os factores por trás das alterações climáticas.

Especificamente sobre a COP28 que se realiza nos Emirados Árabes Unidos, Francisco constatava que este país é um grande exportador de combustíveis fósseis, salvaguardando que também tem investido muito nas energias renováveis. Ficou o apelo a que isso não seja motivo para desistir deste palco de negociações sobre o clima. “Adoptar uma atitude renunciante a respeito da COP28 seria autolesivo, porque significaria expor toda a Humanidade, especialmente os mais pobres, aos piores impactos da mudança climática”, avisou.

“Esta conferência pode ser um ponto de viragem, comprovando que era sério e útil tudo o que se realizou desde 1992 [data da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas]; caso contrário, será uma grande desilusão e colocará em risco tudo o que se pôde alcançar de bom até aqui”, frisava o Papa.

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