Pessoas com Alzheimer em Portugal são cada vez mais, mas sem reconhecimento

Mais de 200.000 pessoas vivem em Portugal com a doença de Alzheimer. Nem o número atual e nem as perspetivas de aumento têm motivado a implementação de políticas para melhorar a sua qualidade de vida.

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Depois de alguns sinais de esperança anteriores, surge em 2018, subscrito pelo prof. Fernando Araújo, então secretário de Estado Adjunto e da Saúde, o Despacho n.º 5988/2018 de 19/6 que cria a Estratégia da Saúde na Área das Demências. Em cumprimento do preconizado na Estratégia, foram criados os Planos Regionais da Saúde para as Demências da responsabilidade de cada uma das Administrações Regionais de Saúde, e aprovados pelo despacho n.º 12 761/2021 da senhora ministra da Saúde Marta Temido. O mesmo despacho determinou a constituição da Comissão Executiva do Plano Nacional da Saúde para as Demências.

Contudo, depois de algum trabalho desenvolvido, o seu coordenador apresentou a demissão em janeiro de 2023 e, desde aí, a comissão está inativa, mantendo-se o cargo vago. Assim, continuam sem acontecer algumas medidas essenciais, tais como: a criação e o funcionamento de Unidades Coordenadoras Funcionais nas diversas regiões do país, fundamentais para prestar cuidados específicos e integrados; a ampliação de consultas e outras respostas diferenciadas para as demências; o registo informático sistemático dos diagnósticos, nos cuidados de saúde primários, hospitalares, continuados e paliativos, destinado a permitir a identificação dos casos de perturbações cognitivas; a melhoria da interoperabilidade dos sistemas de informação entre os níveis de cuidados para permitir a elaboração de um Plano Individual de Cuidados, adaptado à situação de cada pessoa com demência.

Sendo certo que é crescente o número de profissionais e instituições capacitados e motivados para assegurar cuidados de qualidade, a verdade é que, continuando sem uma estratégia integrada para as pessoas com demência e seus cuidadores que considere quer a saúde, quer os aspetos sociais, o direito a cuidados específicos e integrados prestados em tempo útil, não se garante o acesso com equidade, ou seja, a todos, independentemente da condição económica ou do local onde cada um vive. Há assim, sem dúvida, que continuar a disseminar boas práticas, a monitorizar a sua implementação, quer a nível clínico quer a nível dos cuidados prestados em equipamentos sociais e no domicílio. Contudo, a avultada verba alocada no âmbito do PRR para capacitação nesta área permanece praticamente toda por executar!

Em setembro de 2022, a Alzheimer Portugal insatisfeita com a escassa concretização e com a necessidade urgente de mudança lançou o Manifesto “Pela Memória Futura”. Este documento, apresentado aos diversos grupos parlamentares e anunciado nas redes sociais desta organização, de âmbito nacional, que há 35 anos luta por uma sociedade que verdadeiramente integre as pessoas com demência e reconheça os seus direitos, contem quatro eixos fundamentais:

  1. priorizar, realçando que urge reconhecer as demências como prioridade nacional social e de saúde pública;
  2. concretizar, alertando para a urgência de implementar os Planos Regionais da Saúde para as demências;
  3. consciencializar, visando a necessidade de combater o estigma e as erradas perceções sobre as pessoas que vivem com esta condição;
  4. aproximar, apelando à imprescindível articulação entre os ministérios da Saúde e do Trabalho e Solidariedade Social e ao envolvimento das autarquias.

Decorrido um ano e porque, apesar do nosso empenho, o Manifesto mantém toda a atualidade, voltamos ao contacto do público e dos decisores políticos.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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