Corrupção, populismo e polarização tornam imprevisíveis as eleições eslovacas

Eslováquia deu sinais de querer um rumo progressista em 2019, mas a dispersão do voto aponta para expansão do populismo e da extrema-direita. Partido neo-nazi pode vir a ser decisivo na viabilização de um governo.

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A Eslováquia desloca-se este sábado às urnas para umas legislativas imprevisíveis, cujo desfecho ditará se a eleição para a presidência, em 2019, de uma mulher, liberal, progressista, ecologista e pró-UE, foi uma declaração de intenções sobre o perfil de políticos e o tipo de políticas que o país quer para o futuro ou um mero desvio num rumo populista e iliberal, semelhante ao trilhado pelos vizinhos polaco e húngaro.

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A Eslováquia desloca-se este sábado às urnas para umas legislativas imprevisíveis, cujo desfecho ditará se a eleição para a presidência, em 2019, de uma mulher, liberal, progressista, ecologista e pró-UE, foi uma declaração de intenções sobre o perfil de políticos e o tipo de políticas que o país quer para o futuro ou um mero desvio num rumo populista e iliberal, semelhante ao trilhado pelos vizinhos polaco e húngaro.

Distribuídos por mais de uma dezena de partidos, liberais, populistas e nacionalistas, nas suas várias formas, disputam os 150 lugares do Conselho Nacional, com a certeza de que nenhum deles conseguirá eleger, sozinho, os 76 deputados necessários para alcançar uma maioria parlamentar, tal é a dimensão da dispersão do voto que se prevê.

Basta olhar para o caso do Smer-SD (populistas sociais-democratas), que tendo alcançado 28% nas anteriores legislativas e sido obrigado a aliar-se ao Most-Hid (representantes das minorias húngaras) e ao Partido Nacional Eslovaco (nacionalistas de direita) para poder liderar um governo minoritário, encabeça as sondagens, em empate técnico com o OLANO (anti-corrupção), com apenas 16% das intenções de voto.

Uma vez que o partido do poder, que pertence ao Partido Socialista Europeu, não se fez rogado em aliar-se com forças políticas ideologicamente opostas, resta-lhe, tal como aos restantes participantes na contenda, tentar angariar o maior número de votos e aguardar o resultado. Só depois se fazem as contas para uma possível coligação. Qualquer que seja o seu formato.

As sondagens até sugerem que uma aliança entre cinco partidos liberais e de direita, liderados pelo OLANO, de Igor Matovic, pode ser suficiente para afastar o Smer-SD do poder – está no Governo desde 2012 –, mas as previsões para o Partido do Povo-Nossa Eslováquia (LSNS), na casa dos 10% e de olho no segundo lugar, prenunciam que esta força política neonazi, eurocéptica, anti-imigração, anti-NATO, anti-LGBT e pró-Rússia, venha ter um papel decisivo na viabilização do próximo executivo.

E dado o historial de coligações diversificadas do Smer-SD, que já fez campanha contra a entrada de muçulmanos na Eslováquia, não se exclui um cenário de aliança entre os populistas de esquerda e o LSNS. Dois partidos que até votaram, juntos, na passada terça-feira, uma proposta do Governo para aumentar as pensões e as prestações sociais – entendida pelos críticos como uma jogada “descarada” do Smer-SD para “comprar votos”.

“Diz-se que [o Smer-SD] não vai entrar numa coligação com eles [LSNS], mas isso não está garantido, uma vez que têm apoiado o Governo em várias leis aprovadas no Parlamento”, disse à Euronews Erika Harris, professora de Ciência Política e especialista em política eslovaca na Universidade de Liverpool.

Para a académica, a “astúcia” e a “atracção dos mais jovens” pela mensagem “rebelde” do líder do LSNS, Marian Kotleba – crítico dos “ciganos parasitas” e saudosista do “Estado-fantoche” da Alemanha Nazi na antiga Checoslováquia, que responde em tribunal por propagação de discurso de ódio –, são trunfos para que o Smer-SD lhe estenda a mão, se estiver em causa a perda do poder, e forem precisos os votos da extrema-direita para se manter por lá.

Crime iniciou mudança

Sobressaltados pelo homicídio, em 2018, do jornalista Jan Kuciak, que denunciou ligações entre dirigentes políticos do Smer-SD e a máfia italiana, a elite empresarial, vários magistrados e alguns detentores de altos cargos da polícia, os eslovacos deram um murro na mesa.

Primeiro foram protagonistas dos mais participados protestos de rua alguma vez vistos desde a independência (1993). A pressão sobre o Governo foi tanta, que o então primeiro-ministro, Robert Fico, foi forçado a demitir-se – cedeu o lugar a Peter Pellegrini, mas continuou a liderar os destinos do executivo, na sombra – e o partido caiu a pique nas sondagens.

No ano seguinte, os eslovacos elegeram a primeira Presidente do país, Zuzana Caputova, uma advogada e activista pelos direitos humanos, pela defesa das minorias étnicas e pelo combate às alterações climáticas, membro do Eslováquia Progressista (liberal e pró-UE).

Um feito histórico, não só pelo passado político recente, mas por se ter dado num país tradicionalmente conservador que, por exemplo, rejeitou ratificar a convenção do Conselho da Europa sobre o combate à violência contra as mulheres.

Certo é que as redes de influência de Fico e a eleição de Caputova puseram a Eslováquia a reflectir sobre o flagelo da corrupção, mas também sobre o papel a desempenhar pelo país numa região que tem utilizado o populismo e o eurocepticismo como ferramentas políticas – Viktor Orbán (Hungria), Jaroslaw Kaczynski (Polónia) e Andrej Babis (República Checa) são os principais exemplos. E as eleições deste sábado serão um bom barómetro a essa reflexão nacional.

“A Eslováquia é o último país da Europa Central que, pelo menos oficialmente, ainda é uma democracia liberal plena. Nesta eleição os eslovacos podem confirmá-la ou juntarem-se aos que, na região, estão a regredir para uma espécie de autoritarismo, de democracia iliberal”, considera Michal Vasecka, director do think tank Bratislava Policy Institute. “Por tudo isto, estas são as legislativas mais importantes dos últimos 20 anos”.