Trabalhadores da Autoeuropa rejeitaram pré-acordo laboral

Num referendo em que votaram 78,1% dos 5200 trabalhadores, o “não” ganhou com 84,2% dos votos. Comissão de Trabalhadores propõem regresso rápido às negociações.

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Miguel Manso (arquivo)

O pré-acordo laboral na Autoeuropa que previa a substituição de aumentos em 2021 por um prémio de 500 euros e aumentos salariais de 1,7% em 2022 e 1,2% em 2023 foi rejeitado em referendo.

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O pré-acordo laboral na Autoeuropa que previa a substituição de aumentos em 2021 por um prémio de 500 euros e aumentos salariais de 1,7% em 2022 e 1,2% em 2023 foi rejeitado em referendo.

O aumento salarial mínimo seria de 25 euros para os salários mais baixos, segundo os termos acordados entre a Comissão de Trabalhadores (CT) e administração.

Participaram no referendo 4071 (78,1%) dos 5200 trabalhadores da fábrica da Volkswagen em Palmela. Após dois dias de votação, o “não” obteve uma maioria esmagadora, de 84,2% (3426 votos), segundo os resultados divulgados pela CT e a que o PÚBLICO teve acesso. Votaram a favor 620 (15,2%). A CT defende agora “que se devem retomar as negociações [com a administração] com a maior brevidade possível”.

Quando anunciou o pré-acordo, a CT defendeu que este “salvaguarda os direitos consagrados no passado, dá garantia de futuro e manutenção do emprego”. Porém, a esmagadora maioria dos votantes não se deu por satisfeito. O “não” ganhou em todas as seis mesas de voto que funcionaram na quinta-feira e nesta sexta-feira.

O processo negocial tinha arrancado oficialmente a 31 de Março. Nessa altura, a administração tinha proposto um ano sem aumentos em 2021 e que nos dois anos seguintes o aumento fosse igual ao valor da taxa de inflação. Também propunha um corte no valor a pagar pelo trabalho ao fim-de-semana: menos 50% no pagamento dos sábados e domingos, bem como nos prémios de objectivos.

Tanto a CT, que é quem representa os trabalhadores na mesa das negociações, como o Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras, Energia (SITE) do Sul (afecto à CGTP) rejeitaram aquela primeira proposta da administração. A distância era tal face ao caderno reivindicativo entregue pela CT em Novembro, antes do fim da vigência do acordo laboral que expirou no final de 2020, que a conclusão deste órgão se resumia em em 17 palavras: “Esta resposta não vai minimamente ao encontro dos anseios dos trabalhadores e da realidade económica da empresa.”

A fábrica da Volkswagen vive o seu melhor ciclo de sempre. Apesar de a produção ter recuado 25% em 2020 devido à pandemia, o ano passado foi, em termos de produção, o terceiro melhor ano de sempre. Em 2019 teve o melhor ano da sua história, pulverizando o recorde de produção a mês e meio do fim desse ano.

Tal sucesso deve-se sobretudo à produção do modelo T-Roc, um SUV que a unidade de Palmela produz em exclusivo para a marca VW (com excepção do mercado chinês). Os outros dois modelos feitos no distrito de Setúbal, o Seat Alhambra e a VW Sharan têm os dias contados num portefólio que está a virar paulatinamente para os modelos electrificados, seguindo a ambiciosa estratégia que o grupo alemão apresentou em Março, com avultados investimentos na transformação do fabricante de carros numa empresa com outro perfil, virado para a tecnologia e os carros eléctricos.

Neste contexto, as negociações que se seguiram à primeira proposta de final de Março permitiram aproximar posições. A CT propunha um aumento salarial de 5% num acordo para vigorar um ano, a administração ripostou com uma proposta que era melhor que a anterior, mas que continuava muito aquém do pretendido: 0,4% este ano e aumentos à taxa de inflação nos dois anos seguintes.

Esse era o ponto de situação em meados de Abril, que voltou a evoluir para os termos do pré-acordo anunciado a 13 de Maio e que foi agora rejeitado. O coordenador da CT disse, na altura, à agência Lusa, que na opinião dele se tratava de “um bom acordo”.

“É um bom acordo face à actual situação em que vivemos, porque os trabalhadores não só não perdem direitos, como garantem um aumento global de 4,6% até final de 2023, com a garantia de que a empresa repõe a diferença caso a taxa de inflação seja superior neste período”, sublinhou Fausto Dionísio.

Sublinhava ainda que o aumento mínimo de 25 euros “garante um aumento salarial de 2,32% em 2022 e de 2,27% em 2023”.

O pré-acordo votado acabou por manter o prémio de laboração contínua em 100% por cada sábado e domingo trabalhados em horário normal e deixava ainda porta aberta para um prémio de 300 euros por trabalhador, a pagar em Dezembro de 2023, “caso se confirme uma produção igual ou superior a 245 mil unidades em qualquer um dos anos do acordo”. 

Por outro lado, a empresa aceitava o pagamento do saldo de down-days positivo a cada ano e não apenas no fim do prazo do acordo de empresa (pagamento em Janeiro de 2024). E também já incluía um “entendimento” para “melhorar as coberturas do seguro de saúde”.

O referendo mostrou, contudo, que a esmagadora maioria dos trabalhadores considera que um acordo a três anos deve ser melhorado.