Presidente do Peru detido e substituído pela primeira mulher a ocupar o cargo

Congresso escolhe vice-presidente Dina Boluarte para chefe de Estado depois de Castillo, alvo de um processo de impeachment, ter tentado dissolvê-lo e governar por decreto.

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Dina Boluarte era vice-presidente Reuters/SEBASTIAN CASTANEDA

Dina Boluarte tornou-se esta quarta-feira a primeira mulher a assumir a presidência do Peru, depois de o seu antecessor, Pedro Castillo, ter sido destituído pelo Congresso da República, acusado de tentar executar um “golpe de Estado” ao anunciar a dissolução deste órgão.

O momento histórico, consagrado com juramento, tomada de posse e discurso de Boluarte no Parlamento, em Lima, foi o desfecho de uma sequência extraordinária de eventos ocorridos em poucas horas naquele país sul-americano.

Com a mão pousada sobre a Bíblia, Dina Boluarte, de 60 anos, jurou “por Deus, pela pátria e pelos peruanos” e prometeu exercer “fielmente” o seu mandato como chefe de Estado, até Julho de 2026.

Pedindo aos peruanos que “confiem no Governo” para cumprir os seus deveres constitucionais, “enfrentar a corrupção” e “expulsar este cancro que tomou a nação”, a agora Presidente comprometeu-se com um “amplo processo de diálogo entre todas as forças políticas representadas, ou não, no Congresso” e apelou a uma “trégua política de unidade nacional”.

“Esta difícil conjuntura põe-nos a todos, como cidadãos, à prova. Antes de ser política, sou uma cidadã e mãe peruana que tem plena noção da alta responsabilidade que a História coloca nos meus ombros”, afirmou.

A Procuradoria-geral determinou a detenção de Castillo, que se encontra na sede da polícia de Lima, até onde se deslocou com a família e o ex-primeiro-ministro Aníbal Torres.

O agora ex-Presidente, que era alvo do terceiro processo de impeachment (destituição) em pouco mais de um ano, tinha anunciado a dissolução do Congresso e informado o país de que, até à realização de novas eleições, iria gerir o país por decreto, à frente de um “governo de excepção”.

Após o anúncio que fez na televisão, o Parlamento, o Exército, o Tribunal Constitucional, a Igreja, centenas de manifestantes que saíram à rua, alguma imprensa, os principais partidos da oposição e o próprio Peru Livre, de esquerda, que apoiou a sua candidatura à presidência, no Verão do ano passado, denunciaram quase imediatamente que havia um “golpe de Estado em curso”.

A presidência do Congresso começou por emitir um comunicado a dizer que “ninguém deve obediência a um Governo usurpador, nem àqueles que assumem funções públicas em violação da Constituição e da lei” e decretou que “os actos daqueles que usurpam funções públicas são nulos”.

Depois, numa reviravolta inusitada, a maioria dos congressistas reunidos no Parlamento votou favoravelmente a destituição de Castillo, e convocou a vice-presidente a apresentar-se para assumir o poder.

A nova Presidente do Peru, que foi ministra do Desenvolvimento e da Inclusão Social, tinha chegado à vice-presidência em 2021, também como representante do Peru Livre.

Castillo queria governar com “decretos-lei”

Pedro Castillo fez um discurso ao país no dia em que deveria comparecer no Congresso no âmbito do processo de destituição de que era alvo.

O Presidente foi acusado em Outubro pela Procuradoria-Geral de ser responsável de uma organização criminosa no Ministério dos Transportes e de ter cometido crimes de corrupção. Este garante, no entanto, que está a ser vítima de “perseguição política” e rejeita as acusações.

Para além de mandar fechar o Parlamento – decisão que não foi acatada pelos congressistas, que avançaram à mesma com a sessão plenária –, Castillo decretou recolher obrigatório entre as 22h desta quarta-feira e as 4h de quinta-feira.

O Presidente informou ainda que pretendia convocar eleições legislativas, com poderes para os deputados redigirem uma nova Constituição.

“Em resposta ao clamor dos cidadãos de todo o país, tomámos a decisão de estabelecer um governo de excepção, para restabelecer o Estado de direito e a democracia”, proclamou.

“Vamos convocar, o mais rapidamente possível, eleições para um novo Congresso, com poderes constituintes, para elaborar uma nova Constituição, num prazo não superior a nove meses. A partir dessa data e até que se instaure o novo Congresso, governar-se-á através de decretos-lei”, explicou.

Castillo também não contou com o apoio de alguns membros do seu Governo nesta sua decisão, para além de Boluarte, que o criticou no Twitter.

Kurt Burneo, ministro da Economia, Cesar Landa, ministro dos Negócios Estrangeiros, Alejandro Salas, ministro do Trabalho, assim como Manuel Rodríguez Cuadros, embaixador do Peru nas Nações Unidas, apresentaram a demissão pouco depois do anúncio do ex-chefe de Estado, acusando-o de violar a Constituição.

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