Os Deuses e o Olimpo – depois do adeus, o que fica?

O orgulho, a gratidão e a obrigação de vos dizer Obrigada. Obrigada por levarem o nome de Portugal ao pináculo onde estão representados os melhores dos melhores, os verdadeiros deuses do Olimpo, os que voam mais alto, os que vão mais longe, os que são mais fortes.

Morreu Otelo, e com ele uma série de memórias que nos fazem pender mediante o conjunto de valores que cada um defende, ou a ausência deles. Depois do adeus, o que fica? Fica a descrição exaustiva do “herói de abril” no comando da Pontinha nas operações do Movimento dos Capitães que nos libertaram na manhã gloriosa de 25 de abril de 1974. Ficam as memórias, os registos, os inúmeros testemunhos na primeira pessoa do feito de muitos que se foram dissipando, anónimos e esquecidos, na poeira da história. Fica o mito construído de uma revolução que parece fácil demais, como se de um guião cinematográfico de sucesso, a que não falta o grande final romântico, se tratasse. 

Mas não fica apenas isso – há outras memórias que não podem ficar esquecidas. Perdura na memória de muitos o seu comando do Copcon, as detenções, a violência, o esbulho, a vingança, a morte. Um mandado de terror que nos encaminhava para uma nova e intimidante ditadura. Lutou pela liberdade, mas não era um democrata, combatia as eleições livres e o regime parlamentar. E quando tudo parecia tão mau, integrou uma organização que espalhava o terror e a morte. Foi condenado, e depois a conveniência política branqueou o lado mau da história.

Tornou-se o símbolo da revolução, mas não podemos esquecer que representa também o abril sem novembro, a caminho de uma ditadura comunista que nenhum capitão desejou. Sabemos e jamais devemos deixar esquecer as gerações vindouras do tanto que lhe devemos, a ele e outros que, naquele momento, naquela alvorada, naquelas circunstâncias, nos libertaram de uma ditadura longa mas já decrépita. Foi ele. Foram eles. Contudo, o grito da liberdade e do pensamento livre que nos proporcionou e que conhecemos é também o mesmo que nos permite discernir e refletir sobre os bons e os maus passos dados no xadrez da vida. Obrigada, Otelo. 

O que fica, depois do adeus? 

Num ano atípico, que dispensa maiores detalhes, e em que as celebramos as Olimpíadas 2020, com um ano de atraso, quase choramos por ver uma das maiores celebrações à diversidade, à pluralidade, ao mérito e à determinação, cheias de bancadas vazias, complexos desportivos sem vibração, sem festa nem aplausos.

Os atletas olímpicos, que conquistaram o direito a representar o seu país na mais importante competição do mundo, à custa de muito sofrimento, de muita dor, de muita dedicação e uma vida inteira de restrições, jogam tudo nas poucas semanas que dura o sonho que custou tantos anos a concretizar.

E o que fica, depois do adeus?

Num instante, em poucos minutos, vivem o sonho e se desfazem outros tantos. Faz parte do jogo – no momento final só três conquistam as medalhas. E vemos os nossos maiores desfeitos em lágrimas porque o maior dos sonhos não aconteceu. É compreensível, é perfeitamente compreensível, mas não podemos aceitar que nos peçam desculpa! Desculpa porquê? Por perseguirem os seus sonhos? Por abdicarem de tudo para poderem estar à altura dos melhores? Por viverem o momento para o qual tanto trabalharam? Nunca! Somos nós quem tem que lhes pedir desculpa por termos a veleidade de exigir medalhas, como se fosse assim simples... querer. São o nosso orgulho, os que ganham, os que não ganham, os que tentam e os que não desistem de lutar, os que se esforçam mesmo quando o corpo não consegue dar mais, os que choram porque os tempos que vivemos lhes destruíram a capacidade física que trabalharam ao longo de tantos anos. Podem chorar, mas orgulhem-se do que conseguiram em nome de Portugal.

O que fica, depois do adeus? 

O orgulho, a gratidão e a obrigação de vos dizer Obrigada. Obrigada por levarem o nome de Portugal ao pináculo onde estão representados os melhores dos melhores, os verdadeiros deuses do Olimpo, os que voam mais alto, os que vão mais longe, os que são mais fortes. Parabéns a todos, e obrigada!

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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