A Música Portuguesa a Gostar Dela Própria encontrou a sua nova casa em Serpins

Foi aprovado o projecto para a instalação de um centro interpretativo, que deverá abrir portas em 2022.

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Atracada à margem do rio Ceira, em Serpins, concelho da Lousã, a Casa Cortez foi, durante décadas, um pequeno entreposto comercial. Antes da ponte que dá acesso ao centro da vila, este estabelecimento teve diversos usos, dependendo da época: foi mercearia, adega e farmácia; vendeu petróleo, sal e frangos.

A partir de 2022, parte da Casa Cortez passará a ser um centro interpretativo da Música Portuguesa A Gostar Dela Própria (MPAGDP), o projecto que se dedica a fazer o registo audiovisual de cantares e histórias de um país que escapa aos centros urbanos. A candidatura para a reconversão de uma parcela da casa num centro interpretativo foi aprovada na terça-feira, explica ao PÚBLICO o director artístico, Tiago Pereira, que se mudou para Serpins no início de Março de 2020, ainda a pandemia ia no adro. A operação de reabilitação está inserida no programa Renovação de Aldeias, um braço do Programa de Desenvolvimento Rural 2020.

Os cerca de 90 metros quadrados distribuídos por dois pisos obrigam a calcular bem a organização do espaço. A MPAGDP propõe que o piso térreo sirva para exposições temporárias, tenha uma recepção ao público e uma mesa interactiva que dê a conhecer tudo o que já foi gravado pelo país, com destaque para o material recolhido na região Centro e no território que circunda a Lousã, como Vila Nova de Poiares, Penacova, Góis ou Coimbra, exemplifica. O andar de cima será um espaço multiusos, que pode acolher espectáculos musicais, filmes, palestras, debates ou workshops temáticos. Devido à área, a lotação terá que ser limitada a 35 ou 40 pessoas, prevê. “A ideia é ter sempre um espaço aberto, em que não pagas bilhete, mas dás uma contribuição, nem que seja um cêntimo”, diz.

Percursos pela memória

Na esquina da Casa Cortez, resta ainda um painel de azulejos que ajuda a contar a história do edifício, com uma estrela amarela de oito pontas desenhada que marca o ano de 1929 como a data da fundação da casa. Entretanto desactivada e posta à venda, deverá receber o centro interpretativo no anexo da casa, uma estrutura independente que virada para a estrada. 80% dos custos serão suportados por fundos comunitários; os restantes 20% serão assegurados pela associação que serve de estrutura à MPAGDP.

Mas a velhinha Casa Cortez pode servir de base para percursos maiores que os seus 90 metros quadrados. Numa fase seguinte, o centro interpretativo deve “começar a gerar outras coisas”, como passeios de tradição oral, aponta o responsável pelo projecto. “Dás uns phones e um gravador a uma pessoa e ela pode ouvir histórias de coisas que aconteceram”, diz. Ou seja, caminhos pelo território em que, em determinados pontos, se pode ouvir as pessoas que ali vivem ou já viveram.

A MPAGDP tem já uma sala no Centro Unesco, em Beja, dedicada à viola campaniça, está a trabalhar num protocolo semelhante com o Ecomuseu de Miranda do Douro e tem intenções de avançar com uma iniciativa idêntica em Palmela, explica Tiago Pereira. Mas o espaço de Serpins, apesar de limitado, será uma espécie de “centro mãe”. “A ideia é que seja para os locais, [mas também] trazer pessoas de fora fazer coisas e ofícios que normalmente não aprenderiam aqui”, refere. E isso tem a vantagem de “mexer com a dinâmica económica do local”, um dado que não deixa de ser relevante para um território de baixa densidade. Nesta lógica, será também importante montar um serviço educativo, acrescenta.

Enquanto o combate à pandemia aconselha o recato do lar, a MPAGDP vai continuar na Lousã, a fazer gravações à janela, num trabalho “muito importante”, em que os membros do projecto têm “descoberto coisas incríveis”, conta. “Quanto mais fizermos isso, mais ganha o centro interpretativo”, acrescenta o director artístico, que já tem nova fase de recolha prevista para os concelhos vizinhos de Miranda do Corvo e Penela, o que vai permitir alargar o conhecimento do território onde a MPAGDP encontrou a nova casa.  

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