Bolsonaro ameaça de prisão editor do site que revelou conversas de Moro com procuradores da Lava-Jato

“Talvez pegue uma cana aqui no Brasil”, disse o Presidente sobre Glenn Greenwald, e ainda sugeriu que adoptou crianças brasileiras com o seu marido, o deputado David Miranda, para evitar a deportação.

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Bolsonaro a assistir a um jogo Palmeiras-Vasco da Gama Amanda Perobelli/REUTERS

O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, ameaçou de prisão o jornalista norte-americano Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil, que tem publicado uma série de artigos com base em conversas do agora ministro da Justiça Sérgio Moro e procuradores da operação Lava-Jato.

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O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, ameaçou de prisão o jornalista norte-americano Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil, que tem publicado uma série de artigos com base em conversas do agora ministro da Justiça Sérgio Moro e procuradores da operação Lava-Jato.

“Talvez pegue uma cana aqui no Brasil”, disse Bolsonaro, ameaçando Greenwald de passar algum tempo nas prisões brasileiras. Na sexta-feira, Moro publicou uma portaria que regula a entrada no país, a repatriação e a deportação sumária de pessoas consideradas perigosas para a segurança, que foi vista como uma medida que abre a porta à expulsão de Greenwald do Brasil.

O Presidente afirmou que o ministro tem “carta branca” e, por ele, teria sido editado um decreto. “Quem não presta, tem que mandar embora. Tem nada a ver com o caso desse Glenn não sei o quê”, disse Bolsonaro. “Tem nada a ver com o caso dele. Tanto é que não se encaixa na portaria o crime que ele tá cometendo”, frisou, negando que a portaria de Moro se possa aplicar a Greenwald.

Mas a seguir, Bolsonaro passou para o que se pode classificar como um ataque homofóbico, puxando para a conversa que o editor do Intercept é casado com um deputado brasileiro do partido de esquerda PSOL, David Miranda: “Até porque ele é casado com outro homem, e tem meninos adoptados no Brasil. Tá certo? Malandro, malandro, pra evitar um problema desse, casa com outro malandro, ou não casa, e adopta criança no Brasil. É um problema que nós temos... Ele não vai embora. O Glenn pode ficar tranquilo. Talvez ele pegue uma cana, aqui, no Brasil. Não vai pegar lá fora, não.”

Glenn Greenwald usou as redes sociais para responder ao Presidente brasileiro. Sublinhou ter-se casado há 14 anos, quando era advogado, antes de ser jornalista, e acha estranho que Bolsonaro pense que ele tem o poder de prever o futuro, para se precaver contra o risco de vir a ser deportado anos mais tarde.

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI) criticou as declarações do Presidente, considerando que está a pôr em causa a liberdade de expressão e promoveu a hashtag #defendaojornalismo nas redes sociais. “Ao ameaçar de prisão um jornalista que publica informações que o desagradam, o Presidente Bolsonaro promove e instiga graves agressões à liberdade de expressão.”

A Associação Brasileira de Imprensa apoiou a resposta de Greenwald ao Presidente, considerando que o norte-americano está ser alvo de intimidação e, em comunicado, criticou a portaria assinada pelo ministro da Justiça. “A ABI está acompanhando o caso e tomará medidas, no campo judicial, caso a portaria seja usada para atingir Greenwald, em mais um caso de arbítrio e de atentado à liberdade de imprensa”.

Os artigos do Intercept Brasil sobre as mensagens trocadas pelos procuradores da Lava-Jato com o juiz Sergio Moro revelaram uma série de irregularidades e mesmo ilegalidades na forma como decorreu a mega-operação que desvendou esquemas de corrupção que ligavam há longos anos políticos e empresas de construção. As mensagens revelam que o juiz Moro assumiu um papel activo na orientação do decorrer da investigação quando, no quadro da justiça brasileira, deveria ser um árbitro imparcial.

A detenção de quatro pessoas, esta semana, acusadas de terem entrado nos telemóveis de Moro e outros procuradores precipitou o que se espera que seja uma ofensiva judicial contra a publicação destes artigos. As mensagens, que a Intercept diz não terem sido fornecidas por hackers, foram partilhadas com outros meios de informação brasileiros, que também publicaram artigos sobre o assunto desde Junho.