Costa diz que Moedas só pode falar para Lisboa, Montenegro avisa que Governo está “à deriva”. As reacções aos discursos

O primeiro-ministro reagiu aos discursos do autarca de Lisboa e do Presidente da República para lembrar a função de cada órgão de soberania.

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António Costa respondeu aos discursos de Marcelo Rebelo de Sousa e Carlos Moedas para distinguir o papel de cada órgão de soberania Nuno Ferreira Santos

Para o primeiro-ministro, apesar dos paralelismos que foram feitos por Carlos Moedas no seu discurso para assinalar a implantação da República, “Portugal está numa situação sem comparação”. E lembrou Moedas – que teve um discurso bastante politizado – de que o papel dos políticos varia em “função do cargo que exercem”. António Costa, que também já foi presidente da Câmara de Lisboa, desvalorizou a análise ao país feita por Moedas e afirmou que o autarca é “presidente da Câmara de Lisboa e que, por isso, fala para os lisboetas e para os desafios que se colocam aos lisboetas”. Em contraposição, “a função do primeiro-ministro (leia-se, do próprio) é estar bem atento ao que acontece no país e no mundo”. “Temos bem a consciência de quais são as realidades”, atirou, e é ao Governo que “compete encontrar soluções”, vincou.

António Costa admite que é preciso “reforçar a confiança” dos portugueses, lembrando os pacotes de apoio criados pelo Governo. E em resposta aos recados que foram dados nos discursos, Costa lembrou que “cada órgão de soberania deve falar e agir conforme as suas competências", circunscrevendo a autarquia lisboeta à capital e atribuindo a Marcelo Rebelo de Sousa a função de ser porta-voz “de todos os portugueses”. E quanto ao Governo? “Nós não falamos. Nós agimos, fazemos e resolvemos”, respondeu aos jornalistas. “Escutando a voz dos portugueses, a nós compete-nos o que não compete a mais ninguém, que é encontrar soluções para resolver os problemas”, acrescentou Costa.

O primeiro-ministro respondeu ainda às críticas de Carlos Moedas – que falou num cenário de “alguma estagnação económica” – e afirmou que ao contrário do que está a acontecer na Europa, Portugal registará um “crescimento económico moderado” e “acima da média da União Europeia”.

Costa insistiu que Portugal foi o país com o crescimento económico “mais alto” e disse acreditar que no próximo ano haverá uma “desaceleração significativa” da inflação. “Não vamos ter um cenário de não crescimento nem de recessão. Será um crescimento moderado e ajustado à realidade”, garantiu. Quanto aos detalhes sobre a valorização de rendimentos, Costa preferiu deixar as novidades para a apresentação do Orçamento do Estado para 2023 (que acontece no próximo dia 10), mas antecipou que quer fechar o acordo com a concertação social antes desta data.

Montenegro diz que Governo está “à deriva"

Na celebração dos 112 anos da implementação da República, Luís Montenegro, líder do PSD, prometeu"políticas reformistas” e lembrou o papel das oposições na “exigência e escrutínio” e, claro, na “criação de alternativa”. No final da cerimónia, em declarações aos jornalistas, Montenegro posicionou-se como figura “responsável” capaz de apontar “os erros, as omissões e deturpações dos actos governativos”, concordando com o que considerou ter sido a mensagem transmitida por Marcelo Rebelo de Sousa.

Questionado sobre o recado do Presidente da República quanto a radicalismos, Montenegro rejeitou qualquer colagem ao Chega. E assegurou que não acredita que a mensagem tenha sido dirigida ao PSD. “Era o que faltava”, atirou Montenegro, antes de afirmar que acredita que Marcelo “não teve seguramente essa intenção”, e de afastar “qualquer lição de democracia do primeiro-ministro ou do PS”.

O líder do PSD reiterou ainda que o partido “não tem nada a ver com extremismos políticos, nem movimentos fascistas ou xenófobos”. “Escusam de tentar colar-nos a essa ligação porque não existe. É uma ficção. Estou muito firme e muito sereno”, vincou.

Quanto ao desejo de Marcelo Rebelo de Sousa de aumentar “a qualidade da democracia”, Montenegro lamentou os “casos” que têm marcado os primeiros seis meses deste executivo socialista e que “contribuem para degradar o ambiente político e de confiança dos cidadãos nos dirigentes”.

Para Montenegro, a observação do Presidente da República foi “um apelo forte” para “arrepiar caminho”. O líder do PSD, que se fez acompanhar pelo líder da bancada parlamentar social-democrata, Joaquim Miranda Sarmento, pediu um Governo “que deixe de estar à deriva" e se “concentre em responder ao que afecta a vida das pessoas”, como a oferta de serviços públicos de qualidade na saúde, educação cultura e desporto.

Para Montenegro, a mensagem central de Marcelo foi “responsabilidade”, por um lado em relação ao cumprimento dos programas de governo, e por outro pelo lado da oposição, “com sentido de Estado e de futuro e com sentido de fiscalização hoje para poder ser alternativa amanhã”.

Ao mesmo tempo, Montenegro quer “uma economia pujante a preparada” com “tudo o que implica políticas audazes”, desta feita numa alusão ao discurso do presidente da Câmara de Lisboa, o também social-democrata Carlos Moedas.

Rodrigo Saraiva, líder parlamentar da Iniciativa Liberal, assumiu uma frontal discordância com Marcelo Rebelo de Sousa. “Parece que o Presidente da República não aprendeu com a História. Não tem havido alternativa democrática na história de Portugal, mas sim alternância democrática e coxa. O PS está a governar nos últimos 20 de 27 anos”, afirmou, criticando também a necessidade de exigência referida pelo chefe de Estado.

“O Presidente da República tem sido, infelizmente, um exemplo da pouca exigência aos poderes, começando pelo Governo e também pelas oposições”, afirmou, defendendo que Marcelo “tem de fazer o que lhe compete para que exista alternativa na democracia em Portugal”.

Oposição fala em respostas vagas

Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, partilha da ideia de que a democracia “tem de ser trabalhada quotidianamente”, mas lembra que um dos aspectos do passado, “que ameaça o presente, é o “descontentamento pela quebra de poder de compra das pessoas”.

“Não obtivemos nenhuma mensagem nem do Presidente da República nem do primeiro-ministro, na reacção que teve depois. Dizer que está tudo bem, que o Governo vai continuar a fazer o que tem feito, é resignar-se perante o empobrecimento do país e isso, para nós, não é aceitável”, afirmou o dirigente bloquista, apontando que o Governo “vai falhar” na apresentação do OE e noutras propostas porque o executivo acha que está tudo bem com as “pequenas migalhas” que já deu.

Por seu turno, Paula Santos, líder parlamentar do PCP, destacou a necessidade “de dar cumprimento à Constituição” em várias dimensões. A dirigente comunista considerou que com “o agravamento das condições de vida das famílias, o aumento dos preços de forma especulativa com o aproveitamento dos grandes grupos económicos, acesso à saúde e habitação, o que se exige são respostas de valorização dos salários e pensões, fixação de preços e o reforço dos serviços públicos”.

O alerta do Presidente sobre a construção da democracia e a ascensão dos extremismos levou Nuno Melo, líder do CDS, a acusar o PS de “dividir o espaço político ao centro-direita e encontrar apoios na extrema-esquerda”. “A extrema-direita em Portugal e o PS têm uma relação simbiótica que interessa e aproveita a ambos”, defendeu Nuno Melo numa nota enviada à comunicação social.

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