O Dezembro mais quente em Portugal, o dia mais chuvoso na região de Lisboa, o Verão mais quente da Europa, o ano mais quente em onze países europeus, incluindo Portugal, a temperatura mínima mais alta numa pequena cidade dos Alpes, os oceanos que acumularam ainda mais calor, o novo pico da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, na última semana publicámos no Azul várias notícias sobre 2022, como se houvesse uma contabilidade climática a concluir e 2023 tivesse de esperar um pouco mais, antes de poder tomar para si a realidade noticiosa.

Uma forma de se caracterizar qualquer ano poderá ser através dos seus extremos e as notícias desta semana mostraram que 2022 ofereceu um bom número de recordes na área do clima, capaz de alimentar o sentido de urgência e espanto que tantas vezes este tema traz. Mas também correndo o risco de potenciar a dessensibilização perante o cavalgar das alterações climáticas.

Por isso, o que fazer com tantos recordes? Que valor dar? Que significado atribuir?

 
           
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A ciência climática vai sendo feita com a ajuda de longas séries de números sobre temperaturas atmosféricas, a pluviosidade, a humidade, a secura dos solos, as áreas das calotas polares e dos glaciares, a concentração dos gases com efeito de estufa. Os números não só dão uma quantificação dos fenómenos que estão a ocorrer, como permitem ainda comparar com o que ocorreu no passado, oferecendo uma dimensão da gravidade de um evento específico.

Por exemplo, ficámos a saber que as chuvadas intensas em Lisboa, de 12 para 13 de Dezembro, acumularam 120,3 milímetros de água. Sem um contexto, torna-se difícil fazer uma leitura mais profunda daquele valor. Mas como a medição da pluviosidade em Portugal é feita desde 1931, foi possível concluir que nunca tinha chovido tanto ao longo de 24 horas, em Lisboa, desde que há registo. Esta comparação ajuda-nos a recolocar o que aconteceu naquele dia – as inundações, os cortes das estradas, os negócios destruídos, a perplexidade – na história de um clima, na narrativa e na memória de um país.

Além disso, é com aqueles números que os cientistas vão encontrando tendências sobre o clima e testando o que os seus modelos climáticos vêm anunciando. O Mediterrâneo está realmente a ficar mais quente, como os modelos prevêem? A região a sul do rio Tejo está, de facto, a tornar-se mais seca? Parece que sim, é o que as últimas décadas apontam. Há razões para nos preocuparmos e tentar dar uma resposta aos problemas que surgem com aquelas mudanças.

Finalmente, torna-se possível em alguns casos fazer o inverso, estudar um fenómeno extremo e avaliar se o que exacerbou aquela situação foram as mudanças no clima. Talvez daqui a uns tempos os climatologistas associem a onda de calor na Europa, que ocorreu no fim do ano passado, às alterações climáticas. É uma possibilidade.

De qualquer forma, 2022 fechou-se. Haverá, com certeza, mais notícias sobre os seus marcos, mas para trás ficam memórias de seca, de calor intenso e de inundações a nível nacional. E um sem número de acontecimentos extremos, incessantes, que destruíram vidas por todo o mundo – só nas cheias do Paquistão morreram mais de 1700 pessoas. Nenhum recorde poderá revelar a dimensão trágica, galopante, dos efeitos do aquecimento global. Mas de algum modo, eles vão confirmando aquilo que está no ar dos tempos e não se pode ignorar: vivemos já imersos no mundo das alterações climáticas.