Fantasias violentas, dominatrix, hotwives: o BDSM pode ser “terapêutico”

Fantasias com cenários que não coincidem com quem acreditamos ser; fetiches e kinks que (nem sempre) dizemos em voz alta. Mas o que dizem eles sobre nós? E o que faz o BDSM por quem o pratica?

PP - 06 FEVEREIRO 2024 - CARNAXIDE - Hotwife significa e uma expressao que se refere a uma pratica sexual consensual em que uma mulher casada ou em um relacionamento esta autorizada a ter relacoes sexuais com outras pessoas  enquanto seu parceiro observa ou participa de alguma forma
PUBLICO
Fotogaleria
PP - 06 FEVEREIRO 2024 - CARNAXIDE - Hotwife significa e uma expressao que se refere a uma pratica sexual consensual em que uma mulher casada ou em um relacionamento esta autorizada a ter relacoes sexuais com outras pessoas enquanto seu parceiro observa ou participa de alguma forma PUBLICO Paulo Pimenta
bdsm,sexualidade,p3,bemestar,p2,sexo,
Fotogaleria
Mistress Elena e um submisso DR

Mistress Elena nunca pergunta aos clientes o que querem que ela lhes faça. Essa é, na verdade, “uma péssima pergunta para uma dominatrix fazer”. Afinal, é ela quem decide o que vai acontecer em cada sessão. Mas os seus submissos também têm algo a dizer.

Estamos numa dungeon (ou masmorra), na zona de Lisboa. Um corredor separa os quatro quartos divididos por temas. Num deles, há açoites, vibradores, máscaras de látex, açaimes, uma argola a cair do tecto. Depois, a sala da “feminização”, onde há prateleiras com sapatos de salto alto tamanho 43, lingerie XL, cabides carregados de roupas — tudo para homens que gostam de inverter os papéis de género.

A seguir, a "clínica”, com uma maca e material médico para operações que só acontecem na mente. Percorrer este corredor é olhar para o BDSM. É dar de caras com as infindáveis fantasias, kinks e fetiches de quem aqui vem. Mas isso não nos diz nada sobre quem aqui vem.

Só nos falta o quarto principal, que é onde estamos agora. À nossa frente, mais chicotes, trelas e algemas penduradas ao lado de um dos muitos pequenos espelhos que cobrem estas paredes; atrás de nós, uma jaula onde alguém vai dormir esta noite. Paredes pintadas de azul, cortinas de veludo, luz baixa, um sofá de pele preto que agora se mescla com a roupa de pele preta que Mistress Elena usa.

Quando chegou a Portugal, “nem sabia muito bem” o que era female domination. Fazia-o na vida pessoal, por diversão, e diziam-lhe que “era melhor do que muitas profissionais”. Isso deu-lhe vontade de investir e educar-se na área e agora, dez anos depois, já tem a resposta pronta: “É a troca de poder entre uma mulher e outra pessoa, por norma, um homem. Se uma mulher está a dominar, é ela quem tem todo o poder, toma decisões, controla e faz outras coisas, que podem incluir diferentes práticas” — não só bater e humilhar, um dos muitos mitos à volta do BDSM (acrónimo para Bondage [prender, amarrar ou restringir o outro], Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo).

Foto
DR
Foto
DR
Foto
DR

O próprio spanking (ou “espancamento”, talvez nos faça querer chamar a polícia) tem uma dimensão que vai além de bater, porque simplesmente bater em alguém “não significa que domines essa pessoa”. “Mas podes bater em alguém para atingir diferentes emoções: para fazer a outra pessoa sentir-se humilhada. Para a fazer sentir-se disciplinada. Slutty e excitada. Para gerar dor.”

Por isso, voltemos ao início. A primeira pergunta que Mistress Elena faz aos clientes é sempre: “Que emoções queres sentir?”

Talvez seja difícil para muitos olhar para a tigela e osso de plástico que estão no carrinho, para a máscara com focinho e língua de fora ali na prateleira, e imaginar alguém no meio da sala em quatro apoios a fingir que é um cão. Ou para o fato de mumificação (que deixa espaço para pouco mais do que respirar) e desejar estar ali, tal e qual o nome diz, como uma múmia. Ou talvez já tenhas feito isto. Ou talvez tenhas ficado com vontade de experimentar.

