De lobos e cordeiros

Uma enorme enchente marcou a noite de sábado no festival de Paredes de Coura. Se na sexta já estariam perto de 20 mil pessoas, anteontem esse número foi certamente ultrapassado. Uma multidão que assistiu a concertos encurtados, mas muito festejados de Sequoia, Gift, Rae & Christian, Lamb e Suede. O festival concluía-se ontem.

"Desculpem, fomos obrigados a tocar só mais uma", desabafou Sónia Tavares, vocalista dos Gift, perante os protestos do público, que redobrariam quando não foi permitido aos Lamb tocar um "encore". Um episódio que ensombrou uma muito aclamada actuação destes lobos em pele de cordeiro britânicos, que precederam os Suede, anteontem na Praia Fluvial do Tabuão. Os espectáculos da segunda noite do festival de Paredes de Coura foram assistidos por um número recorde de espectadores: estariam mais de 20 mil pessoas no recinto minhoto. A organização previa só 15 mil pessoas por noite, mas esse número foi ultrapassado já na sexta, aumentando ainda a afluência anteontem, o que comprometeu de certa forma o conforto dos espectadores.É que embora no parque de campismo houvesse espaço suficiente para todos, a enchente tornou complicado assistir a alguns dos concertos.Quando os portuenses Sequoia subiram ao palco principal, por volta das 20h30, já o anfiteatro relvado estava quase repleto. A banda de João Pedro Almeida apresentou o seu folk-rock essencialmente acústico a uma plateia que recebeu bem a melancolia de canções como "Barefoot girl" ou "Fruit and songs". Os temas mais agitados destes descendentes dos Cosmic City Blues chegaram a animar a audiência, particularmente uma versão de "Wave of mutilation", dos Pixies.Seguiram-se os Gift, que parecem estar mesmo no seu ano. As canções de "Vynil", interpretadas com o apoio de secções de cordas e de metais, foram muito bem acolhidas pela multidão, em particular "OK, do you want something simple", saudada como um verdadeiro "hit". Concluiram com "Real", não sem que antes Sónia Tavares anunciasse que não podiam chegar ao fim da actuação: "Não vamos poder tocar mais uma, os fãs do 'Mirror' que me perdoem." Dois DJs, percussão, flauta, saxofone, contrabaixo e uma panóplia de outros instrumentos serviram aos Rae & Christian para criar um som tão variado como divertido. Alternando temas rap com outros cantados pela cantora convidada Veba, os Rae & Christian mostraram saber animar uma multidão. "Se o DJ Peter Parker tiver trazido os discos certos, vamos mexer a casa com baixo, funk e 'scratch'". Peter Parker trouxe realmente os discos certos.Já com o recinto a abarrotar, tornou-se complicado ver em boas condições os Lamb. Um Andy Barlow hiperactivo e uma Louise Rhodes de vestido vaporoso abriram com os excelentes "Little things" e "B line", do seu recente álbum "Fear of Fours". Em contraste com os seus discos mais celebrais, os Lamb ao vivo são extremamente movimentados e entusiasmaram uma plateia que exigiu um encore. Só que, explicou o membro da organização João Carvalho, "os Lamb já haviam tocado duas ou três músicas a mais do que estava previsto. Cada banda tem os seus horários, e os Suede são muito profissionais. Têm cá gente desde quarta". Andy Barlow é que não se conformou em ter que seguir os horários dos Suede, de maneira que regressou ao palco, atirou uma toalha ao chão num gesto frustrado e envolveu-se com alguns dos técnicos, que já desmontavam o equipamento. Depois, ainda voltou para se atirar para cima do público.Se os Lamb foram lobos em pele de cordeiro, os Suede foram lobos em pele de lobos. Logo aos primeiros acordes de "Just can't get enough", Brett Anderson já tinha o público conquistado. Eléctrico e exuberante, Brett demonstrou que sabe ser uma estrela. Os Suede concentraram a sua actuação mais nos temas rock e menos nas baladas. Assim, "Trash", "She", "Beautiful ones" e "Elephant man" puseram a plateia a saltar, com temas mais calmos como "Everything will flow" ou "Down" a servirem de contraponto. O concerto foi sobretudo baseado nos dois últimos álbuns dos Suede, mas a banda revisitou alguns temas mais antigos: "Metal Mickey", "Wild ones" e "Animal nitrate", este último o mais carregado de adrenalina de toda a noite. Depois de "She's in Fashion", regressam ainda para um encore com "Starcrazy" e, inevitavelmente, "Saturday night" (afinal, era sábado, e era de noite). Ontem, o festival de Paredes de Coura concluia-se com actuações dos Pinhead Society, Mogwai, Sneaker Pimps e Guano Apes.

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