A actriz norte-americana Louise Fletcher, cujo desempenho como enfermeira cruel e calculista em Voando sobre um ninho de cucos lhe valeu o Óscar de Melhor Actriz em 1976, morreu aos 88 anos.

Fletcher morreu durante o sono rodeada pela família na sua casa em Montdurausse, no sul de França, disse o agente David Shaul à agência de notícias Associated Press na sexta-feira. Não há até ao momento informações sobre a causa da morte.

Depois de suspender a carreira durante uma década para criar os filhos, Fletcher regressou em 1974 ao activo e, pouco depois, foi escolhida para contracenar com o actor norte-americano Jack Nicholson no célebre filme do realizador Milos Forman, que tinha admirado o seu trabalho no ano anterior em Ladrões Como Nós, de Robert Altman.

“Fui a última pessoa a entrar para o elenco”, lembrou a actriz numa entrevista de 2004. “Só a meio das filmagens é que percebi que o papel tinha sido oferecido a outras actrizes que não queriam aparecer de forma tão horrível no ecrã”, como Anne Bancroft, Ellen Burstyn e Angela Landsbury.

Voando sobre um Ninho de Cucos adapta o romance de Ken Kesey e tem como cenário um hospital psiquiátrico no Oregon. Fletcher veste a pele de Mildred Ratched, uma enfermeira autoritária e cruel que aterroriza os seus pacientes, em particular Randle McMurphy, magistralmente interpretado por Jack Nicholson, mas também Billy Bibbit (Brad Dourif), Max Taber (Christopher Lloyd), Martini (Danny DeVito) ou Charlie Cheswick (Sydney Lassick).

McMurphy, um criminoso que finge ser louco para evitar a prisão e os trabalhos forçados, lidera uma revolta contra a enfermeira Ratched, que faz da humilhação e dos tratamentos com choques eléctricos instrumentos de tortura que usa sem reservas para disciplinar os pacientes da ala psiquiátrica.

Voando sobre um Ninho de Cucos, um dos grandes triunfos da carreira de Milos Forman e dos principais actores do elenco, ganhou o Óscar de Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Actor, Melhor Actriz e Melhor Guião, sendo considerado um dos melhores títulos de sempre do cinema norte-americano.

Na cerimónia de 1976, ao receber o prémio, Fletcher disse ao público: “Adorei que todos me odiassem.” Depois dirigiu-se, em linguagem gestual, aos pais, ambos surdos: “Quero agradecer-vos por me terem ensinado a ter um sonho. Estão a ver o meu sonho tornar-se realidade.” Mais tarde, nessa mesma noite, Forman comentou ironicamente com Fletcher e Nicholson: “Agora todos nós faremos fracassos tremendos.”

Fletcher casou com o produtor Jerry Bick no início da década de 1960 e teve dois filhos, tendo decidiu suspender a carreira durante 11 anos. Quando chegou ao elenco de Voando sobre um Ninho de Cucos tinha já mais de 40 anos e era ainda relativamente pouco conhecida porque a sua altura, que muitas vezes ultrapassava a dos seus potenciais pares românticos, colocava alguns entraves à sua contratação numa indústria tão carregada de regras e estereótipos como a da Hollywood da época, lembra o diário The Washington Post.

Nascida em 1934 no Alabama, numa família com quatro filhos em que ambos os pais eram surdos, Louise Fletcher aprendeu a falar apenas aos oito anos, depois de ter sido enviada para casa de uma tia, no Texas. Mais tarde, estudou Teatro na Universidade da Carolina do Norte e, depois, mudou-se para Los Angeles para dar continuidade à sua formação, trabalhando como recepcionista para pagar as contas. Tinha, nessa altura, uma “coragem cega”, reconheceu numa entrevista de 1977.

A sua carreira começou na televisão e passou ao grande ecrã com Águias de Alerta (1963), um thriller psicológico realizado em plena Guerra Fria por Delbert Mann, tendo no elenco Rod Taylor, Mary Peach, Barry Sullivan e Rock Hudson.

O seu percurso era ainda breve quando a actriz resolveu dedicar-se à família durante uma década. Altman e Forman seriam os primeiros a pegar em Fletcher depois do regresso. A Voando sobre um Ninho de Cucos seguiram-se muitos outros filmes – entre eles o Exorcista II – o Herege, com Richard Burton – mas nenhum que pudesse ameaçar o lugar que tem na sua carreira, e na história do cinema made in USA, o de Milos Forman.

Nos anos 1990 entrou em diversas produções televisivas com destaque para Picket Fences, Star Trek: Deep Space Nine e VR.5.