Sete sindicatos chegam a acordo com o Governo sobre a recuperação do tempo de serviço de professores

Num ano, professores vão ver devolvida metade do tempo de serviço que têm congelado. Os professores que têm tempo a recuperar serão dispensados de vagas de acesso ao 5.º e 7.º escalões.

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Esta foi a terceira reunião negocial entre sindicatos e Governo sobre a recuperação do tempo de serviço dos professores Rui Gaudêncio
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Os professores vão receber 25% do tempo de serviço congelado já em Setembro e, num ano, o compromisso é que vejam devolvida metade desse tempo. Além disso, os docentes que têm tempo a recuperar ficarão dispensados da existência de vagas que limitam o acesso ao 5.º e 7.º escalões. Estes são os dois pontos mais relevantes do acordo que sete sindicatos e o Ministério da Educação assinaram esta terça-feira sobre a recuperação do tempo de serviço dos professores. A Fenprof e outros quatro sindicatos ficaram de fora do acordo.

"É um dia histórico para todos os professores que finalmente viram alcançar um dos seus grandes objectivos", frisou, à saída da reunião, o secretário-geral da Federação Nacional de Educação (FNE), Pedro Barreiros.

“Este Governo anunciou a intenção de cumprir a promessa eleitoral que tinha feito e, em menos de um mês, cumpriu”, declarou Fernando Alexandre, numa breve declaração aos jornalistas, ainda antes de reunir com a Federação Nacional dos Professores (Fenprof) — a última organização sindical ouvida — que não assinou o acordo por considerar que “exclui milhares de professores”.

De acordo com o governante, a recuperação do tempo de serviço "vai beneficiar mais de 100 mil professores, que vão ter um progresso significativo na sua carreira". A devolução da primeira tranche de 25% implicará um custo de 40 milhões. Esse valor irá crescer ao longo dos anos, à medida que os professores forem progredindo. Em 2027, quando a totalidade do tempo de serviço congelado for devolvida aos docentes, as contas do Governo são que esta medida represente uma despesa de cerca de 300 milhões por ano, embora este seja um valor volátil.

Esta terça-feira, a FNE foi a primeira a reunir com a equipa ministerial, num encontro que durou mais de três horas. Foram depois ouvidos a Federação Nacional do Ensino e Investigação (Fenei), o Sindicato Independente de Professores e Educadores (SIPE), a Federação Portuguesa dos Profissionais de Educação, Ensino, Cultura e Investigação (Fepeci), o Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades (Spliu), o Sindicato Nacional dos Professores Licenciados (SNPL), o Sindicato dos Educadores e Professores do Ensino Básico (Sippeb) que também subscreveram a proposta apresentada pelo ministro, Fernando Alexandre.

Já a Fenprof, a Associação Sindical de Professores Licenciados (ASPL), o Sindicato dos Educadores e Professores Licenciados pelas Escolas Superiores de Educação e Universidades (Sepleu), a Pró-Ordem e o Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (Stop) não assinaram o acordo por considerarem que "houve falta de vontade política" do ministério em criar mecanismos que compensassem os professores que estão já no topo da carreira e que não vão beneficiar com a devolução do tempo de serviço. Algumas organizações sindicais vão requerer negociação suplementar, não sendo contudo expectável que a proposta venha a ser alterada.

Declarações de ministro são “absolutamente execráveis”

Embora assinalando que houve alguma aproximação do Governo às reivindicações dos sindicatos, o secretário-geral da Fenprof considerou que a proposta não responde a todos os professores com tempo a recuperar. “Há 25.400 professores que não serão abrangidos na totalidade pela recuperação”, notou Mário Nogueira, referindo-se aos que já estão nos três últimos escalões — e que não beneficiarão da recuperação total do tempo de serviço, perdendo no cálculo do valor da sua pensão.

O facto de não estarem previstas, para já, quaisquer medidas de compensação para estes docentes e para aqueles que já se aposentaram foi um dos pontos que mais pesou na decisão das cinco organizações sindicais que não assinaram o acordo.

Na declaração aos jornalistas, ainda antes de reunir com a Fenprof, o ministro da Educação considerou que esta plataforma sindical “nunca fez parte da solução”. “Nós esperamos que possa ser, mas nunca foi. A Fenprof tem uma agenda muito própria. Eu confesso que, em muitas discussões, tenho dúvidas de que a educação seja, de facto, a sua grande preocupação, mesmo os professores. Se queremos resolver problemas, temos de fazer o exemplo hoje aqui dado, que é um esforço de aproximação. Quando resolvemos um problema, não podemos colocar outro em cima da mesa sistematicamente, para que nunca se resolva nada”, declarou Fernando Alexandre.

Mário Nogueira considerou estas declarações “absolutamente execráveis”. "Significa uma facada na confiança que podíamos ter no ministro da Educação. Para que seja recuperada, o ministro tem de dar provas de que é merecedor disso", disse Mário Nogueira aos jornalistas, à saída da reunião negocial.

Por outro lado, Nogueira acusou ainda o ministro de ter tido uma atitude pouco democrática na forma como conduziu o último dia das negociações, por ter assinado um acordo com a FNE ao final da manhã e ter apresentado essa última proposta às restantes organizações sindicais, sem qualquer margem para alterações.