E, se for o caso, o que diz isso de ti? Até onde podem ir as nossas fantasias?

O estúdio de Mistress Elena Teresa Pacheco Miranda
No quarto principal há uma jaula Teresa Pacheco Miranda
Teresa Pacheco Miranda
Teresa Pacheco Miranda
Teresa Pacheco Miranda
Fotogaleria
O estúdio de Mistress Elena Teresa Pacheco Miranda

Fantasias, fetiches e kinks

As nossas fantasias sexuais “expressam verdades sobre nós”, mas são mais “simbólicas do que literais”, explica a psicoterapeuta americana Esther Perel no livro Mating in Captivity. Se, por um lado, as fantasias não sexuais têm uma “ligação simples” à realidade — se fantasiamos com um carro novo, provavelmente queremos mesmo um carro novo —, as fantasias sexuais têm uma “ligação mais complicada”.

Tendem a ser “irracionais e muito diferentes dos nossos valores e comportamentos da vida real”. E “provavelmente nunca se vão concretizar”. Aliás, “há uma grande probabilidade de nem querermos que elas se concretizem”. Afinal, não estamos a falar de “fantasiar com receber um ramo de flores do amado”; mas sim de “pessoas fiéis que se imaginam a fazer sexo com a babysitter”... ou com a babysitter a ver.

“As nossas preferências [sexuais] não põem em causa os nossos valores”, sublinha a terapeuta sexual Leonor de Oliveira, autora do livro É Normal?, onde responde a perguntas relacionadas com sexualidade. Não se é um traidor por fantasiar com sexo com a babysitter; não se é um agressor por gostar de dar chibatadas; não se é menos feminista por gostar de ser submissa.

Ainda que “a nossa personalidade pareça estar ligada a algumas fantasias”, não há uma “causa-efeito”, enquadra Leonor de Oliveira. Por exemplo, uma pessoa que tenha uma personalidade mais neurótica, que tenha mais dificuldade em gerir o stress, à partida terá menos propensão para fantasiar com situações de aventura. Já uma mais extrovertida pode ter mais fantasias de sexo em grupo ou casual. Mas nada disto é determinante. E nada disto é sinónimo de algum tipo de perturbação mental, como durante muito tempo se acreditou.

A premissa base num contexto BDSM é “o consentimento”, enquadra a psicóloga. Há uma “negociação e limites” impostos, geralmente com palavras de segurança que devem parar o roleplay quando são usadas. É isso que determina que qualquer prática é válida.

Já dentro da cabeça, tudo pode acontecer, mesmo aquilo que sabemos com toda a certeza que não queremos que se materialize. Uma fantasia “relativamente comum” é a da violação. “Está relacionada com aspectos do BDSM”, como os jogos de poder e as fantasias de submissão e dominação. Mas “as fantasias são imagens conscientes”, sobre as quais “temos controlo” e podemos alterar a narrativa, o que significa que fantasiar com violação “não é sinónimo de desejo de ter relações forçadas ou de realizar uma violação, ou sequer de sentir excitação sexual se isso acontecesse”. Está tudo a acontecer num “cenário seguro”, que pode ser pintado como cada um quiser.

As fantasias podem ou não estar relacionadas com o kink, um conceito distinto: “Quando falamos de kink, falamos de um largo espectro de fantasias e de práticas que são diferentes da norma. Não quer dizer que sejam incomuns, anormais ou patológicas, mas afastam-se das práticas baunilha (o sexo convencional) ou heteronormativas clássicas.”

os fetiches, outro conceito que se enquadra neste tópico, inserem-se no kink e acontecem quando “a excitação e a gratificação sexual dependem de determinado objecto, que pode ser uma peça de vestuário ou uma parte do corpo” (um dos mais populares: pés).

Foto
Teresa Pacheco Miranda

É com isto tudo que Misstress Elena joga. Sentados à mesa, dominadora e submisso discutem “fantasias, kinks, limites”. Mistress Elena também os tem: não faz sexo ou tem qualquer outra interacção sexual com os clientes, não se despe, permite apenas que lhe toquem nos pés e nas mãos.

