Em Inglaterra, há uma vila com uma estrada feita para os ouriços-cacheiros

A vila de Kirtlington é conhecida pelas suas passagens em miniatura entre quintais para os ouriços, mas faz parte de um plano a nível nacional de preservação da espécie. Os ouriços-cacheiros têm vindo a desaparecer no Reino Unido e esta estratégia comunitária quer incluí-los na divisão de terrenos.

Foto
Amir Cohen/Reuters

Com rampas, escadas e túneis, tudo em miniatura, os ouriços-cacheiros da vila inglesa de Kirtlington, em Oxfordshire, podem circular sem correrem riscos. Em 2016, a localidade sofreu uma reforma das infra-estruturas, especificamente para se adaptar aos ouriços-cacheiros que coabitam com cerca de mil residentes humanos. A “rodovia dos ouriços-cacheiros”, mantida por voluntários e implementada pelo residente Chris Powles, atravessa 60 propriedades na vila, todas interligadas por entradas em miniatura instaladas nos muros e nas cercas.

Stephen Powles
Stephen Powles
DR
DR
Fotogaleria
Stephen Powles

Esta “rodovia” pretende solucionar um problema que se tem vindo a agravar no Reino Unido: com a divisão das terras em jardins privados, os ouriços perderam o espaço que precisam para criar territórios e acasalar. Assim, a espécie tem desaparecido da zona onde habitava em abundância - desde a Segunda Guerra Mundial, o número de ouriços diminuiu em 90%. O Reino Unido adoptou, então, uma estratégia de “rodovia dos ouriços-cacheiros” em rede, criando mais de 12 mil buracos de passagem para os animais. A vila de Kirtlington é conhecida por ter as rotas mais criativas, com rampas e escadas em miniatura entre jardins, e até sinais de aviso aos ouriços.

Em 2016, Chris Powles apercebeu-se de que ouriços andavam no seu jardim e, para os manter a salvo da estrada, decidiu fazer um buraco no muro e construir-lhes pequenas escadas para que pudessem avançar para o quintal do vizinho. Quatro anos depois, tem um mapa que indica a rota segura que os mamíferos nocturnos podem seguir: os jardins já conectados por buracos estão coloridos a verde e a branco estão os territórios por conquistar (cerca de 75). “Dificilmente precisamos de uma estratégia, os ouriços já geraram tanto entusiasmo [entre a comunidade]. Muito poucas pessoas recusam fazer parte da rodovia”, confia ao The Guardian.

Foto
Mapa com a rota segura dos ouriços DR

Os residentes Peter Kyte e Zoe Johnson têm uma das rampas mais altas do país, com 85 centímetros, e em 2019 captaram em vídeo um visitante nocturno. O vídeo, com mais de 33 mil visualizações, foi partilhado no Twitter.

É um assunto bem recebido na comunidade, chegando mesmo a permitir a retoma de amizades entre residentes. Chris Powles tem por hábito perguntar aos vizinhos quando foi o último avistamento de um ouriço - e ultimamente não têm sido muitos, conta ao The Guardian. Como tal, a monitorização é de elevada importância. Em algumas entradas são colocados pauzinhos para ver se há movimentações por ali e o People’s Trust for Endangered Species (PTES) cedeu onze câmaras de vigilância para distribuir pela vila, às quais se somam pelo menos mais seis instaladas por iniciativa dos residentes.

O movimento que une esta comunidade é promovido pelo Kirtlington Wildlife and Conservation Society (KWACS), presidido por Chris Powles, que angaria fundos para furar as passagens para os ouriços - em paredes mais grossas podem custar mais de 300 libras (cerca de 332 euros). Do esforço conjunto entre o PTES e a British Hedgehog Preservation Society nasceu, ainda, a vontade de criar a “Estrada dos ouriços-cacheiros, a nível nacional. Trata-se de um movimento para encorajar residentes de todo o país a criarem passagens nos seus quintais e jardins, que até explica como fazê-lo. São já mais de 100 comunidades envolvidas na implementação desta estrada, prova da popularidade do pequeno mamífero que se encontra muito vulnerável no Reino Unido.

Também o ecologista Hugh Warwick está a dinamizar uma campanha nacional para tornar as “rodovias de ouriços-cacheiros” legalmente obrigatórias em futuros projectos de casas. A petição conta já com quase um milhão de assinaturas.

Texto editado por Ana Maria Henriques

Sugerir correcção