A Praia da Luz deseja esquecer o assunto

a A família McCann está insatisfeita com a imprensa portuguesa e os comerciantes da Praia da Luz acham que a mediatização do desaparecimento de Madeleine - faz amanhã 100 dias - também não lhes trouxe nada de bom. O casal alugou uma nova casa, uma vivenda situada nas proximidades da Luz, e prescindiu, há dois dias, dos serviços de apoio que o Ocean Club tinha colocado à sua disposição, nomeadamente os de baby-sister para os dois filhos gémeos. O Governo Civil de Faro, através do Turismo de Portugal, tinha-se oferecido a pagar as despesas da estadia até que a menina fosse encontrada, mas tal não foi necessário. O ex-governador civil (actual presidente da Região de Turismo do Algarve), António Pina, disse ao PÚBLICO: "Quando pedimos a conta, informaram-nos que estava pagava, através de uma associação internacional de ajuda a crianças desaparecidas." A moradia habitada pelos McCann, numa zona menos exposta, esteve ontem rodeada de repórteres. O casal foi entrevistado por três estações de televisão inglesas (BBC, Sky News e ITN) e recusou falar aos órgãos de informação portugueses, prometendo fazer declarações hoje. A entrevista decorreu numa vivenda na zona da Meia na Praia, próximo de Lagos, e as três viaturas que integravam o staff de apoio do casal, pelo caminho, ainda ensaiaram algumas manobras de diversão para afastar os jornalistas portugueses que tentavam falar com os McCann sobre os motivos por que tinham sido preteridos. Num hotel de Lagos, o casal participou também numa sessão de fotografias reservada apenas a fotógrafos ingleses.
O evoluir deste caso começa a gerar algum desconforto entre a população local. "Isto está uma grande confusão", diz Manuel Casimiro, vendedor de artigos de Praia na Luz, há 30 anos. "Nunca tínhamos tido aqui uma coisas destas." Os jornalistas, prossegue, "até helicópteros alugaram, mas toda a publicidade que fizeram nada trouxe de bom". Neste estabelecimento, recorda o comerciante, foram colocados quatro cartazes. Agora, nem sombra de Maddie. "Veio o vento levou-os, e nunca mais trouxeram outros", desculpa-se. Há dois ou três meses, recorda o ambiente de tensão: "Os pais levavam os filhos para a praia, agarrados pela mão, sempre a olhar para um e outro lado." Agora, já se vê as crianças a brincar à vontade na praia. "Só que há menos turistas", sublinha.
"Há menos turistas ingleses e as vendas caíram", diz Luís Alberto, de uma loja de óptica, aberta quase em frente ao aldeamento Palm Bay (pertencente ao grupo do Ocean Club). "Vendia muitos óculos de sol a ingleses; isto agora está muito fraco", lamenta-se. O caso Madeleine, acrescenta, "não ajudou nada à promoção desta praia, pelo contrário - toda a publicidade que fizeram foi negativa". Do contacto que diz ter com famílias inglesas, pensa que os britânicos viraram costas à Luz pela "falsa ideia de insegurança que se criou com este caso". Sobre os últimos desta história diz que o "povo estava solidário com os pais, mas agora começa-se a sentir que há qualquer coisa que não bate certo". Tinha uma fotografia da criança no estabelecimento, mas também já lá não está. "Caiu com a humidade", desculpa-se. No seu entender, a população quer esquecer o assunto: "O caso passou-se entre ingleses, num aldeamento inglês, e não venham agora dizer que a culpa é da polícia portuguesa que não descobre o mistério."
O aldeamento Ocean Club, onde os McCann passavam férias, também já retirou a fotografia da menina da porta da recepção. As ordens, agora, são para colocar os jornalistas à distância. No pátio exterior à recepção, a dar para o passeio público, ontem, um segurança, vestido de preto, mal viu aproximar-se o repórter do PÚBLICO agitou a matraca que tinha na mão e barrou a entrada.
Na rua da Praia, uma cidadã inglesa, num pequeno escritório de serviços ligados turismos, ainda mantém um cartaz de Madeleine. Quando se lhe pergunta porquê, recorda as notícias que dão conta dos vestígios de cadáver no apartamento dos McCann, e, logo de seguida, observa: "Se calhar é melhor retirar." Descola a fotografia e guarda-a numa gaveta. Joana, empregada temporária numa loja de material de praia, mantém a foto de Maddie: "Os clientes, quando perguntam algum coisa sobre o assunto, é só para ir tirar fotografias ao apartamento de onde menina desapareceu."

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