Só um conhecimento aprofundado destas vertentes poderá levar a sessões efectivas para ambos. É uma troca de “prazer psicológico” mútuo: a dominadora tem prazer em “sentir-se no poder, em ser criativa, em criar cenários bonitos e evocar as emoções” que planeou com base na informação que o submisso lhe deu. “Não se trata de ter um orgasmo, trata-se de ter emoções complexas durante uma sessão.”

O submisso, “um verdadeiro submisso”, retira prazer de “todo o processo de submissão”, através da “obediência, da adoração”. Numa dinâmica D&S (dominador e submisso), o primeiro assume controlo psicológico e (ou) físico do segundo. O dominador pode decidir quando é que o submisso fala, o que diz, o que faz, quando faz. E se não forem cumpridas as regras, pode haver um castigo. “Essa é a fantasia. [Os clientes] aprendem a deixar-se ir, a não terem de tomar mais decisões. A não sentirem este peso das responsabilidades que normalmente têm na sua vida.” Se for bem feito, é “terapêutico”.

Uma hotwife janta fora todos os dias

Para Cláudia, o “sexo baunilha” nunca chegou. Lembra-se de, na adolescência, propor aos namorados que convidassem outras pessoas para as relações sexuais, de ver pornografia “como uma aprendizagem e para tirar ideias”, de “nada ser suficiente” para a satisfazer.

Foi aos 35 anos que o BDSM entrou “conceptualmente” na sua vida. Com o entendimento sobre estas práticas, conseguiu enquadrar comportamentos que já faziam parte da sua vida sexual: o prazer que sentia na dor chamava-se masoquismo, identificou-se como exibicionista e encontrou sentido nas dinâmicas de dominar e ser dominada.

Actualmente, descreve assim a sua sexualidade: “A maioria das pessoas, no dia-a-dia, come uma diária, uma sandes ou algo assim. E depois há dias em que dizem: ‘Não, eu hoje vou comer bem, vou jantar fora.’ Há pessoas que vivem a sua sexualidade assim. Eu não. Eu janto fora todos os dias.”

Cláudia tem relações com outros parceiros com o conhecimento e consentimento do marido Paulo Pimenta
Cláudia já teve vários papéis na dinâmica BDSM. Hoje é hotwife Paulo Pimenta
Paulo Pimenta
Paulo Pimenta
No dia-a-dia, Cláudia usa roupas provocantes, que condizem com o papel de hotwife Paulo Pimenta
Cláudia já foi "escrava" Paulo Pimenta
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Cláudia tem relações com outros parceiros com o conhecimento e consentimento do marido Paulo Pimenta

Já percorreu diferentes “escalões” do BDSM, que podem ir de dono, aquele que toma todas as decisões sobre o corpo e vontade do seu escravo; mestre, que guia e ensina o submisso; dominador, que comanda e subjuga. Do outro lado da escala, os escravos, submissos, brats (que gostam de desafiar, para depois serem disciplinados), masoquistas, pets… A lista é infindável e para todos os gostos e fantasias.

Quando era escrava, relembra, “andava em casa sem roupa, apenas de coleira”, utilizava objectos sexuais como butt plugs e nunca tratava o marido por tu. “Mesmo em alturas de frio, tinha sempre a genitália e o peito à mostra e disponível.” A maioria das tarefas domésticas era também feita por si.

Estar nesta posição, diz, permitiu que se conhecesse melhor. “Primeiro, foi o encontrar alguém com quem eu tinha confiança para fazer isso. Tanto que casei com ele”, ri-se. Depois, foi “a sensação de liberdade extrema”: “É uma sensação óptima, a de nos podermos desresponsabilizar de tudo quando se tem um dominador responsável.”

Assim fizeram, durante dois anos, até que se apaixonaram e o marido já não conseguia fazer-lhe “maldades”, brinca. “Não consigo ser mais teu dono”, disse-lhe. “Ok, vamos lá ver como vamos arranjar isto aqui”, respondeu Cláudia.

Mais ainda, depois de se conhecer como submissa, pensou: “Eu também sei cuidar dos outros. Se o meu ponto auge de prazer enquanto submissa é o prazer do outro, quem vai tomar conta do meu prazer?”

