Preparar o futuro da Europa para a Próxima Geração

Em crises anteriores, os mais privilegiados sobreviveram, enquanto os mais vulneráveis pagaram um elevado preço. Desta vez tem de ser diferente.

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A história nem sempre se repete, mas, na Europa, as respostas têm sido habitualmente as mesmas. Ou, pelo menos, costumava ser assim.

Perante um vírus que tem ceifado vidas e meios de subsistência em todo o mundo, a Europa não cedeu a velhos instintos nem reabriu cicatrizes de feridas causadas pela crise financeira de há uma década. Em vez disso, optámos por cerrar fileiras e investir num futuro comum.

Por esse motivo, podemos dizer que a decisão tomada na semana passada pelos líderes dos 27 Estados-membros, de aprovar a proposta de recuperação apresentada pela Comissão Europeia, foi histórica.

Antes de mais, vejamos os números. A Europa terá à sua disposição um instrumento de recuperação no valor de 750 mil milhões de euros para apoiar os mais afetados por esta crise. Graças a esse instrumento, designado Next Generation EU, a UE investirá numa recuperação que vai tornar a União mais ecológica, mais digital e mais resiliente para os nossos filhos. Esse instrumento será completado pelo orçamento da UE para os próximos sete anos, o que eleva o montante total do pacote para 1,8 biliões de euros.

Em segundo lugar, é uma decisão histórica pela forma como a Europa a vai concretizar. Trata-se da primeira vez que a Comissão Europeia, com o apoio dos 27 Estados-membros, utilizará a sua sólida notação de risco para angariar fundos num montante desta envergadura nos mercados de capitais para o programa Next Generation EU.

Em crises anteriores, os mais privilegiados sobreviveram, enquanto os mais vulneráveis pagaram um elevado preço. Desta vez tem de ser diferente. Desta vez, a retoma só será possível se nos ajudarmos uns aos outros. É por esse motivo que a maior parte dos fundos do Next Generation EU será distribuída sob a forma de subvenções concedidas aos Estados-membros para financiar reformas e investimentos cruciais. Trata-se de dinheiro europeu para apoiar projetos e pessoas de Valença do Minho a Vila Real de Santo António, da Fajã Grande, na ilha das Flores, Açores, ao Machico, na Madeira, para criar postos de trabalho a nível local e reforçar o nosso papel global.

As reformas e o investimento serão adaptados às necessidades de cada país e serão coerentes com os nossos objetivos europeus mais vastos. Nalguns casos, será possível apoiar reformas no mercado de trabalho para aumentar a produtividade; noutros, será dada ênfase à educação e à formação para ajudar as pessoas a desenvolver as competências de que necessitam. Alguns investirão na melhoria das infraestruturas digitais, outros na conectividade dos transportes. Mas, fundamentalmente, todos contribuirão para os objetivos do Pacto Ecológico Europeu. Deste montante total de 1,8 biliões, 30% serão reservados para despesas relacionadas com as alterações climáticas e para um novo Fundo para uma Transição Justa, no valor de 17,5 mil milhões de euros, que ajudará as pessoas e regiões que necessitam das maiores transformações.

A terceira razão pela qual podemos apelidar esta decisão de histórica deve-se à forma como o dinheiro será reembolsado. Para não ter de apresentar uma fatura mais elevada aos Estados‑membros no futuro, a Europa deverá reembolsar os fundos através dos chamados novos recursos próprios. Estes recursos incluem uma imposição sobre as grandes empresas tecnológicas, um imposto sobre os plásticos não reciclados e a atribuição de um preço às emissões de carbono das importações provenientes de países menos ambiciosos em matéria de proteção do clima.

Algumas pessoas perguntar-se-ão por que razão deverá Portugal angariar ou reembolsar fundos em conjunto com países situados a milhares de quilómetros. A resposta é simples. A prosperidade da Europa reside na sua unidade, no seu espírito de comunidade e no seu mercado único. Por conseguinte, para nós, a solidariedade é, na realidade, um interesse próprio, porque um euro investido num país é, de facto, um euro investido em benefício de todos.

Pensemos em tudo o que acontecerá à nossa indústria do turismo se as pessoas em toda a Europa deixarem de ter meios económicos para viajar para Portugal. Pensemos no que acontecerá aos nossos fabricantes se os seus fornecedores de outros países europeus não lhes puderem enviar as peças de que precisam. Pensemos nos prejuízos desta crise para todos, quer em termos de bem-estar das pessoas, quer de solvabilidade das empresas, de funcionamento da sociedade e solidez de todas as economias europeias. Só que a crise ainda não terminou.

É por isso que precisamos de atuar de forma urgente, decisiva e coletiva. Na semana passada, a Europa mostrou que está à altura dos desafios que enfrentamos. Claro que alguns dirão que foi uma cimeira longa e difícil e que isso constitui a prova de hesitações ou de fraqueza. Nós consideramos, pelo contrário, que simboliza, em última análise, a força única da Europa.

Basta olhar à nossa volta para nos darmos conta de que em nenhum outro lugar do mundo seria possível 27 países diferentes discutirem sequer a forma de financiar em conjunto a sua recuperação e o seu futuro. Nós fizemo-lo durante um longo fim de semana. Neste momento de grande vulnerabilidade na história, estar na Europa é o melhor sítio para se estar. Agora, precisamos que esta situação perdure em benefício de todos, trabalhando com os governos e os parlamentos para tornar esta recuperação uma realidade.

A nossa União deve ser sempre julgada por aquilo que pode oferecer em termos de futuro. Essa visão de um futuro comum permitiu-nos dar grandes e audaciosos passos ao longo da nossa história, unindo a Europa após a Segunda Guerra Mundial ou o fim da Guerra Fria, criando o nosso mercado comum e introduzindo a nossa moeda única. Hoje, é essa mesma visão pioneira que nos permite dar um novo passo histórico, em prol da nossa União.

Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia
Elisa Ferreira, comissária da Coesão e Reformas

Artigo redigido segundo o novo acordo ortográfico

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