No reino da Internet

Quando, nos anos 90, imaginávamos a vida algumas décadas adiante, supúnhamos uma realidade distópica, com túneis aéreos e carros-naves. Em 2020, as coisas são bem diferentes desse cenário imaginado.

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engin akyurt/Unsplash

Há tempos, e graças ao milagre já vulgarizado das viagens random pela Internet, deparei-me com a imagem de uma tatuagem. No braço de um desconhecido, uma inscrição perene, tinta sob a pele, o desenho de uma janela de pesquisa Google com a palavra “porn” no rectângulo de pesquisa. Ri-me, mas fiquei a pensar. Por que quererá alguém escrever “Google” e “porn” no seu próprio bracinho? Seria um statement ou apenas uma piada? A verdade é que o consumo desenfreado de pornografia através da Internet tornou-se algo acessível a qualquer onanista com wi-fi.

Nada contra, mas há quem diga que a Internet serve sobretudo para satisfazer os consumos de pornografia. Será certamente um exagero. No documentário do célebre cineasta alemão Werner Herzog, intitulado Eis o Admirável Mundo em Rede, um cientista explica que a verdadeira revolução das últimas décadas foi, sem dúvida, a Internet. Uma descoberta totalmente inesperada e que mudou a vida das pessoas.

Quando, nos anos 90, imaginávamos a vida algumas décadas adiante, supúnhamos uma realidade distópica, com túneis aéreos e carros-naves. Em 2020, as coisas são bem diferentes desse cenário imaginado. Nada de túneis desimpedidos onde fluem carros voadores ao som de música zen. A realidade é o reino wi-fi, onde nos iludimos em pequenos aparelhos com as redes sociais (ou com a pornografia ou com o que nos apetecer), à espera no trânsito, numa tentativa de amenizar o stress do interminável pára-arranca da viatura.

O futuro que imaginámos no passado afinal é assim — o reino do wi-fi. E, este ano, todos os súbditos foram sujeitos a nova etiqueta, a respiratória. Portanto, no futuro imaginado que é hoje o presente, temos a Internet como algo completamente vulgarizado, sim, temos o privilégio de aceder a conteúdos, pois claro (pornografia ou o que nos aprouver), e fazendo uso obrigatório da máscara. Nada de queixumes, há que ver o lado positivo. Agora, sim, assemelhamo-nos a personagens realmente distópicas. Mascarados com aparelhos-apêndice. É o que temos.

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