Os prodígios são assim
Diogo Ribeiro está a confirmar todas as expectativas que recaíam sobre si.
Prodígio. É esta a palavra que mais vezes surge associada a Diogo Ribeiro, que nesta segunda-feira, no Japão, conquistou a medalha de prata nos 50m mariposa nos Campeonatos do Mundo de natação. A primeira alguma vez conseguida por um nadador português na competição. Mas Diogo Ribeiro não é só talento. É também sinónimo de trabalho e superação. A superação, por exemplo, de ter de ultrapassar a perda do pai aos quatro anos – a estrela de David que tem tatuada no ombro direito é para ele.
A natação foi uma escolha tomada muito precocemente por Diogo que, aos seis anos, decidiu que queria nadar mariposa (considerado o estilo mais difícil da natação). “Fazia futebol, basquetebol e natação. Depois, optei por futebol e natação. Queria muito aprender a nadar mariposa, mas a minha treinadora não queria. E eu fiz um ultimato. Ou me ensinava mariposa, ou eu ia para o futebol. Fiquei na natação, saí do futebol”, recorda ao PÚBLICO. E é por isso que não considera que seja o estilo mais difícil de aprender. “Depende. As pessoas pensam que a mariposa é ter força para sair da água, mas é mais técnica. É uma questão de coordenação entre braços e pernas, e a anca a mexer. Fiquei com essa paixão pela mariposa, por toda essa história.” Nunca se saberá que tipo de futebolista seria Diogo Ribeiro. Mas já se sabe o que ele é como nadador.
Em Julho de 2021, Diogo Ribeiro sagra-se vice-campeão europeu júnior nos 100m mariposa, em Roma. Três dias depois, sofreu um acidente – a moto que conduzia foi abalroada por um automóvel. Perdeu os sentidos, recuperou a consciência já na ambulância e ficou internado uma semana no hospital, seguindo-se um mês de cama em casa.
Ficou sem sequelas do acidente que o marcou em várias partes do corpo – ficou sem parte do dedo indicador da mão direita (que foi reconstruído), partiu o pé direito, deslocou o ombro direito, ficou com queimaduras no joelho esquerdo e uma microrrotura no peito.
“Estou totalmente recuperado, sem problemas na reabilitação, até melhor do que estávamos à espera. Os que os médicos me disseram foi que tive sorte, que podia ter sido bem pior”, reforça o jovem nadador que, na adolescência, tinha fama de ser indisciplinado.
“Fazia muita porcaria”, “achava que era indestrutível”, admite. O treinador de Diogo, Alberto Silva, reforça a ideia: “Todos me diziam: um talento, mas problemático, não aceita ordens.”
Em Setembro de 2021, depois do acidente, mudou-se de Coimbra, de onde é natural, para Lisboa, trocou a casa de família por um quarto no Centro de Alto Rendimento (CAR). “Era um garotinho assustado que nunca saiu de casa. Teve um acidente que foi grave. Quando começámos o trabalho com ele, todas as semanas ficava doente, pedia para ir para Coimbra e eu deixava”, recorda o técnico.
Dois anos depois, apenas dois anos depois, Diogo Ribeiro confirma, mais uma vez, todas as profecias a seu respeito. Ele, que assume levar as suas memórias e superstições para dentro da piscina - “sou um pouco supersticioso, benzo-me nos blocos e outras coisas ‘off the record’” - usa um fio ao pescoço, pelo avô e tem várias tatuagens no corpo sobre as quais prefere não falar.
Quando preparava a sua participação nos Mundiais, Diogo Ribeiro dizia que não pensava só em finais e em medalhas. “Pensamos sempre nisso, em primeiros lugares e em finais. É tudo o que um atleta quer, mas melhorar os tempos também é um objectivo, é um passo para chegar mais longe. Se em Fukuoka fizer melhores tempos, mas não chegar a finais, será um passo para o futuro”, analisou. Pouco mais de dois meses depois, Diogo Ribeiro, chegou a finais, ganhou medalhas e melhorou tempos. Os prodígios são assim.
Texto elaborado a partir de uma reportagem feita pelo PÚBLICO sobre a nova realidade da natação portuguesa da autoria de Marco Vaza com fotos de Maria Abranches