"É a negação da negociação e é grave que essa negação seja feita pelo ministério e por uma organização sindical que se presta a fazer este frete ao ministério, que é criar um contexto em que os outros ou querem, ou paciência", lamentou.

Vagas para todos os professores com tempo a recuperar

De acordo com Pedro Barreiros, os docentes vão receber 25% ao ano, estando a devolução do tempo de serviço concluída em Julho de 2027. "Praticamente passados 20 anos de luta — porque não começou nem agora, nem no ano passado —, alcançamos todos os nossos objectivos no que diz respeito à recuperação do tempo de serviço", sublinhou.

Ao longo das últimas semanas, os representantes dos professores e a nova equipa do Ministério da Educação estiveram a discutir a recuperação do tempo de serviço dos docentes, que foram afectados pelo congelamento da carreira de 2005 a 2007 e de 2011 e 2017, durante o período de assistência financeira da troika. A carreira foi descongelada em 2018, mas há seis anos, seis meses e 23 dias de serviço que os professores nunca viram devolvidos, devido ao elevado custo que essa devolução implicaria. Esse processo será iniciado em Setembro.

Na última reunião, tinham sido já registadas algumas aproximações entre Governo e sindicatos, a começar pelo aumento de 20% para 25% da fatia de tempo de serviço a recuperar neste ano. E o ministério liderado por Fernando Alexandre admitiu fazer ainda algumas cedências em relação ao diploma do "acelerador" das carreiras, admitindo agora que os professores que já beneficiaram deste diploma — e recuperaram algum do tempo que estiveram a aguardar vaga para subir para o 5.º e 7.º escalões — possam não ver descontado esse tempo nos anos que têm a recuperar. Segundo os sindicatos, a tutela abriu ainda a possibilidade de alargar estas vagas adicionais aos professores que têm tempo a recuperar, independentemente de estarem abrangidos pelo decreto-lei 74/2023.

Segundo a FNE, esse compromisso por parte da tutela está agora garantido. "Obtivemos a garantia que todos os professores alvo de congelamento irão, obviamente, recuperar o tempo de serviço, e ficar todos dispensados de vagas de acesso ao 5.º e ao 7.º escalão. Quisemos ainda obter a garantia que essa progressão iria ocorrer à data em que os docentes tiveram as condições [para progressão] e não aquilo que propriamente estava a acontecer até agora em que há casos de colegas que perdiam praticamente um ano do tempo de serviço", frisou Pedro Barreiros.

Um dos pontos em que os sindicatos cederam foi na permanência obrigatória de, pelo menos, um ano no escalão antes de passar ao seguinte. Ou seja, mesmo que com a recuperação do tempo de serviço os professores pudessem avançar directamente dois escalões, terão de permanecer um ano no escalão antes de progredir ao seguinte. "Mas salvaguardamos que esse tempo de permanência vai ser recuperado no escalão seguinte. Ou seja, fico parada um ano no escalão, mas no seguinte terei menos um ano de permanência nesse escalão", notou Júlia Azevedo, presidente do SIPE.

Governo admite discutir compensação de professores no topo da carreira

Nas últimas reuniões, o ministro da Educação esclareceu que a recuperação do tempo de serviço apenas será aplicada aos professores que estão “no activo”. Os sindicatos têm alertado que os docentes que entretanto já se aposentaram ou que chegaram ao topo da carreira deveriam ser compensados pelo tempo de serviço – e consequente remuneração – perdido ao longo dos anos. Mas o Governo tem-se revelado inflexível nesta matéria. “Não está em cima da mesa a questão de efeitos nas pessoas aposentadas e não há nenhum efeito previsto para as pessoas que estão no topo da carreira", frisou, na semana passada, Fernando Alexandre.

Nesta reunião, o Governo manteve essa posição, ainda que tenha admitido abrir um novo processo negocial para discutir a compensação dos professores que estão já no topo da carreira e que não beneficiarão da recuperação do tempo de tempo de serviço — e que, com isso, perderão no cálculo do valor da sua pensão. Contudo, esse ponto não impediu o acordo. "Neste momento temos cerca de 13 mil professores no 10.º escalão. Aquilo que há quatro meses tínhamos era a noção de que, para metade dos actuais professores, o topo da carreira era o 7.º ou o 8.º escalão. Neste momento, há a possibilidade de garantir que possam também desenvolver a sua carreira e chegar ao topo", frisou Pedro Barreiros.

Há ainda outras matérias de valorização da carreira que a FNE quer que sejam objectos de negociação, a começar pelas ultrapassagens na carreira e pela sua revisão para que o topo da carreira docente seja equiparado ao topo da carreira dos técnicos superiores da Administração Pública.

“As nossas reivindicações não se resumem apenas e só à recuperação do tempo de serviço. Há tantas e tantas matérias que importam e que é urgente resolver, como a monodocência, a mobilidade por doença, a revisão salarial e a valorização do trabalho docente, criando novos patamares, mas também adequando os índices salariais a remunerações mais dignas", frisou Pedro Barreiros.

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