Foi assim que se tornou hotwife, a nomenclatura que se dá a uma mulher casada que tem casos e relações sexuais com outras pessoas com o total consentimento do marido ou até com o marido a assistir.

É dentro desta dinâmica que vivem 24 horas por dia, sete dias por semana. “Geralmente o roleplay da maioria dos casais acaba, mas eu sou uma felizarda por ser praticante 24 sobre sete”, diz. É a tal ideia de jantar bem todos os dias.

Mas há mais além do sexo com pessoas fora do casal. Em casa, comportam-se de acordo com os seus papéis: “Como estamos todo o dia juntos, eu produzo-me mais. Não tenho de estar necessariamente acessível ao meu marido, mas por norma estou em lingerie ou de forma provocante. Se entrar o senhor das obras ou o carteiro, é assim que eu estou.”

Foto
Paulo Pimenta
Foto
Paulo Pimenta

Há, no entanto, momentos em que têm de “adequar” ou tornar a interacção mais “regrada”. Em jantares de família ou com os filhos, por exemplo. “Mas já aconteceu ter uma relação com outras pessoas e elas terem ido comigo a um jantar de família. Não é assumido qual o tipo de relação que temos, mas quase todas as pessoas com quem temos relações conhecem os nossos filhos”, explica.

E quando acontecem os imprevistos do dia-a-dia, como alguém adoecer, por exemplo, os papéis não precisam de se inverter. Pensemos num animal de estimação, recomenda: é o dono quem tem a responsabilidade de cuidar. Numa relação D&S, o dominador é também o cuidador. Já o submisso quer servir. O cuidado é, assim, recíproco: “Estão ambos a servir um ao outro, com termos e propósitos diferentes.”

As decisões familiares também continuam a ser tomadas pelos dois; apenas as que estão relacionadas com a vida sexual de ambos são “todas” tomadas por Cláudia. O papel mais dominante que agora tem, o facto de as escolhas recaírem sobre si, “dá muito que pensar”. “Não só eu quero cativar aquela pessoa a dar-me prazer, há uma sede mental de desafio, como há uma responsabilidade perante o outro, que deposita confiança no dominador. E a premissa base do BDSM é que seja tudo seguro e consensual.”

Foto
Cláudia é praticante de BDSM Paulo Pimenta

BDSM está associado a maior satisfação sexual

Um estudo feito em 2021 na Noruega concluiu que praticantes de BDSM estavam mais satisfeitos sexualmente. Das 4148 pessoas inquiridas para o estudo BDSM: Does it Hurt or Help Sexual Satisfaction, Relationship Satisfaction and Relationship Closeness?, 34% demonstraram algum tipo de interesse em práticas de BDSM, mas apenas 10% disseram ter experimentado.

Não foram encontradas quaisquer diferenças entre a “população orientada para o BDSM” e a “população baunilha” quer em termos de género quer de grau de escolaridade, mas concluiu-se que “a prática é mais frequente em pessoas que se identificaram como LGBQ+ ou mais novas”.

A investigação reportou que “ter interesse em roleplay mas não o ter posto em prática estava negativamente associado à satisfação sexual e intimidade”. Em oposição, praticar BDSM e roleplay “estava positivamente associado à satisfação sexual”.

Em Portugal, foi feito um estudo com 68 praticantes, que mostrou que, em média, é aos 22 anos que surge o interesse pelo BDSM. Há, contudo, um hiato de seis anos desde o primeiro interesse até à primeira vez que é posto em prática.

O estudo mostrou ainda que as preferências dos inquiridos se organizam mais ou menos assim: dominação em primeiro lugar, seguida de submissão, spanking, bondage, humilhação, fetiche de pés ou adoração por sapatos, golden showers. E geralmente são postos em prática em casa.

E, “em contraste com a visão dominante de patologia ligada ao BDSM, a maioria dos participantes não tem apenas práticas sexuais BDSM”, aponta o relatório. Um ponto que Leonor de Oliveira não se cansa de sublinhar: “Antes, estas práticas eram patologizadas. Neste momento, não. Pelo contrário, estão associadas a resultados positivos, como maior satisfação e saúde sexual no geral.”

