Tesla encenou vídeo sobre sistema de condução autónoma, testemunhou engenheiro

Director do software Autopilot da Tesla testemunhou, no âmbito do processo judicial contra a construtora por um acidente fatal de 2018, que o vídeo foi feito a pedido de Elon Musk.

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A Tesla enfrenta processos judiciais e controlo regulamentar sobre os seus sistemas de assistência ao condutor Reuters/VICTORIA KLESTY

Um vídeo de 2016 que a Tesla utilizou para promover a sua tecnologia de condução autónoma foi encenado para mostrar capacidades que o sistema não possuía, como parar num sinal vermelho e acelerar num verde, de acordo com o testemunho de um engenheiro sénior da empresa de Elon Musk.

O vídeo, que permanece arquivado no site de Tesla, foi divulgado em Outubro de 2016 e promovido no Twitter por Musk como prova de que “a Tesla conduz-se a si própria”.

Mas, afinal, o Model X não estava a conduzir sozinho com tecnologia que Tesla tinha incluído, testemunhou Ashok Elluswamy, director do software Autopilot da Tesla, num processo judicial contra a construtora por um acidente fatal de 2018 que envolveu um antigo engenheiro da Apple, apurou a Reuters, que teve acesso à transcrição do depoimento de Julho. Esta é a primeira vez que um funcionário da Tesla confirmou a suspeita de o vídeo ser encenado, detalhando a forma como foi produzido.

Para criar o vídeo, a Tesla utilizou o mapeamento 3D numa rota predeterminada, desde uma casa em Menlo Park até à então sede da Tesla, em Palo Alto, também na Califórnia, especificou Elluswamy. Durante os testes, houve condutores que tiveram de assumir o controlo do veículo e, ao tentar mostrar que o Model X podia estacionar sozinho, um carro de testes bateu contra uma vedação no parque de estacionamento da Tesla, acrescentou.

“A intenção do vídeo não era retratar com precisão o que estava disponível para os clientes em 2016. Era retratar o que era possível incorporar no sistema”, justificou Elluswamy, de acordo com a transcrição do seu testemunho. Mas isso não estava claro nas palavras do próprio Elon Musk que recorreu ao Twitter para falar sobre o vídeo quando do seu lançamento: “A Tesla conduz-se a si própria (sem qualquer contributo humano) pelas ruas urbanas até à auto-estrada e depois outras estradas ruas, encontrando depois um lugar de estacionamento”.

A Tesla enfrenta processos judiciais e controlo regulamentar sobre os seus sistemas de assistência ao condutor.

O Departamento de Justiça dos EUA iniciou uma investigação criminal sobre as alegações da Tesla de que os seus veículos eléctricos podem conduzir-se a si próprios em 2021, após vários acidentes, alguns deles fatais, envolvendo o piloto automático, informou a Reuters.

O New York Times noticiou em 2021, citando fontes anónimas, que os engenheiros da Tesla tinham criado o vídeo de 2016 para promover o Autopilot, mas que não tinham revelado que a rota tinha sido mapeada com antecedência ou que um carro tinha batido ao tentar completar a filmagem.

Quando questionado se o vídeo de 2016 mostrava o desempenho do sistema Autopilot disponível num carro de produção na altura, Elluswamy disse: "Não mostra".

Elluswamy foi testemunha num processo judicial contra Tesla por causa de um acidente de 2018 em Mountain View, Califórnia, que resultou na morte do engenheiro da Apple Walter Huang.

Andrew McDevitt, o advogado que representa a mulher de Huang e que questionou a de Elluswamy em Julho, disse à Reuters que era “obviamente enganador apresentar aquele vídeo sem qualquer ressalva ou asterisco”.

O Conselho Nacional de Segurança dos Transportes dos EUA concluiu, em 2020, que o acidente fatal de Huang foi provavelmente causado pela sua distracção e pelas limitações do Autopilot. O organismo afirmou que o “controlo ineficaz do envolvimento do condutor” tinha contribuído para o acidente.

Elluswamy disse ainda que os condutores podiam “enganar o sistema”, levando o sistema da Tesla a acreditar que estavam a prestar atenção, com base no feedback do volante, quando não estavam. Mas disse que não via qualquer problema de segurança com o piloto automático se os condutores estivessem a prestar atenção.

Sobre o vídeo, no qual é passada a mensagem de que “a pessoa no lugar do condutor só está lá por razões legais”, a testemunha disse ainda que a equipa que desenvolve o Autopilot da Tesla se propôs a engendrar e gravar uma "demonstração das capacidades do sistema", a pedido de Musk.

Contactados pela Reuters, Elluswamy, Musk e a Tesla não responderam a um pedido de comentários. Contudo, a empresa avisou os condutores que devem manter as mãos no volante e manter o controlo dos seus veículos enquanto utilizam o piloto automático.

A tecnologia da Tesla foi concebida para ajudar nas mudanças de direcção, travagem, velocidade e manutenção na faixa de rodagem, mas as suas características "não tornam o veículo autónomo", explica a empresa no seu site.

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