Mais de 60 mortos em protestos na Birmânia desde domingo

O domingo foi o dia mais sangrento desde o golpe militar de 1 de Fevereiro, e esta segunda-feira foram mortos mais seis manifestantes pelas forças de segurança da Birmânia.

Foto
Esta segunda-feira, as forças de segurança mataram pelo menos seis pessoas STRINGER

Pelo menos seis manifestantes birmaneses foram mortos pelas forças de segurança da Birmânia esta segunda-feira, um dia depois da morte de 53 pessoas em vários protestos contra o golpe militar de 1 de Fevereiro.

Os apoiantes da Nobel da Paz Aung San Suu Kyi voltaram a protestar esta segunda-feira, principalmente na segunda cidade do país, Mandalay, e nas cidades centrais de Myingyan e Aunglan, onde a polícia abriu fogo.

“Uma menina foi baleada na cabeça e um menino foi baleado no rosto”, disse à agência Reuters um manifestante de 18 anos de Myingyan, por telefone.

A agência de notícias Myanmar Now relatou que três pessoas foram mortas em Myingyan e duas em Aunglan, enquanto um jornalista de Mandalay disse que uma pessoa foi morta a tiro depois de um protesto pacífico.

Indignação com a China

Os manifestantes tomaram as ruas em desafio às autoridades, cujo uso crescente da violência resultou em dezenas de mortes no domingo, o dia mais sangrento desde o golpe de 1 de Fevereiro. Durante o dia foram ateados vários incêndios em fábricas.

Os ataques de domingo provocaram os comentários mais fortes da China sobre a turbulência que atinge o seu vizinho do Sudeste asiático, onde muitas pessoas olham para Pequim como um apoiante do golpe.

O jornal chinês Global Times disse que 32 fábricas com investimentos chineses foram “vandalizadas em ataques violentos” que causaram danos no valor de 37 milhões de dólares (31 milhões de euros) e ferimentos em dois funcionários chineses.

“Desejamos que as autoridades da Birmânia possam tomar outras medidas relevantes e eficazes para garantir a segurança das vidas e dos activos das empresas e do pessoal chinês”, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Zhao Lijian, em Pequim.

O Japão, que há muito compete com a China por influência na Birmânia, disse que está a acompanhar a situação e a avaliar a melhor resposta.

O pior caso de derramamento de sangue no domingo aconteceu num subúrbio de Rangum, Hlaingthaya, onde as forças de segurança mataram pelo menos 37 manifestantes após ataques incendiários contra fábricas chinesas.

Dezasseis pessoas, entre as quais um polícia, foram mortas noutros locais do país, disse o grupo de defesa dos direitos humanos Associação de Assistência aos Prisioneiros Políticos (AAPP).

Os media disseram que a lei marcial foi imposta em Hlaingthaya e em vários outros distritos de Rangum, e também em partes de Mandalay.

As mortes mais recentes elevam o número de vítimas mortais dos protestos para 140, com base numa contagem da AAPP.

Sem Internet móvel

Numa aparente tentativa de suprimir as notícias, as operadoras de serviços de telecomunicações foram obrigadas a bloquear todos os dados móveis em todo o país.

A Telecom Telenor disse num comunicado que “a Internet móvel não está disponível”.

O Exército assumiu o poder na sequência das suas acusações de fraude nas eleições de 8 de Novembro, que foram ganhas pelo partido de Suu Kyi. A junta militar prometeu realizar uma nova eleição, mas não definiu uma data.

Suu Kyi está detida desde o golpe e enfrenta várias acusações, incluindo importação ilegal de rádios walkie-talkie e violação de protocolos de combate ao coronavírus. 

Na semana passada, foi adicionada à lista uma acusação relacionada com a aceitação de pagamentos ilegais.

Suu Kyi deveria ter uma nova audiência virtual esta segunda-feira, mas o seu advogado, Khin Maung Zaw, disse à Reuters que a sessão não pode prosseguir porque a Internet está desligada. A próxima audiência será a 24 de Março.

Khin Maung Zaw também disse que as autoridades o informaram de que a Nobel da Paz só teria permissão para ser representada por dois advogados com pouca experiência.

"Atrás das grades"

Os países ocidentais pediram a libertação de Suu Kyi e condenaram a violência e os vizinhos asiáticos ofereceram-se para ajudar a resolver a crise, mas a Birmânia tem um longo histórico de rejeição de intervenções externas.

Tom Andrews, o investigador de direitos humanos das Nações Unidas na Birmânia, apelou aos Estados-membros da ONU para que cortem o fornecimento de dinheiro e armas aos militares.

“Os líderes da junta não pertencem ao poder, eles devem estar atrás das grades”, disse o responsável no Twitter.

O grupo insurgente de minoria étnica mais antigo da Birmânia, a União Nacional Karen, que assinou um cessar-fogo com o Exército em 2012 após décadas de combates, também condenou a violência de domingo e disse que apoia totalmente os manifestantes.

O sentimento anti-China aumentou desde o golpe, com os opositores da tomada do poder pelo Exército a notarem as críticas suaves de Pequim em comparação com a condenação ocidental.

Uma das líderes dos protestos, Thinzar Shunlei Yi, disse que o povo da Birmânia não odeia os seus vizinhos chineses, mas afirmou que os governantes da China têm de perceber a indignação sentida no país pela sua posição.

“O Governo chinês têm de parar de apoiar a junta golpista, se realmente se preocupam com as relações entre os dois países”, disse Thinzar Shunlei Yi no Twitter.

Sugerir correcção
Comentar