As freiras missionárias, o bispo, o padre e o cabo-chefe da GNR, tudo na Mêda

No entendimento da Diocese o cabo entrou armado na igreja, o que não podia, alega a dita. E em vez de amansar os manifestantes entendeu que exerciam um direito legítimo, o de se manifestarem. Ite, dita missa est.

Rezam as crónicas que o padre da paróquia da Mêda, de seu nome Basílio Firmino, quando botava a missa, acompanhado pelo bispo de Lamego, D. António Couto, foi interrompido pelos paroquianos que tinham a seu lado três freiras, todas elas pertencentes à Congregação das Missionárias Reparadoras do Sagrado Coração de Jesus. O nome vai assim compridote, mas sendo essa a designação, como tal deve ser tratada, cada um ou uma com seu quê, tanto mais quanto o caso é raro e de especial melindre.

Diziam os paroquianos e freiras manifestantes à porta do templo católico, onde se passava a missinha no passado domingo dia 15, que o cura da Mêda tinha maltratado as freiras cuja função era de grande nobreza, embora de difícil alcance, pois tratar do coração do Criador é algo de difícil imaginação, mas para a imaginação não há limites.

Correram as notícias que as freiras fizeram queixa à Madre da Congregação que, diante dos factos assentes entre as religiosas e ela, as transferiu. Não se sabe se foram transferidas para o caso amainar ou até morrer ou se à falta de outra saída, o melhor era a transferência. Acontece muito nos grandes clubes de futebol no que às transferências se refere.

Só que o povo da paróquia por isto ou por aquilo se juntou às três freiras, e quando o homem da bata negra rezava a missa, foi expressar o seu desacordo pela ocorrência, deixando à vista de todos que a transferência pode ter sido um ponto de reagrupamento de forças.

Elas e eles e eventualmente a Madre entenderam voltar à lide num outro patamar, o que em vocabulário estratégico se designa como uma etapa superior de luta, ou seja, passando-a para a rua. Aqui chegados, as trincheiras eram estas – as ofendidas respaldadas pelos paroquianos e o padre e o bispo. Voilá.

Para complicar o teatro das operações surgiu, chamado pelo padre Basílio Firmino, o cabo da GNR da Mêda, o qual interpelado pelo bispo de Lamego lhe respondeu que o direito de manifestação era livre. Retorquiu D. António Couto que não era bem assim porque não estava a ser respeitado o artigo 251.º do Código Penal que assegura o exercício do culto livre de ingerências.

Fácil é de ver que a situação se complicou tanto mais quanto a própria Diocese de Lamego em nota pública considerou a manifestação sem tino e enviou para o MP queixa contra as religiosas, os manifestantes e o próprio cabo-chefe da GNR de Lamego. Foi à medida grande.

No entendimento da Diocese o cabo entrou armado na igreja, o que não podia, alega a dita. E em vez de amansar os manifestantes entendeu que exerciam um direito legítimo, o de se manifestarem. E visível neste conflito entre freiras alegadamente maltratadas e o padre Basílio Firmino o que em Direito se chama uma colisão de direitos; não é só no Cosmos que há colisões.

Ou seja, a colisão entre o direito dos cidadãos de se manifestarem e o direito do exercício de culto que no entender da Diocese foi desrespeitado. Esta colisão de direitos em que ambos os conflituantes se sentem protegidos legalmente vai ser apreciada no MP.

De todos os modos, a Diocese invoca a falta de tino das freiras e dos manifestantes. E ao enveredar pela via do tino fica-se com a ideia que não é de bom tino abespinhar-se, tanto mais que as freiras são religiosas reparadoras do Sagrado Coração de Jesus, sendo igualmente religiosos o padre e o bispo, gente a quem se impõe ter tino.

Quanto ao artigo 251 do Código Penal haja tino e deixem-no lá estar, que está muito bem e chamá-lo não havia necessidade a fim de reparar as desavenças entre religiosos e seus paroquianos. Ite, dita missa est.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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