Cruz Vermelha disse não encontrar, em 1944, “instalações para exterminar civis em Auschwitz”

Documento de 1944 publicado pela embaixada israelita é autêntico. Nas últimas décadas, a Cruz Vermelha Internacional admitiu várias vezes o “falhanço” da sua actuação durante o Holocausto.

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Campo de concentração de Auschwitz, onde morreram cerca de um milhão de judeus EPA/ANDRZEJ GRYGIEL
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A publicação

O contexto

No Facebook e no X (antigo Twitter), a Embaixada de Israel em Portugal fez publicações nas quais alega que, em 1944, o Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) afirmou não ter encontrado “vestígios de instalações para exterminar prisioneiros civis em Auschwitz”. Junto à alegada citação da Cruz Vermelha, publicou um documento datado de 22 de Novembro de 1944 que sustentará a afirmação.

No mesmo documento pode ler-se um texto que terá sido endereçado a Roswell McClelland, representante da Comissão de Refugiados de Guerra, criada pelo Presidente norte-americano Franklin Roosevelt. No entanto, não é possível, através da publicação, perceber quem escreveu o relatório em questão.

“É facto que um dos nossos delegados conseguiu entrar neste campo (...) De acordo com a sua impressão, o campo era um tipo de ‘campo de concentração extenso’ onde os detidos eram forçados a fazer vários tipos de trabalho, incluindo trabalhos desempenhados fora do campo. Os nossos delegados disseram-nos que não foram capazes de encontrar qualquer rasto de instalações para o extermínio de prisioneiros civis”, pode ler-se num excerto.

Pelas redes sociais, vários são os utilizadores que acusaram a Cruz Vermelha Internacional de “falhar aos judeus exterminados há 80 anos e [de] falhar ao povo judeu desde 7 de Outubro [de 2023]”. Há quem vá mais longe e afirme que “a Cruz Vermelha literalmente negou o Holocausto”.

Os factos

O documento colocado na publicação da Embaixada de Israel em Portugal é autêntico e está disponível para consulta no repositório da Biblioteca e do Museu Presidencial de Franklin D. Roosevelt. Ao consultar a segunda página, é possível verificar que terá sido enviado por Jean-Etienne Schwarzenberg, o responsável do Comité Internacional da Cruz Vermelha para a assistência de socorro em campos de concentração, para McClelland.

Porém, já a 27 de Janeiro de 2005, a Cruz Vermelha Internacional, no 60.º aniversário da libertação dos judeus de Auschwitz, aproveitou a ocasião para assumir o “falhanço” da instituição durante a Segunda Guerra Mundial.

“A 27 de Janeiro, o mundo comemora a libertação do campo de concentração de Auschwitz, há 60 anos. Auschwitz, que representa o maior falhanço da história do CICV, continua a ser um símbolo poderoso dos horrores cometidos pelo regime de Hitler e serve para lembrar a humanidade que tem de agir perante futuras ameaças de genocídio”, lê-se no documento do Comité, que aponta “a falta de capacidade de decisão na tomada de passos para ajudar as vítimas da perseguição nazi”.

Em 2020, o CICV voltou a fazer referência à sua própria actuação durante o Holocausto como “um falhanço”.

Veredicto

É verdade que a Cruz Vermelha Internacional afirmou, em 1944, que não foi capaz de encontrar “vestígios de instalações para exterminar prisioneiros civis em Auschwitz”. Porém, em várias instâncias, o CICV assumiu responsabilidade pela forma errada como lidou com o Holocausto.

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