O imposto que taxa sabe-se lá o quê

Após um processo de reformulação de dez anos que levou à redução de 51,3 % do teor de açúcar nos refrigerantes, é claro que este imposto tem de ser descontinuado. O seu efeito útil esgotou-se.

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O alegado objetivo de saúde de um imposto sobre os refrigerantes é reduzir a obesidade e as doenças não transmissíveis associadas, como a diabetes. No entanto, até ao presente, nenhum estudo forneceu provas claras e consistentes sobre a eficácia desses impostos para reduzir a obesidade ou ter um impacto positivo nas doenças não transmissíveis.

Com efeito, mercados europeus com impostos sobre refrigerantes em vigor, como a Finlândia, França, Irlanda ou Reino Unido, continuam a reportar o aumento das taxas de obesidade sem evidências de que a tributação tenha tido um impacto positivo na saúde pública, ao mesmo tempo que a ingestão de refrigerantes açucarados caiu.

Em 2018, as Nações Unidas (ONU) realizaram duas reuniões de alto nível para estabelecer um roteiro para as melhores recomendações políticas sobre questões relacionadas com a saúde para os Estados-membros, e em ambos os casos a ONU rejeitou a tributação dos refrigerantes como uma recomendação de política de saúde eficaz.

Já antes, o plano de ação global para as doenças não transmissíveis 2013-2020, da Organização Mundial de Saúde (OMS), tinha classificado a tributação das bebidas açucaradas como uma das recomendações mais fracas para reduzir o consumo de açúcar.

A tributação dos refrigerantes foi também rejeitada como uma recomendação política eficaz em fevereiro de 2021 pelo Comité de Segurança Alimentar Mundial da ONU nas suas "Diretrizes Voluntárias sobre Sistemas Alimentares para a Nutrição ".

Em 2022, um relatório da Comissão Europeia sobre políticas de preços e medidas fiscais aplicadas pelos Estados-membros da UE deixa claro que não há evidências científicas que demonstrem que os impostos sobre refrigerantes são uma abordagem eficaz para reduzir a obesidade e o excesso de peso e para promover dietas mais saudáveis.

A mensagem, apoiada por diferentes países a nível global, é clara: os governos devem centrar-se nas intervenções políticas não monetárias, que são mais suscetíveis de conduzir a resultados de saúde positivos.

A título de exemplo, o governo norueguês aboliu o seu imposto sobre as bebidas não alcoólicas no seu orçamento para 2021, seguindo a Islândia e a Dinamarca na abolição de tais impostos.

Em Portugal, no ano de 2017, foi criado o imposto sobre as bebidas não alcoólicas adicionadas de açúcar ou de outros edulcorantes (BRNA). Como se concluirá, este imposto foi e continua a ser uma medida desproporcionada e discriminatória.

O referido imposto afetou consideravelmente a competitividade das empresas que atuam no sector das bebidas refrescantes não alcoólicas, nomeadamente nos mercados onde concorrem pois trata-se de uma indústria que produz bens transacionáveis expostos à concorrência internacional.

Para além do exposto, o imposto em epígrafe continua a tributar bebidas refrigerantes sem teor calórico, ou seja, sem açúcares presentes. Como pode o Governo continuar a tributar refrigerantes com zero açúcar? É um verdadeiro absurdo!

Como mostra a experiência, o modelo de autorregulação com fixação de metas de reformulação dos produtos afigura-se suficiente para assegurar o cumprimento dos objetivos de redução de açúcar.

Este sector assumiu com seriedade o compromisso de reformular os produtos e reduzir o teor calórico dos refrigerantes. Os resultados obtidos são assinaláveis: entre 2013 e 2019, a redução foi de 30,5 %; de 2019 a 2022, o relatório de progresso monitorizado pelas autoridades de saúde evidencia uma redução de açúcar nas bebidas superior a 20,8 %.

Assim, e após um processo de reformulação consistente ao longo de dez anos que levou à redução de 51,3 % do teor de açúcar presente nos refrigerantes, é claro que este imposto tem de ser descontinuado. O seu efeito útil esgotou-se e a sua abolição será fundamental para robustecer o tecido industrial nacional, em particular devido à enorme diferença do enquadramento fiscal entre Portugal e Espanha, o que prejudica gravemente a indústria nacional e a promoção das exportações.

Em conclusão, é urgente a imediata isenção do imposto para os refrigerantes sem açúcar e uma reavaliação global do imposto à luz da eficácia das políticas de saúde, evitando opções simplistas que em nada contribuem para ajudar os governos a atingir os seus objetivos de saúde pública e a melhorar o estado de saúde dos seus cidadãos.

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