Os portugueses não querem mas é trabalhar

O misterioso caso dos 5000 trabalhadores que o sector do mobiliários nem com “salários de 2000 euros” terá conseguido arranjar.

A RTP exibiu a 7 de Novembro de 2021 uma peça intitulada “Crise no mobiliário” que revelou para nosso espanto que esse sector precisa de 5000 trabalhadores e que nem com salários de 2000 euros os consegue atrair. Ora isto é de cortar o coração a qualquer pessoa temente ao euro.

Disposto a ajudar a suprir essas vagas, contactei no dia seguinte a direcção de informação da RTP e a APIMA (associação do sector que é interveniente na referida peça) questionando onde estavam os empregos de 2000 euros pois queria encaminhar-lhes um batalhão de candidatos, comigo à cabeça. Lamentavelmente, fiquei sem resposta; insisti no dia 22 do mesmo mês e fiquei novamente sem resposta. Apelei à provedora do telespectador no dia 2 de Dezembro mas não logrei melhor sorte.

Ora, assim se confirma o teor da peça, pois nem só a APIMA tem falta de funcionários para responder a emails como a própria RTP não foi poupada à maleita.

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Decidi investigar, inconformado, vestindo o fato de Philip Marlowe e mergulhando no serrim.

Não questionarás o jornalismo

Seria totalmente infrutífero orientar a investigação no sentido de questionar a qualidade da notícia, pois este não é país onde grasse o jornalismo de porteira, produzido por jornaleiros contratados ao dia na praça e transportados de camião, que avistam a cenoura sem desconfiar do pau. Não! Neste país os jornalistas são formados, têm carteira profissional. E têm segurança laboral, porque se não a tivessem, com salários de 2000 euros ali a abanar, há muito que teriam abraçado o mobiliário.

Concedo que a boa-nova da RTP choca com outras notícias, por exemplo aquela da funcionária de limpeza da Câmara de Braga que, a troco de 400 euros, prometia favorecer certos candidatos na contratação de auxiliares de educação… Com 5000 empregos que “estarão por preencher” (que é jornalês erudito para “pode ser, pode não ser”) foram fazer batota para arranjar trabalho e ainda pagaram por cima. Trouxas!

Trabalhar, trabalhar

Não me demorando na estapafúrdia ideia de questionar “O Jornalismo”, e tendo eu alguns conhecimentos na indústria do mobiliário, consegui, com efeito, confirmar a existência de pelo menos uma oferta de emprego com salário de 2000 euros. É em Freamunde e é bem desafiante: dar formação em marcenaria avançada aos titulares do CF Canelas, e — Santa “Flexibilidade e polivalência” — limpar a jaula dos leões às quartas-feiras.

O facto de só ter conseguido localizar esta oferta de emprego prova bem a minha inaptidão para protagonista dos romances de Raymond Chandler, pois oportunidades destas e melhores abundam no coração da indústria do mobiliário, o Vale do Sousa, como se torna por demais evidente se considerarmos que alguns dos seus concelhos estão entre os que têm mais carros de luxo por habitante (dados de 2019). Em Paços de Ferreira, por exemplo, quase um quarto dos carros são de gama alta ou mesmo de luxo, não obstante estar na 250.ª posição no que toca a rendimentos declarados no IRS, o que demonstra bem a capacidade de superação desta indústria.

Mas não é com palavras que se supera; é com excelência, “focagem” e muita determinação. E com facturação paralela, trabalho não declarado, horas-extra pela porta do cavalo, e fábricas que não pertencem ao patrão mas a agências imobiliárias que pertencem ao patrão, pois o que se poupa no IMI sempre dá para a gasolina, que está pela hora da morte.

Trabalhar como Ricardo Salgado trabalhou

Esta problemática da falta de vontade para trabalhar dos portugueses tira o sono às pessoas de bem desde pelo menos 2013, ano em que o dr. Ricardo Salgado teve a coragem de denunciar a situação. Recordemos as doutas palavras de alguém por cuja idoneidade jurava o Banco de Portugal:

“Se os portugueses não querem trabalhar e preferem estar no subsídio de desemprego, há imigrantes que trabalham, alegremente, na agricultura e esse é um fator positivo”.

Tivera Portugal mais homens destes, com esta coragem para pôr o dedo na ferida, doa a quem doer! É inegável que o faroeste alentejano e o tomate cherry têm prosperado imenso com o trabalho exemplar de indianos e nepaleses, homens sérios e alegres, que não se distraem com “horários de trabalho”, “habitabilidades” ou “salubridades”, e outros preciosismos que se alastram como epidemias por terras de comunas.

Estes que vêm do Índico é que são homens! Não são como os betinhos lusitanos que só querem iphones, sapatilhas de marca e empregos que dêem para levar uma vida digna.

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