Alterações climáticas: um risco (adicional) para a saúde mental

Parece agora evidente que importa prestar particular atenção à ecoansiedade, já que a sujeição a níveis elevados de ansiedade, sobretudo se prolongada no tempo, é um importante fator de risco para o surgimento de doenças mentais.

Aumento dos gases de efeito estufa, aquecimento global, desflorestação, degelo, extinção de espécies. Estes são apenas alguns dos termos com os quais, não raras vezes, somos confrontados pelos meios de comunicação social e que traduzem um fenómeno mais abrangente e amplamente documentado em relatórios nacionais e internacionais: as alterações climáticas.

Diversas personalidades, entre as quais o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, têm alertado para o facto de que salvar o planeta constitui a batalha das nossas vidas. É precisamente por essa razão que a Organização das Nações Unidas decidiu incluir a “Ação Climática” na Agenda 2030 e nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, tratando-se estes de uma visão comum para a Humanidade, um contrato entre os líderes mundiais e os povos.

É atualmente claro que o combate às alterações climáticas constitui um dos mais importantes desafios societais para as próximas décadas. Porém, apenas recentemente começou a surgir evidência robusta que indica que, para além de todas as consequências já conhecidas das alterações climáticas, estas podem também apresentar efeitos adversos ao nível da saúde mental, especialmente entre os mais jovens.

Um estudo publicado no passado dia 1 de dezembro de 2021 na prestigiada revista The Lancet Planetary Health, no qual foram inquiridas 10 mil jovens (entre os 16 e os 25 anos de idade) oriundos de 10 países (entre os quais 1000 portugueses), apresentou conclusões que devem ser encaradas como um sério alerta: mais de metade dos participantes referiu uma elevada preocupação com as alterações climáticas, mais de metade referiu ainda sentir tristeza, ansiedade, raiva, impotência, desamparo e culpa, e mais de 45% indicou que os seus sentimentos acerca das alterações climáticas afeta negativamente a sua vida quotidiana e o seu funcionamento.

No que respeita à forma como os jovens encaram as respostas governamentais às alterações climáticas, os resultados são também pouco animadores: estes tenderam a classificar negativamente as mesmas e reportaram mesmo que se sentem mais traídos do que confiam nas garantias que lhes são dadas. Importa enfatizar que dentro dos países que se situam no hemisfério Norte, Portugal é aquele no qual os jovens reportaram mais preocupação face às alterações climáticas, crendo-se que tal poderá estar relacionado com a vaga de incêndios que tem vindo a assolar o país desde 2017, com particular destaque para aquele que ocorreu em Pedrógão Grande.

Apesar de a ansiedade relacionada com as alterações climáticas, não raras vezes designada por ecoansiedade, não constituir uma doença, parece agora evidente que importa prestar particular atenção à mesma já que, como a ciência comprova, a sujeição a níveis elevados de ansiedade, sobretudo se prolongada no tempo, é um importante fator de risco para o surgimento de doenças mentais. Para além disso, contrariamente ao que se possa pensar, o termo “ecoansiedade” não se trata apenas de dar um novo nome a um problema antigo: enquanto que na ansiedade “tradicional”, tendencialmente, a pessoa apresenta um resposta desproporcional face ao risco, na ecoansiedade a pessoa apresenta uma resposta que pode ser considerada adequada na medida em que a ameaça é real e encontra-se amplamente documentada.

Face aos dados agora disponíveis importa rapidamente começar a pensar e a estudar no sentido de desenvolver estratégias de intervenção que possam ser úteis e eficazes para a preservação da saúde mental dos jovens. Fundamentalmente, parece importante que a intervenção não reduza os comportamentos pró-ambientais dos mesmos, porque estes são extremamente relevantes na batalha contra as alterações climáticas, mas antes que esses comportamentos possam ser utilizados enquanto estratégia para que os jovens consigam gerir mais eficazmente a (eco)ansiedade que sentem. Também esta deve ser uma luta de todos nós!

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