Depois da orgânica, as propostas do Programa de Governo
Na semana passada ocupámo-nos da "localização" do Desporto na orgânica do Governo e até deixámos uma nota positiva sobre a sua autonomia face à Juventude. Hoje, com o programa já público, dedicamos algumas notas ao conteúdo.
Em primeiro lugar, a coerência com o Programa Eleitoral da AD, o que por si só não é positivo, mas pelo menos não nos surge com surpresas de última hora ou propostas em contradição com o já anunciado em campanha eleitoral. Na verdade, com alguns retoques e aditamentos, o programa do Governo segue de perto o encargo eleitoral.
Em segundo lugar, percepciona-se, com facilidade, a dificuldade do Governo em colocar o desporto no seu programa e daí resultar um erro, em alguma medida, perigoso, dada a contradição com a aludida separação orgânica.
Com efeito, o espaço dedicado ao Desporto e Actividade Física encontra-se sistematicamente subordinado a um dos pilares do Programa: Um País com futuro para os jovens e para as crianças. O conteúdo dedicado ao Desporto e Actividade Física tem muito mais do que uma parcela da política pública da Juventude. Parece que o Governo mirou o Programa e perguntou ao espelho mágico: onde coloco agora o Desporto e Actividade Física? À falta de vontade de autonomizar, de verdade, fica aqui (mal) como segmento da política de Juventude.
Uma terceira observação vai para a repetição, assim nos parece, e por lapso, da integração da Sociedade Portuguesa de Educação Física no Conselho Nacional do Desporto, já sentada no CND. Este órgão, quase um parlamento, tal o número de representações, a somar a tantos conselhos consultivos na área do desporto, é que merecia reforma global. Portugal é o país dos Conselhos Consultivos, também na área do desporto, gerando-se, por certo, pese alguma pretensa ou real especialidade, sobreposição de matérias e, porventura, até de pessoas.
Por fim, uma palavra para o nosso espaço de eleição, a normação pública do desporto. Neste domínio temos duas referências: actualizar a Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto e rever legislação estruturante, e ainda rever o estatuto do dirigente desportivo em regime de voluntariado. Começando pela última, dir-se-á que estamos perante um desígnio louvável e justo. Veremos no que se traduzirá na prática. Quanto à Lei de Bases – que parece já ter encontrado uma denominação (Desporto e Actividade Física, em vez de Actividade Física e Desporto), pois é sempre importante alterar o título, de Governo para Governo -, a questão não é actualizar, mas antes de a rever, elaborar uma nova, porventura com outras bases sólidas para o desporto nacional e a implementação de um novo modelo para o sistema desportivo nacional.
Por último, não se sabe muito bem o que significa legislação estruturante (a rever) para o Governo. Duas coisas, todavia, em face da produção legislativa do Governo anterior, teríamos nós (não vale muito, eu sei) como certas: um novo regime jurídico das federações desportivas e do estatuto de utilidade pública e algo de que ninguém falou nos programas eleitorais, a saber, a necessidade de pensamento aberto – conjuntamente com a pasta da Justiça – numa reflexão total e não contaminada sobre o Tribunal Arbitral do Desporto.
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