Muitas dezenas de carvalhos-negrais estão a secar na serra de S. Mamede

O ICNF admite que o fenómeno possa ser uma resposta fisiológica da árvore para se proteger, reduzindo a transpiração num contexto em que se assiste à intensificação da vaga de calor.

Carvalhos secos
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Tal como já tinha alertado em 2021, a Associação Nacional de Conservação da Natureza -Quercus, manifestou através de comunicado a sua “grande preocupação” pela quantidade de carvalhos-negrais (Quercus pyrenaica) que aparecem secos na Serra de São Mamede, no distrito de Portalegre.

José Janela, da direcção do Núcleo Regional de Portalegre da Quercus (ANCN), refere que, na observação que efectuou ao longo das últimas semanas, voltou a identificar “muitas dezenas de carvalhos-negrais com as folhas secas” em vários concelhos do Parque Natural da Serra de São Mamede (Castelo de Vide, Marvão e Portalegre).

Com base na distribuição desta espécie no parque natural, o dirigente da Quercus “estima que possam estar afectadas milhares de árvores”, salientando que em 2021 “verificou-se um fenómeno semelhante durante o mês de Agosto”.

Na altura, a Quercus diz ter alertado o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) para este facto e questionou o que estaria a acontecer e o que poderia ser feito. O assunto foi exposto pela Quercus em várias reuniões da Comissão de Co-gestão do Parque Natural da Serra de São Mamede, “sem que se tivesse obtido qualquer resposta”, sublinha José Janela.

Com base no acompanhamento que tem feito à progressão do fenómeno, o dirigente da Quercus diz que as árvores com folhas secas “aparecem em áreas maiores”. E na sequência da observação, a associação “alertou novamente o ICNF para o que se está a passar este ano”, admitindo que este ano o estado das árvores possa “estar ligado à seca e ao calor intenso que se faz sentir”.

Perante o progressivo aumento de carvalhos-negrais secos, a Quercus - que tem como símbolo uma bolota de Quercus pyrenaica por esta espécie representar a floresta e biodiversidade portuguesa - apela a que se faça uma investigação do fenómeno, receando que o ecossistema da Serra de São Mamede possa estar em perigo.

Os povoamentos de carvalho-negral encontram-se na parte norte da Serra de São Mamede, área que recebe influência atlântica e, consequentemente, maiores índices de humidade.

Esta serra, precisa José Janela, “constitui praticamente o limite sul da distribuição desta espécie em Portugal”, uma ilha ecológica, rodeada pela planície alentejana, de influência mediterrânica, mais seca.

Os locais onde existem carvalhos-negrais “são habitats para uma grande diversidade de seres vivos, desde aves, mamíferos, insectos, répteis e anfíbios, até uma grande variedade de cogumelos”. E a seca destas árvores “pode levar à destruição destes ecossistemas”, admite o dirigente da Quercus, avançando outra possível causa para a desflorestação do carvalho-negral: na zona dos povoamentos observa-se a erosão dos solos e este pormenor tem consequências directas nas raízes das árvores.

A Quercus reclama a adopção de medidas para conservar esta espécie, que “não tem protecção legal fora das zonas especiais de conservação da Rede Natura 2000”, apesar de ao longo dos últimos anos terem “apelado, por diversas vezes, para a sua protecção” pelo alto valor conservacionista que esta espécie representa, conclui José Janela.

O PÚBLICO solicitou esclarecimentos ao ICNF sobre as causas que estarão a afectar os carvalhos-negrais. Este organismo confirma que foi alertado em 2021 pela Quercus e “por proprietários da região” sobre a secagem das folhas das árvores, “a qual, nesta zona e face à sintomatologia detectada, se afigura como nova”. O instituto acrescenta que, em colaboração e com o apoio científico do INIAV (Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária), “está a acompanhar e a monitorizar a situação, mas ainda não há dados sobre a área ou número de árvores afectadas”. Os sintomas que afectam os povoamentos de carvalhos são “mais visíveis nos concelhos de Portalegre, Castelo de Vide e Marvão”, adianta ainda.

Das observações entretanto efectuadas, “não existe um diagnóstico que aponte claramente para o(s) agente(s) que possam estar na origem da sintomatologia detectada”. Pode ser provocada por diferentes factores, “quer de natureza biótica (pragas florestais, vulgo pragas e doenças que afectem os exemplares arbóreos) quer de natureza abiótica (de carácter físico, edafoclimático, stress hídrico)”, esclarece a informação prestada ao PÚBLICO.

Acresce ainda a situação de seca em Portugal que se tem agravado desde Maio de 2022 e a vaga de calor que se tem feito sentir, e que “poderá também contribuir para a secura e queda prematura das folhas de diversas espécies, incluindo os carvalhos, sendo uma resposta fisiológica da árvore para se protegerem e reduzirem a transpiração”, salienta o ICNF.

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