Um dos estereótipos que contribuíram para a estigmatização do BDSM é o de que está ligado a traumas. Na verdade, a “larga maioria” das pessoas que pratica ou tem fantasias “violentas” — que “não são violentas porque estão dentro de um quadro de consentimento em que os limites são negociados e, portanto, não há qualquer tipo de violência sexual” — não tem historial de abuso ou traumas.

Por isso, quando alguém chega ao consultório com queixas de fantasias violentas ou kinks, o que “um profissional de psicologia apto” deve fazer é “normalizar as preferências e não tentar controlar o comportamento, se ele não for compulsivo (um diagnóstico que não está relacionado com fantasias violentas) e se não puser em causa a integridade do próprio ou do outro, ou seja, se houver consentimento”.

O que acontece é que muitas vezes estas preferências são vividas com “muita culpabilidade e vergonha”, os factores externos que podem levar ao sofrimento e à procura de ajuda. A Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica publicou algumas orientações para a prática com pessoas que têm interesses kink.

São 16 directrizes que sublinham que “as fantasias, interesses, comportamentos, relações e/ou identidades kink, por si só, não denotam a presença de psicopatologia, perturbação mental ou incapacidade de controlar o comportamento”, que “reconhecem que o kink não é necessariamente uma resposta ao trauma, incluindo ao abuso” e que “podem levar à recuperação, ao crescimento pessoal e ao empoderamento”.

As orientações salvaguardam ainda que os interesses kink “se podem manifestar em qualquer idade” e que os profissionais de saúde “não devem partir do princípio que um envolvimento com o kink tem efeitos negativos ao nível da parentalidade”. O sofrimento relacionado com estas práticas, “mais do que ser evidência de uma perturbação, pode ser resultado do estigma internalizado, da oposição e da negatividade”. E relembra que “terapias correctivas ou de conversão não são éticas”.

Alimentar e destruir fantasias

Que “somos todos muito diferentes” não é preciso dizer, mas são essas mesmas diferenças que criam uma enorme “variedade ao nível das fantasias sexuais”, refere Leonor de Oliveira. Talvez quem chegou até aqui se tenha revisto nestas fantasias e interesse. Ou tenha ficado com ideias de experimentar. Ou ainda com a certeza de que chicotes e açoites não são para si.

E se “tudo o que é fantasia é absolutamente seguro”, importa “promover a fantasia livre nas nossas cabeças”. Tendo em conta que para as pôr em prática é necessário “negociar” com a(s) outra(s) pessoa(s), gerir expectativas e estar preparado para que as coisas “não aconteçam como tínhamos imaginado”.

Não há “controlo total sobre como nos vamos sentir, sobre como o outro se vai sentir, sobre o cenário”, ainda que se percam horas a prepará-lo para replicar um pensamento. “Às vezes, uma coisa tem imensa graça na nossa cabeça e na prática não tem. E está tudo bem com isso.”

Foto
Paulo Pimenta

O mesmo diz Cláudia: “Cada pessoa deve perceber quais são as fantasias que quer que sejam para sempre fantasias e as que gostava de pôr em prática. Sabendo que, quando isso acontecer, vai haver um luto. Porque, às vezes, a fantasia é tão rebuscada, tão ‘masturbatoriamente’ construída, que, depois, nada serve.” Por isso, “podemos continuar com a fantasia, alimentá-la, ou podemos destruí-la”.

A primeira pergunta que Mistress Elena faz aos seus clientes é sempre “que emoções queres sentir?”, porque não precisa sequer de lhes tocar. Eles sentem-se satisfeitos com “a obediência, a adoração”. Sentem-se satisfeitos quando lhe mandam presentes, como as botas de quatro dígitos, as roupas de látex, o computador novo, os objectos para a dungeon. Para alguns, aliás, o processo de submissão baseia-se unicamente em “trocas de dinheiro”.

E ainda que tenhamos conseguido chegar até aqui sem constatar o óbvio — que o prazer está na mente —, não é possível evitar dizer que eles se sentem satisfeitos porque o prazer está, de facto, na mente. E aí está a magia da fantasia. É que na nossa cabeça só há amarras se gostarmos de bondage.

Sugerir correcção
Ler 12 comentários